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TEORIA

Afinal, o que é o antifascismo?

Rodrigo Juazeiro, de Salvador, BA

Após a eclosão de movimentos fascistas no mundo, os comunistas e anarquistas, cientes do risco à humanidade que o fascismo representa, superaram suas divergências e criaram o Movimento Antifascista. Esse movimento não conta apenas com comunistas e anarquistas, mas foram estes que pensaram um movimento amplo e radical para combater a ameaça fascista.

O próprio símbolo do Movimento Antifascista – atualmente bastante difundido com uma série de montagens na internet – são duas bandeiras, uma preta (anarquistas) e uma vermelha (comunistas) tremulando para a esquerda, não restando dúvidas que o movimento Antifa tem lado. É um movimento puxado por setores anticapitalistas, antirracistas, anticolonialistas e que sempre combateram todas as formas de opressão.

Esta demarcação mostra-se necessária haja vista que, em tempos de pós-verdade, é fundamental que se combata discursos pluralistas vazios, que acabam trazendo definições simplistas que, no fim das contas, cumpre um objetivo de se retirar o caráter radical da luta antifascista, como também excluir (e muitas vezes rechaçar) os protagonistas históricos dessa luta: anarquistas e comunistas.

No livro ANTIFA – O Manual Antifascista, do historiador Mark Bray, o autor é enfático ao rechaçar a definição de antifascismo apenas como oposição ao fascismo pois “…a redução do termo à mera negação obscurece a compreensão do antifascismo como um método de política, um lócus de auto identificação individual e de grupo, de um movimento transnacional que adaptou correntes socialistas, anarquistas e comunistas preexistentes a uma súbita necessidade em reagir à ameaça fascista” (pág. 15) e conclui afirmando que “…o antifascismo é uma política nada liberal, é a revolução social aplicada ao combate à extrema-direita, não apenas aos fascistas literais.” (pág. 16).

Uma das táticas do Movimento Antifascista foi a criação das famosas Frentes Amplas contra o fascismo, compostas por diversos setores progressistas que, ao longo da história, nos mais diversos países, unificaram-se no combate ao fascismo. Além dos anarquistas e comunista, socialistas, trabalhistas, reformistas e republicanos lutaram juntos em diversas ocasiões contra o perigo fascista.

Nos anos 1930 tivemos no Brasil a Frente Única Antifascista (FAU) que, contando com a unidade entre anarquistas, comunistas (especialmente trotskistas), socialistas e sindicalistas, foi responsável pela derrota dos Integralistas (o partido fascista brasileiro à época) na conhecida Batalha da Sé (07/10/1934) quando, numa ação direta perpetrada pela FAU, os Integralistas foram fragorosamente derrotados no episódio conhecido como Revoada das Galinhas Verdes. Aquela batalha foi fundamental para por freio no fascismo que vinha numa crescente no Brasil.

Tentativas de apropriação indevida do termo antifascista e a histórica ligação do liberalismo com o fascismo

Não há dúvidas que a unidade contra o fascismo é importante e, como já explanado, as Frentes Amplas são táticas históricas de combate ao fascismo. Contudo, numa desonestidade sem precedentes, grupos liberais lançam mão de um discurso anticomunista para se autoproclamarem em verdadeiros antifascistas. Contudo, essa narrativa não resiste à análise de fatos históricos.

Em sentido contrário ao veemente combate ao fascismo que o movimento antifascista sempre fez, os liberais nunca vacilaram em defendê-lo. Importantes professores da Escola Austríaca, uma das maiores influenciadoras do pensamento econômico liberal, como Friedrich Hayek e Ludwig Von Mises e o maior expoente da Escola de Chicago, Milton Friedman, não só elogiaram, como compuseram e assessoraram diversos governos fascistas no mundo.

Friedrich Hayek, em seu livro O caminho da servidão, chegou a declarar que “Hitler não precisou destruir a democracia” para chegar ao poder, apenas “limitou-se a tirar proveito da sua decadência” (pág 84). Ocorre que, Hitler deu sim um golpe na Alemanha, pois os nazistas nunca alcançaram maioria no parlamento para governarem sozinhos. Em outro trecho do livro, Hayek chega a levantar aspectos positivos na política de perseguição de Hitler aos judeus: “Nunca deveríamos esquecer que o antissemitismo de Hitler expulsou do seu país ou converteu em inimigos muitos homens que, sob todos os aspectos, são totalitários convictos do tipo alemão.” (pág 177). Ou seja, o liberal Hayek via aspectos positivos no antissemitismo nazista que, pra ele, era um remédio necessário para organizar a Alemanha naquele momento.

Já Mises foi mais enfático em sua simpatia e apoio ao fascismo. Conselheiro do governo fascista de Engelbert Dollfuss na Áustria, declarou em seu livro Liberalismo – Segundo a Tradição Clássica que “Não se pode negar que o fascismo e movimentos semelhantes, visando ao estabelecimento de ditaduras, estejam cheios das melhores intenções e que sua intervenção, até o momento, salvou a civilização europeia. O mérito que, por isso, o fascismo obteve para si estará inscrito na história. Porém, embora sua política tenha propiciado salvação momentânea, não é do tipo que possa prometer sucesso continuado. O fascismo constitui um expediente de emergência.” (pág 77). Trocando em miúdos, para o liberal Mises, o mérito do fascismo foi ter salvado a Europa do comunismo. Para ele o fascismo é uma carta na manga para um momento emergencial.

Fica aqui uma pergunta: se certos liberais afirmam que fascismo e comunismo são faces da mesma moeda, por que sempre apoiaram um em contraponto ao outro? Por que um deve ser usado em caso de emergência em detrimento do outro? A desonestidade é evidente.

Já o Chicago Boy (ou Chicago Mister) Milton Friedman foi conselheiro econômico do ditador Pinochet, responsável por uma das mais sangrentas ditaduras da América Latina. Friedman era um entusiasta de primeira hora do governo que perseguia e matava comunistas.

Portanto, não se enganem, os liberais não só apoiam, como deram sustentação ao fascismo pois o viam como um movimento com as melhores intenções e um mal menor para a sociedade. Para se contrapor ao comunismo, nunca vacilaram na defesa do fascismo. E é por isso que é uma contradição histórica se declarar antifascista e anticomunista. Não se pode ser os dois.

Aqui no Brasil temos o exemplo de quem os liberais apoiaram. O MBL foi um entusiasta de Bolsonaro e, como ratos que são, abandonaram o barco de maneira oportunista quando viram que este começava a afundar. Mas, como seu ideólogo Mises, certamente não deixariam de apoiar novamente o fascismo contra a esquerda. Outro exemplo é o Partido “Novo”, que constitui a segunda bancada que mais apoia o governo Bolsonaro no Congresso, atrás apenas do PSL (Partido Social LIBERAL), ex-partido de Bolsonaro pelo qual ele foi eleito. Liberais nada mais são do quê “fascistas gourmet”.

Quem sempre combateu o fascismo intransigentemente foram os comunistas e anarquistas, dois grupos de esquerda e anticapitalistas. Portanto, quem quer que queira combater o fascismo hoje precisa saber disso. E, logicamente, na luta contra o fascismo, será muito bem-vindo!