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BRASIL

Mílton Ribeiro no MEC: O problema não é ele ser pastor

Vinicius Prado*
Reprodução

Após quase um mês sem um ministro efetivo no Ministério da Educação, Jair Bolsonaro indica Mílton Ribeiro para a pasta, que segundo seu currículo Lattes, é doutor em educação pela USP e tem carreira ligada ao gruo Mackenzie de Educação, além de ser pastor da Igreja da Igreja Presbiteriana. Ribeiro chega ao MEC questionado devido a declarações relativizando feminicídio e pedofilia, além de defender castigo físico a crianças. Enquanto isso, seus defensores querem reduzir as críticas a um suposto preconceito por ele ser pastor.

Desde a saída de Abraham Weintraub do Ministério da Educação abriu-se um disputa entre os vários setores que compõem a base de apoio do governo Bolsonaro para a indicação do novo ministro. A ala econômica chegou a emplacar Carlos Decotelli, que caiu devido a fraudes no seu currículo, e quase emplacou Renato Feder, que só não foi nomeado devido a uma forte ação de setores fundamentalistas e os “Olavistas” que produziram um dossiê contra o então quase ministro. E são justamente esses setores que emplacaram a indicação de Mílton Ribeiro.

As críticas que envolvem a atuação prévia do novo ministro, ao contrário do que tentam dizer seus defensores, não são por ele ser pastor, mas por ser um fundamentalista religioso e por ter inúmeras vezes dado declarações em que ataca direitos humanos, relativiza feminicídio, culpa o comportamento da criança pela ação do pedófilo enter outras barbaridades.

Não há problema algum em um pastor assumir o ministério da educação, se fosse por exemplo um pastor como Henrique Vieira que tem um histórico de defesa da educação pública e dos direitos humanos, não estaria recebendo tais críticas, o problema de Mílton Ribeiro não é o ser pastor, mas sim o que ele defende.

Em relação ao feminicídio, Mílton Ribeiro alegou que uma “paixão louca” seria o motivo de um homem de 33 anos ter matado uma adolescente de 17 anos, além de de ignorar o centro do problema, que é um homem de mais de trinta anos estar se relacionando com uma adolescente ele ainda levanta a hipótese dela ser a culpada pelo próprio assassinato.

“— Acho que esse homem foi acometido de uma loucura mesmo e confundiu paixão com amor. São coisas totalmente diferentes. Ele, naturalmente movido por paixão, paixão é louca mesmo, ele então entrou, cometeu esse ato louco, marcando a vida dele, marcando a vida de toda família. Triste – Milton Ribeiro.

Relativizar a culpa do agressor e culpar a vítima parece ser uma lógica do pensamento de Mílton Ribeiro, em relação a pedofilia ele já sugeriu que o comportamento da criança moldado pelo que ela assiste na televisão é o que “da motivo” para pedófilos pensarem que estão sendo “chamados para um relacionamento”.

“O que me preocupa é a erotização da criança, e a criança então com atitudes e com maneiras e trejeitos que ela vê e imita, provocando pessoas que entendem que a criança está querendo ter algum tipo de relacionamento com ela” – Milton Ribeiro.

Essas declarações podem ser conferidas no Youtube em uma entrevista que o novo ministro deu ao programa Ação e Reação na cidade de Santos em 07 de outubro de 2013.

Já em uma pregação sobre a família feita em 2016, Mílton Ribeiro afirma que “o homem é a cabeça do lar” e que portanto ele deve definir e impor os rumos da família, além de defender que a criança deve sentir dor para aprender.

“um tapa de um homem ou uma cintada de uma mulher podem ser muito mais fortes que uma criança pode suportar….Não estou aqui dando uma aula de espancamento infantil, mas a vara da disciplina não pode ser afastada da nossa casa….Talvez uma porcentagem de crianças muito pequenas, de criança precoce, superdotada, é que vai entender o seu argumento. Deve haver rigor, desculpe, severidade. E vou dar um passo a mais, á  talvez algumas mães até fiquem com raiva de mim: devem sentir dor”. Mílton Ribeiro (Pregação em 2016)

Em vídeo de 2019, o novo titular do MEC afirma que as universidades, influenciadas pelo penitencialismo “ensinam sexo sem limites” aos estudantes, apresentando a eles um mundo em que tudo pode.

“para contribuir para uma prática sexual sem limites do sexo, veio a questão filosófica do existencialismo em que é o momento o que importa. Não importa se é A, B, se é homem, se é mulher, se é esse, se é aquele, se é velho ou se é novo. Não interessa. O que interessa é o momento” Mílton Ribeiro (Vídeo de 2019)

Olhando para as declarações do novo ministro da educação, fica claro que as críticas as sua nomeação não estão ligadas a um suposto preconceito por ele ser pastor evangélico, os questionamentos são fundamentados nas posições que o Mílton Ribeiro apresentou nos últimos anos sobre temas que são essenciais não só para a educação pública quanto a sociedade como um todo, não podemos ter uma educação pública que relativize o debate sobre feminicídio e pedofilia, e muito menos que aceite que crianças necessitem de castigos físicos.

Desta forma, a nomeação de Ribeiro ao MEC, é coerente com tudo que o governo Bolsonaro fez até o momento, pois coloca no comando da educação pública do país um sujeito que já demonstrou que não se constrange em defender o indefensável. Por tanto não há outra saída para todas e todos aqueles que defendem uma educação pública, gratuita, de qualidade, inclusiva e laica para todas e todos a não ser combater a gestão de Mílton Ribeiro, suas ideias e suas políticas.

*Vinícius Prado é trabalhador da educação, historiador, mestre em educação pela Universidade Federal do Paraná e pesquisador na área de políticas educacionais. Produz o canal Papo de Classe no Youtube.