Domingo. Abro os jornais. Primeiras manchetes: “Presença militar no Governo Federal cresce 33% sob Bolsonaro e mais que dobra em 20 anos”. “Racismo Perpetua fosso social no Brasil, mostram pesquisas econômicas”. “79 mil óbitos registrados na pandemia do novo coronavírus”.
Abro as redes sociais e me deparo com o slogan de uma disputa interna dentro de um partido da esquerda radical: “o movimento vai vencer a máquina”. No WhatsApp recebi um card: “ele não, ela sim”.
É muito comum que, absorvidos por uma disputa concreta dentro da esquerda, as referências e os sentidos de proporção se percam e com isso se fortaleça a ideia de que o “maior inimigo” é a corrente contra a qual está ocorrendo a disputa do momento.
Mas este defeito à que todos nós estamos submetidos tem sido diretamente proporcional à marginalidade e `as derrotas da própria esquerda. Portanto é preciso pensar sobre ele, tirar conclusões, buscando evitar este tipo de erro e retomar a consciência do real sentido de proporções da luta de classes.
Somos todos muito pequenos
Em quase todo o século XX era possível contar os revolucionários na escala dos milhões. O conhecido texto programático: Teses Sobre a Unidade da Frente Proletária, aprovado pelo Congresso da Internacional Comunista de 1922, redigido por ninguém menos que Leon Trotsky, cita vários países e descreve brevemente o peso e a implantação do movimento revolucionário em cada um desses países naquele tempo. Autores que todos nós conhecemos, como Pierre Broué, descreve 10 mil militantes na Rússia como um número muito pequeno, expressando os momentos mais difíceis e de extrema derrota.
Essas referências se perderam por completo. É comum considerar que “grandes” as organizações que ultrapassaram 1000 militantes. E são poucas. O pior, e não por acaso, é que muitos grupos consideram a si mesmos como os únicos revolucionários e todos os outros são traidores. E assim justifica-se tudo. Os piores métodos de disputa, a perda total do senso de proporção, o desenvolvimento da corrente x, y ou z como medida do avanço ou retrocesso da luta de classes.
Máquina e movimento
Nas prévias que terminaram hoje no Psol o número total de votantes foi 2.414. Para o Psol é uma excelente participação, mil votos à mais que no último Congresso Municipal do partido, e em plena pandemia. Nunca é demais contextualizar que a cidade tem mais de 12 milhões de habitantes.
Sem dúvida não penso que a disputa seja entre “máquina” e “movimento” de nenhum dos lados. Claro que seria possível argumentar que num partido de tipo parlamentar os mandatos são parte “da máquina” e deste ponto de vista a chapa apoiada pelo “movimento” tem três mandatos, um em cada esfera. Mas este argumento é exatamente o caminho que não nos propomos a seguir neste texto. Justamente porque o que há por trás da polêmica de candidaturas Boulos/Erundina, Samia/Aleksia e Gianazzi/Sandra é um debate político legítimo sobre os rumos do Brasil pós golpe e não uma dicotomia: máquina/movimento.
Tratar um movimento social como o MTST como parte de um “aparelho burocrático a ser destruído” fala muito mal de qualquer corrente. Felizmente o resultado divulgado há pouco mostra que esta não é a opinião da maioria. Agora é tempo de unificar o partido e lembrar que somos pequenos frente aos inimigos. O futuro pede grandeza.
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