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OPRESSÕES

Feminicídio: A morte de uma mulher indígena fere todas, mas encoraja a voz de muitas

Dayana Molina*, de Niterói, RJ
Detalhe de obra de Yacunã Tuxá

Laurena Ferreira Borges era uma jovem mulher indígena do povo Pataxó Hãhãhãe. Militante pelos direitos indígenas, conselheira local de saúde, mãe e moradora da Terra Indígena Caramuru Paraguaçu. Seus 28 anos foram brutalmente interrompidos por um assassinato cometido dentro de sua própria casa, no Sul da Bahia. O responsável é Jeferson Dias Souza (não indígena), marido e pai de suas duas filhas.

Em 2018 a ONU constatou que o Brasil possui a quinta maior taxa de feminicídio do mundo, mas o estudo não demonstra as ocorrências em cada grupo, entre eles o da mulher indígena. Enquanto estudo inédito na Universidade Estadual de Campinas demonstrou que as taxas de feminicídio estão diminuindo entre as mulheres brancas, mas crescendo entre as negras e indígenas, confirmando a ineficácia das ações do Estado brasileiro frente a esses grupos.

Preliminarmente conclui-se que a questão do feminicídio provém da herança colonial de dominação imperialista, do descaso dos Estados de Direito que se recusam a reconhecer formas de solução de conflito e a organização social de seus próprios povos originários, relegando-os a eternos cidadãos de segunda classe, adotando um modelo de capitalismo etnocêntrico e excludente que reflete na violência contra a mulher e em diversas formas de repressão, entre elas a negação da existência da luta da mulher indígena.

Na atual conjuntura, o feminicídio se agrava em nossa sociedade, acabando diariamente com a vida das mulheres. Na maioria dos casos, isso acontece no ambiente familiar. Isso torna explícita a importância do combate à violência contra mulheres em qualquer circunstância. Mas especialmente durante esse período de isolamento, onde muitas vítimas agredidas, são espancadas até a morte sem a possibilidade de pedir socorro.

Enquanto a vida dessas mulheres é violentamente apagada, os lares de adoção no Brasil, estão cheios de crianças órfãs. Segundo o Núcleo de Estudo da Violência da USP, somente no ano passado, quase 4 mil mulheres foram mortas. Sendo quase 2 mil mortas pelo simples fato de serem mulheres.

“Quando matam uma mulher, matam um pouco de cada uma de nós”

Por isso, é imprescindível que toda e qualquer forma de violência contra mulher, seja denunciada. No Brasil, as mulheres indígenas têm organizado suas formas de resistência, combate em seus territórios ancestrais, suas casas e comunidades. Em nota, mulheres Pataxó Hãhãhãe sintetizaram o que sentem em situações como essa: “Quando matam uma mulher, matam um pouco de cada uma de nós”, disseram.

O machismo, a crueldade, o ódio ao gênero e a violência doméstica são alguns dos ingredientes tóxicos que resultam no feminicídio. Não podemos nos calar e naturalizar esses comportamentos. Situações como essas podem ser fatais. A morte de uma mulher fere a todas, mas também encoraja a voz de muitas.

Mulheres de todos os territórios, comunidades, periferias, aldeias e cidades são assassinadas. Vidas que são interrompidas, mas jamais silenciadas. Toda mulher que luta não morre, vira uma semente importante na luta por uma sociedade justa e igualitária para todos. Laurena vive!

* Indígena Fulni-ô, da Resistência Feminista e do Coletivo Araribóia Niterói.