O presidente Jair Bolsonaro surpreendeu na tarde deste dia 25 de junho, ao nomear Carlos Decotelli para o MEC como substituto de Abraham Weintraub. Decotelli, que será o primeiro ministro negro da gestão Bolsonaro, não estava entre os nomes cotados pelos analistas e nem entre os nomes que o governo ventilava. O próprio Bolsonaro já havia feito entrevistas com Renato Feder, secretário de educação do Paraná e Carlos Nadalim, secretário de alfabetização do MEC.
Apesar de ser desconhecido na área das políticas educacionais, Decotelli possuI um currículo acadêmico muito mais relevante que seus antecessores. Oficial da Reserva da Marinha, o novo ministro é bacharel em Ciências Econômicas pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), mestre pela Fundação Getúlio Vargas, doutor pela Universidade de Rosário (Argentina) e pós-doutor pela Universidade de Wuppertal, na Alemanha.
Segundo as informações disponíveis em seu Curriculum Lattes, o novo ministro possuI quatro livros publicados que versam sobre administração bancária, gestão de finanças internacionais, gestão do agronegócio, e matemática financeira, além de inúmeros artigos sobre riscos de mercado e mercados de capitais, entre outros.
Dado ao curriculum do atual ministro, muitos veículos de informação, e setores da direita têm se manifestado no sentido de ressaltar que o novo ministro é da “ala técnica” do governo e não possuí perfil ideológico. Agora a questão que devemos levantar em relação a isso é: algum setor no governo Bolsonaro não tem perfil ideológico? Os militares que, dia sim, dia não estão ameaçando as demais instituições, não expressam posição ideológica? Os ultraliberais capitaneados por Paulo Guedes não expressam também posição ideológica? Considerar apenas os “Olavistas” como a “ala ideológica” é desconsiderar que há um alinhamento entre militares, ultraliberais e “Olavistas” na construção do projeto fascista em curso no país.
Nesse sentido, olhando para o currículo do novo ministro, podemos ver que a boa imagem que a grande mídia tenta criar a seu respeito está diretamente ligada ao seu alinhamento à lógica de mercado. Tanto a sua formação acadêmica, quanto sua produção bibliográfica nos mostram que Decotelli fez carreira acadêmica a serviço do capital financeiro internacional, e portanto não deve romper essa trajetória à frente do MEC.
O novo ministro possui apenas duas breves experiências ligadas ao setor público, a primeira foi fazer parte da equipe de transição do governo Bolsonaro, e a segunda e mais expressiva foram os 8 meses à frente do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), logo no começo do atual governo. O FNDE, na prática, é o banco do MEC, é através dele que são feitas transferências de recursos para estados e municípios. O FNDE também opera o Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE), que transfere recursos diretamente para escolas em todo o país, além de liberar recursos para as emendas parlamentares relacionadas à educação.
A gestão de Decotelli frente ao FNDE ficou marcada por ter uma licitação para compra de computadores educacionais no valor de três bilhões de reais suspensa pela Controladoria Geral da União. A licitação apresentava fortes indícios de fraude, dentre eles o número elevado de computadores que em algumas escolas chegaria a mais de 117 notebooks por aluno.
Se do ponto de vista humano dificilmente o MEC, ou qualquer outro ministério, será ocupado por um ser mais abjeto que Abraham Weintraub, do ponto de vista técnico Carlos Decotelli pode ser muito mais danoso às políticas educacionais brasileiras do que seu antecessor. O antigo ministro era um fascistoide preocupado em uma guerra ideológica contra a China, o “Comunismo”, o STF e o Congresso Nacional, o que lhe deixava sem nenhuma capacidade de implementações de políticas que necessitasse de articulação política. Já o novo ministro é um gestor a serviço do capital financeiro, seu foco é a implementação das políticas, por isso não perderá tempo com batalhas desnecessárias e que lhe atrapalhem no sentido de construir acordos que garantam a implementação de políticas que atendam os interesses do mercado.
Assim como vimos nos últimos tempos que, mesmo os setores da direita que se opõem a Bolsonaro exaltam a “capacidade técnica” de Paulo Guedes, muito provavelmente veremos esses setores fazendo as mesmas ressalvas ao novo ministro da educação, afinal a política de Guedes chegou ao MEC.
*Vinícius Prado é trabalhador da educação, historiador, mestre em educação pela Universidade Federal do Paraná e pesquisador na área de políticas educacionais.
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