Nascia há 107 anos, em 26 de junho de 1913, o poeta, dramaturgo, político e filósofo anti-colonial marxista Aimé Césaire, na então colônia francesa da Martinica.
Membro de extensa família de sete filhos, tendo como mãe uma costureira e como pai um controlador fiscal, Césaire consegue uma bolsa de estudos na metrópole e se instala em Paris aos 18 anos, em 1931.
Em França, conheceria um grupo de jovens intelectuais negros de outras colônias francesas do Caribe, mas, sobretudo, de África como Léopold Sédar Senghor, que teria um papel marcante no seu processo de autorreconhecimento enquanto negro e no abandono de preconceitos contra o atraso de sua terra natal. Com este grupo irá fundar em 1934 o jornal L’Etudiant Noir (O Estudante Negro), no qual Césaire desenvolveria o conceito de negritude. Em 1935, se aproxima da juventude comunista. Na metrópole conheceria ainda a escritora surrealista (movimento artístico por ele admirado) Suzanne Roussi com quem se casaria em 1937.
Retorna à Martinica em 1939 e vê as condições de vida na ilha se deteriorar rapidamente durante a Segunda Guerra Mundial com o bloqueio imposto pelos Estados Unidos, inimigos do regime colaboracionista de Vichy, regime este que havia nomeado um militar para administrar a ilha, tarefa cumprida de modo repressivo. Césaire será um defensor da autonomia martinicana e perceberá a ação metropolitana no sentido de tolher o desenvolvimento cultural local, por isso irá fundar com outros intelectuais a revista com caráter de resistência política e cultural intitulada Tropiques (Trópicos) em 1941. Por esta época conhece o poeta surrealista francês André Breton, que durante a guerra fugira para Nova Iorque fazendo uma escala na Martinica, onde seria pego e passaria alguns meses. Desta amizade se dá a adesão definitiva de Césaire ao surrealismo, transformando-o em afrossurrealismo.
Logo após o fim da guerra adere ao Partido Comunista Francês (PCF), elegendo-se, com base na projeção nacional e internacional conquistada no período anterior, deputado da Assembleia Nacional da França com o mandato mais longo da história francesa (1945-1993) e prefeito de Fort-de-France (capital da Martinica) por longos 56 anos (1945-2001). Em 1946, apoiaria o projeto que pôs fim ao estatuto colonial da ilha, elevando-a à condição de departamento da França. No ano de 1947, cria junto com Alioune Diop a revista Présence Africaine (Presença Africana), que reúne a nata dos pensadores anti-coloniais. A partir da revista seriam organizados o primeiro e o segundo Congresso de Escritores e Artistas Negros, respectivamente em 1956 (Paris) e 1959 (Roma), e o Festival Mundial de Artes Negras em 1966 (Dakar).
Em 1950, Césaire lançaria sua mais importante obra Discurso sobre o Colonialismo, na qual denuncia os massacres coloniais, demonstra o eurocentrismo das ciências e da filosofia hegemônicas, expõe o racismo metropolitano e postula que o fascismo não é uma novidade histórica, mas que a sua essência podia já ser encontrada no processo colonial. Neste sentido dirá:
Sim, valeria a pena estudar clinicamente, no pormenor, os itinerários de Hitler e do hitlerismo e revelar ao burguês muito distinto, muito humanista, muito cristão do século XX que traz em si um Hitler que se ignora, que Hitler vive nele, que Hitler é seu o demônio, que se o vitupera é por falta de lógica, que, no fundo, o que não perdoa a Hitler não é o crime em si, o crime contra o homem, não é a humilhação do homem em si, é o crime contra o homem branco e o de ter aplicado à Europa processos colonialistas a que até aqui só os árabes da Argélia, os coolies da Índia e os negros da África estavam subordinados.
Em 1956, diante das denúncias feitas contra Stálin no XX congresso do Partido Comunista da URSS e dos eventos repressivos na Hungria irá romper com PCF. Em 1958, funda o Partido Progressista da Martinica (PPM), por ele presidido até 2005, e passa a defender um socialismo democrático não subordinado aos ditames soviéticos. Em 1978, se aproximará da bancada do Grupo Socialista de François Mitterrand, à qual permanecerá associado até o fim de sua atividade parlamentar. Sua última aparição política seria na oposição à lei educacional francesa de 2005 que estabelecia que “o lado bom” do colonialismo francês fosse ensinado nos liceus no Ensino Médio. Morreria 3 anos depois, em 2008, aos 94 anos.
Vemos que a obra de Césaire é um colosso anti-colonial e antirracista, e por isso deve ser retomada tanto nos estudos acadêmicos quanto na militância, podendo servir como pilar teórico ao movimento antirracista global que se desenrolou desde o assassinato de George Floyd. Se Césaire está correto, e tudo leva a crer que sim, a sociedade burguesa capitalista ocidental está apodrecida e é incapaz de resolver os dois problemas fundamentais que ela criou, que são o da classe trabalhadora e o colonial. Sua conclusão, da qual partilhamos, é que um novo mundo precisa ser construído pelos proletários.
Abaixo o racismo, o colonialismo e o capitalismo!
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