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OPRESSÕES

Cotas para pessoas trans e travestis são aprovadas no programa de pós-graduação em antropologia do IFCH da Unicamp

João Pedro Rojas e Lucas Marques
Reprodução

Na mesma semana em que Abraham Weintraub saiu do Ministério da Educação revogando a portaria que trata das cotas étnico-raciais e ações afirmativas nos programas de pós-graduação das universidades públicas, podemos comemorar o fato de a Unicamp ter o seu primeiro programa de pós-graduação com cotas para pessoas trans e travestis. A iniciativa é do Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social (PPGAS – Unicamp) e foi encabeçada pela bancada representativa discente da pós-graduação no departamento. Em reunião histórica, as representantes discentes pautaram, dentre várias reivindicações referentes aos editais de seleção 2021, a urgência da instituição de vagas complementares para pessoas trans nos programas de mestrado e doutorado.

A proposta foi aprovada por unanimidade. A política de vagas complementares para pessoas trans e travestis prevê a criação de vagas extras referentes a 10% das vagas totais nos programas, existentes em caráter optante. Nesse sentido, para o próximo processo seletivo do PPGAS existirá 1 vaga adicional para pessoa trans optante no mestrado e no doutorado.

Atualmente, existem, ao todo, 26 instituições de ensino superior públicas com programas de reserva de vagas para pessoas trans. Esse direito urgente, relembramos, já foi atacado pelo ex-ministro Weintraub e por Bolsonaro em 2019, ao intervirem indevidamente sobre a autonomia universitária da UNILAB (Universidade de Integração Lusófona Afro-brasileira), impedindo o seguimento de um edital com reservas de vagas para pessoas trans.

O Brasil é o país que mais mata pessoas trans e travestis. E quando não são suas vidas que são ceifadas, é o seu futuro que lhes é negado. Segundos dados da ANTRA (Associação Nacional de Travestis e Transsexuais), a expectativa de vida de uma pessoa trans é de 35 anos; a maioria é expulsa de seus lares aos 13 anos; 76% não concluem o Ensino Médio e apenas 0,02% ingressam no ensino superior público. As poucas que acessam esses espaços, sofrem por estes não as acolherem. Há falta de políticas de permanência estudantil específicas para população trans e os espaços acadêmicos são na maioria hostis à sua presença, como aponta a pesquisadora Brume Dezembro, uma das responsáveis pela elaboração teórica da política de cotas trans no PPGAS – Unicamp.

A Unicamp é historicamente território de luta por direitos à população LGBTQIA+, palco de ações organizadas pelo movimento LGBT e pelo movimento estudantil, que sempre pautaram a emancipação da sexualidade e a liberdade de expressão de gênero. A universidade garante, desde 2010, o uso do nome social em algumas de suas instâncias, em 2017 o direito foi estendido ao vestibular e, neste ano, a instituição reconhece o nome social em todas suas áreas acadêmicas, das listas de presença aos registros estudantis. Ainda assim, a Unicamp ainda tem muito a avançar, principalmente no que compete ao acompanhamento ativo do cumprimento do direito ao nome social e a criação de uma política de segurança não-patrimonial que de fato proteja todos os corpos das e dos estudantes, ao invés de violentá-los, como muitas vezes foi denunciado.

A vitória que assistimos hoje não nos basta, mas nos inspira a seguir em frente. É preciso que a política aprovada no PPGAS – Unicamp seja parte de todo e qualquer edital de seleção aos programas de pós-graduação e também do processo seletivo do vestibular para a graduação. Para além do enriquecimento do trabalho acadêmico pela expansão de perspectivas a atores em seu empreendimento, o acesso a um ensino público, gratuito e de qualidade não pode mais restringir-se a uma elite branca, rica e heterocisgênera. COTAS PARA PESSOAS TRANS E TRAVESTIS, JÁ!