A discussão sobre o retorno das aulas presenciais em meio à trágica crise sanitária ainda sem prazo para acabar vem tomando corpo em muitas cidades. Opondo donos de escolas a uma maioria de pais e professores que temem pelos incontornáveis efeitos de fazerem retornar crianças e adolescentes ao espaço escolar, além de uma imensa quantidade de pessoas que prestam serviços ao setor, as autoridades de saúde e governos precisam estar atentos às implicações de tais decisões.
Considerando que a crise que atravessamos também tenha atingido em cheio as escolas particulares que vivem de oferecer serviços educacionais que, em muitos casos, passaram a ser ofertados pelo sistema remoto, o que parece não agradar a muitos pais que acham que o retorno do investimento é professor na sala e criança na escola, não surpreende que a pressão, por vezes, descambe para o irracionalismo. O que não se concebe é que governos agora optem pela reabertura das escolas sem nenhuma garantia de que não haverá contaminação e mortes apenas pela grita de quem se sente prejudicado. Apesar das medidas acertadas de muitos estados e municípios que levaram a batalha contra o coronavírus em conjunto com a guerra contra a desinformação e o boicote do governo federal, abrir escolas em conjunto com a economia, não é apenas temerário, mas irresponsável.
Sem desdenhar do quadro adverso atravessado por pequenas escolas, a atitude de muitos proprietários que ignoram os riscos ou acreditam que podem contorná-los, contribui para que a sociedade passe a acreditar que quem oferece educação só se preocupa com o lucro. A propósito, o sindicato dos donos de escola no Rio veiculou uma peça publicitária dizendo: “Os meses se passaram, aprendemos a conviver com o vírus. A Covid nunca irá de todo, o que acaba é o medo. (…) A escola privada está pronta para reiniciar. Vimos que a ciência é a vacina. Estudos só confundiram. (…) As crianças precisam voltar a se relacionar, brincar, refazer laços, amizades, rever seus amigos”. Pelo conteúdo do texto pode-se imaginar que seus autores não apenas põem os lucros acima das vidas, mas parecem odiar a educação. Como assim “estudos só confundiram”?
Prefeitos e governadores devem abrir diálogos com os trabalhadores da educação e os próprios pais, para que a questão seja tratada com cuidado e responsabilidade. Como diz o documento produzido pelo SINPRO-BA, que preocupado com as vidas, faz a defesa da ciência, da educação, dos estudantes e dos seus trabalhadores, “que o retorno às atividades presenciais nas escolas, dadas as especificidades do fazer da educação, seja em setembro ou noutro mês, é potencialmente arriscado, colocando muitas vidas em risco (…)”. Afinal, estudos iluminam, nos tornam humanos e humanistas e como consta na campanha da APLB, “conteúdos se repõem, vidas não!”
Artigo publicado originalmente no jornal A Tarde.
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