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Professora Zuleide Queiroz: “Ser negra, mulher e socialista não me deixou alternativa senão organizar os que querem lutar”

Zuleide Queiroz, professora da Universidade Regional do Cariri (URCA), militante dos movimentos feministas e movimentos negros, do PSOL e da corrente Resistência, é a pré-candidata do partido para a prefeitura do Crato. Ela respondeu às questões enviadas pelo Blog Leia Sempre, em entrevista reproduzida pelo Esquerda Online na íntegra.

Professora Zuleide, como a senhora entrou para a política?
Fiz parte do movimento estudantil e entrei no movimento negro. Só depois veio o feminismo. Na Urca ajudei a fundar o Sindurca, Sindicato de Professores, a primeira Seção Sindical do ANDES das estaduais cearenses. A luta contra a exploração e as opressões, em especial o machismo, o racismo e lgbtfobia nunca foram uma opção, mas sim uma necessidade. Ser negra, mulher e socialista não me deixou alternativa senão organizar os que querem lutar.

Como você avalia que está a esquerda hoje no Brasil?
A situação da classe trabalhadora e dos oprimidos é muito desfavorável. Com o impeachment da presidente Dilma, o bloco político que adquiriu hegemonia no poder, tem implementado uma agenda ultraneoliberal na economia, aprofundando a política estatal de genocídio do povo negro, um conservadorismo nos costumes e na educação, que tem retrocedido nos direitos, na situação econômica do país e nas condições de vida da ampla maioria da população. Tudo isso incide sobre a esquerda. Mas, a esquerda deve cumprir um papel fundamental no enfrentamento da extrema-direita. A reação do nosso povo contra à extrema-direita, demonstra que a esquerda deve seguir apostando na luta dos movimentos sociais.

Por que a senhora optou por se filiar e construir o PSOL?
O PSOL é o lugar onde as lutadoras e lutadores têm se encontrado. É parte da esquerda que não é cúmplice dos erros do PT, mas que também não capitula ao anti-petismo impulsionado pela Lava-Jato e a mídia hegemônica. Por isso, optei pela coerência do PSOL.

Como avalia o governo Bolsonaro?
Péssimo! O Brasil retrocedeu mundialmente, outros países e a OMS se opõem à política do governo Bolsonaro frente à pandemia. Jornais internacionais criticam sua política de destruição do meio ambiente. As políticas para da educação, da saúde, com esse governo a vida do nosso povo piorou. Além disso, dissemina uma cultura do ódio com os negro(a)s, LGBTs, nordestinos e mulheres. É o pior governo de nossa história recente.

O governo Bolsonaro em sua opinião tem um caráter totalitário ou fascista? Como você caracteriza esse governo?
Bolsonaro pretende implementar um governo autoritário no Brasil. Seu governo é uma ameaça permanente as liberdades democráticas e coloca em xeque a já limitada democracia vigente no pais desde a redemocratização. Tem intimidando o STF e o Congresso com a ideia de um novo AI-5. Mas, para além da escalada autoritária, com diferenças dentro do governo o bolsonarismo tem um caráter neofascista. Homenageia torturadores e prega em seus discursos o extermínio de toda esquerda, esse conteúdo anticomunistas, racista, lgbtfóbico, antimovimentos sociais, antifeminista é o fascismo do nosso tempo.

Como avalia os governos Camilo Santana e José Ailton Brasil?
O PSOL é oposição de esquerda ao governo estadual. Mas isso não significa que Camilo Santana do PT é a mesma coisa que o Bolsonaro. Contudo, o fato do governo Camilo ter integrantes, que vai do PDT de Ciro, como a professora Izolda Cela sua vice, passando pelo PSDB do Tasso, até o PMDB do Eunício, indica que tem acordo com um mesmo projeto político, especialmente a política econômica, uma gestão sobre os ditames neoliberais. Não é um governo que se propõe a defender os interesses da classe trabalhadora. Um exemplo é a sua Reforma da Previdência Estadual que aprovou a taxação de 14% dos aposentados, aumentando a idade mínima para os servidores poderem se aposentar onde as mulheres foram as mais atingidas, pois terão que trabalhar sete anos a mais. Eu estive presente nessa batalha dos servidores públicos e presenciei a repressão ao ato que organizamos, inclusive com uma manifestante ferida pela truculência ordenada por Camilo. No Crato, a prefeitura de Ailton Brasil possui esse mesmo caráter. Ailton era do PP, o partido de Maluf tendo como o vice André Barreto pelo PDT. Agora se filiou ao PT para concorrer a reeleição.

Quais são as tarefas na atual conjuntura para os movimentos sociais, em sua opinião? Você é a favor do fora Bolsonaro?  Por quê?
É preciso derrotar a ultra direita condensado no programa bolsonarista em curso. A ultra direita é a antítese daquilo pelo qual lutamos. O bolsonarismo é a expressão do ódio à luta do feminismo, do movimento negro, dos LGBTs e dos ambientalistas. Essa tarefa está colocada para esquerda nessas eleições. Para isso, as candidaturas socialistas precisam se associar aos movimentos sociais em luta. No Crato, a nossa candidatura está a serviço do movimento de mulheres, do povo preto, das lgbts, dos ambientalistas, dos sindicatos, das associações de bairros, dos artistas locais, dos trabalhadores rurais e das comunidades onde se revelam as maiores dificuldades da vida cotidiana. Cobrar justiça para Marielle Franco é parte dessa luta.

Todo o PSOL apoia a luta pelo Fora Bolsonaro porque isso significa salvar vidas diante da pandemia, salvar a democracia e os direitos sociais. Vejam que mesmo diagnosticado com a Covid-19, ele mantém sua política genocida e negacionista. Ele não se importa com a morte de dezenas de milhares de brasileiros e pela tragédia econômica e social que sofre o povo trabalhador.

Ele não se importa com a morte de dezenas de milhares de brasileiros e pela tragédia econômica e social que sofre o povo trabalhador.

Falando sobre as eleições de 2020. Como a senhora pensa a campanha deste ano em Crato?
Nossa candidatura nasceu no interior da Frente de Mulheres do Cariri e do Movimento Negro da região. Carregamos essencialmente essa iniciativa comunitária. Sinal disso é a pré-candidatura do Coletivo Sementes, composto por Verônica Isidorio, Ivaneide Severo, Lorena Kelly, integrantes da Frente de Mulheres do Cariri, trabalhadoras da educação que trazem consigo as pautas históricas do combate a cultura do estupro e a violência contra a mulher, o direito ao corpo e à sexualidade, a busca pela igualdade entre os gêneros. Colocamos nossos nomes com o intuito de organizar a resistência a partir da luta das mulheres e construir uma alternativa à esquerda, anticapitalista, conectada com a força do feminismo. Nossa candidatura é um ponto de apoio para a construção das lutas unitárias necessárias para derrotar a extrema direita no país. Essa é a nossa expectativa.

Quais principais parcerias e alianças que o PSOL pode fazer em Crato para a campanha?
Penso ser importante buscar nos aliar aos demais movimentos de resistência, participando ativamente das batalhas contra a exploração do trabalho, da luta antirracista, anti-lgbtófica, anti-imperialista e ambientalista. Nosso objetivo deve ser construir uma aliança com coletivos, associações, sindicatos, e todas as organizações da classe trabalhadora que entendam ser essencial a unidade para resistir ao retrocesso.

Há alguma possibilidade de diálogo com o PT do Crato?
Não houve negociação entre os partidos e a constituição de uma chapa comum a essa altura é praticamente inexistente. Mesmo porque o PT cearense fez a escolha de se juntar com partidos e figuras que representam diretamente os interesses contrários ao dos trabalhadores. Nós do PSOL fizemos outra escolha. Contudo, penso que a constituição de uma frente unitária da classe trabalhadora também deve passar por fora da frente eleitoral e sua necessidade continuará válida mesmo depois das eleições. Nessa frente, o papel do PT é fundamental e por isso vamos sempre chamar esse importante partido para a construção desse instrumento que é a frente de esquerda.

Como a senhora pensa no relacionamento de seu governo, caso seja eleita, com a Câmara Municipal?
O Brasil está no meio de uma das mais graves crises de sua história, sem que o governo consiga oferecer alguma resposta as necessidades da maioria de nossa população. Nosso dialogo será pautado na defesa dos interesses dos explorados e oprimidos diante dessa grave crise.

Quais as principais ideias para setores como saúde e educação que a senhora deve apresentar na campanha?
No Brasil, o avanço ultraneoliberal vem atacando uma série de direitos historicamente conquistados, deteriorando rapidamente as condições de vida da população. É preciso barrar o arrocho sobre o povo principalmente agora com os efeitos severos da pandemia que devem perdurar por anos. Entendo que luta por saúde e educação constitui um aspecto central do movimento de mulheres e da luta por igualdade de gênero. Por isso em nossa campanha essas questões tomam uma dimensão especial. Acompanho com preocupação a situação da saúde e educação pública no Brasil diante dos seguidos ataques. No Crato a saúde pública agoniza enquanto assistimos ao aumento de casos de covid-19. O Teto de Gastos nos impôs um perverso contingenciamento aos parcos recursos já existentes para essas áreas. No Crato, é preciso dar atenção especial às creches e aos postos de saúde. Defender projetos na educação que pautem o combate a violência contra a mulher a exemplo do projeto que prever o estudo da Lei Maria da Penha nas escolas o que prova que estamos sujeitos a recuos e avanços.

É preciso colocar a prefeitura a serviço desses setores mais vulneráveis da população da cidade

Quais são suas ideias quando falamos de emprego e desenvolvimento econômico do Crato?
O município de Crato que tem população estimada em cerca de 130 mil habitantes sendo a sexta cidade mais populosa do estado e também com o sexto maior PIB (pouco mais de 1,5 milhão de reais). O Crato está entre as 300 cidades mais populosas do Brasil. Contudo, a crise capitalista aberta há dez anos e mais recentemente a aprovação da reforma trabalhista e previdenciária vem se destacando no cenário do mercado de trabalho cearense com a maior perda de postos formais de trabalho. Isso significa um aumento da informalidade e precarização, além da pobreza. A pandemia do Coronavírus agravou essa situação, pois tem atingido com maior impacto as áreas periféricas do Crato, o que significa que os mais pobres, as mulheres e os negros estão sofrendo mais com a doença. É preciso colocar a prefeitura a serviço desses setores mais vulneráveis da população da cidade o que passa por debater a finalidade das obras públicas, assistência de saúde, alimentação e renda básica e emprego.

Qual sua mensagem para o povo do Crato?
Deixo um convite para que todas e todos participem da política. Neste sábado,18, às 17h30, vamos realizar um seminário programático do PSOL para as mulheres na política: construindo um programa de governo para o Cariri. Venha conhecer e fortalecer o PSOL.