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BRASIL

Com mais de 30.000 mortes, Brasil segue com maior ritmo de crescimento de novos casos

Gilberto Calil

O quadro reúne os dados dos 15 países com maior número de mortes registradas. Tomamos como referência principal o ritmo de crescimento do número de mortos, tendo em vista que o patamar de subnotificação dos casos no Brasil inviabiliza qualquer comparação da evolução do número total de casos. Entendemos que o cálculo do ritmo de crescimento é mais revelador do a simples comparação dos números absolutos ou dos índices de mortes por milhão de habitantes, tendo em vista que a expansão do Covid-19 se iniciou em momentos diferentes e a pandemia encontra-se em estágios totalmente distintos.

O ritmo de crescimento mundial do número de mortes vem diminuindo de forma consistente. Sempre calculado para os 14 dias anteriores, há 40 dias o crescimento era 958%, há 20 dias era 34%, e agora está em 17%, uma redução progressiva que é efeito das medidas de contenção e políticas de isolamento social adotadas de forma rigorosa em muitos países. 

Nos últimos sete dias, o Brasil teve 6.494 mortes, o que representa 22.8% das 26.261 registradas em todo o mundo (o Brasil tem 2.8% da população mundial), alternando-se no topo com os Estados Unidos (7.121 mortes no período). Juntos, ambos os países tiveram mais da metade das mortes registradas em todo o mundo. No dia de ontem, o Brasil teve mais mortes (732) que todos os 105 países da Europa, África e Oceania somados (611).

 Além disso, o resultado da pesquisa nacional Epicovid-19BR, divulgado no dia 25 de maio, indica que tínhamos então 7 vezes mais contaminados do que indicam os dados oficiais, o que abarcaria 1.4% da população. Considerando a intenção declarada de Bolsonaro de atingir 70% da população para garantir a alegada “imunidade de rebanho”, haveria espaço para que o número e contaminados crescesse ainda mais 50 vezes, com um acréscimo de mortes ainda maior, em virtude do iminente colapso do sistema de saúde. Além de estarmos entre os quatro países com maior ritmo de expansão das mortes (sendo o que tem maior número absoluto), temos também o maior ritmo de expansão do número de casos, que teve um crescimento extraordinário de 107% em 14 dias, piorando dia a dia (tendo chegado a 33.374 em um dia, um crescimento de 7.1% em 24 horas) – o que indica uma forte tendência de que o número de óbitos seguirá crescendo nas próximas semanas. Há 45 dias, 0,5% dos mortos eram do Brasil, e hoje este índice já chegamos a 8% das mortes mundiais. Temos 141 mortes por milhão de habitantes, quase três vezes a média mundial (48).

O Brasil mantém um ritmo de crescimento das mortes (78%) muitas vezes superior à média mundial em 14 dias (17%). México (92%), Índia (78%) e Rússia (78%) também têm índices altíssimos, mas não estão no mesmo patamar de desenvolvimento da pandemia – mesmo somados- não atingem o número de mortes que tem o Brasil. Todos os países que estão entre os quinze com mais mortes conseguiram diminuir de forma expressiva o crescimento de mortes, embora Canadá tem 25% e principalmente os Estados Unidos 16% ainda venham tendo expressivo número de mortes diárias. A situação do Reino Unido, no entanto, é preocupante, pois embora com uma redução expressiva, teve uma reabertura prematura e é o único país que teve aumento do percentual de mortes (de 11% há dois dias para 12%). Nos últimos dois dias, os 48 países europeus, que reúnem uma população de 750 milhões totalizaram menos de 500 mortes e 16.000 novos casos. Os demais países europeus registram um crescimento das mortes entre 2% e 6%, que é acompanhado por uma redução muito expressiva também do crescimento de novos casos – que em 14 dias foi de 3.6% na Alemanha, 3.2% na Itália e 3% na Espanha – portanto entre 30 e 35 vezes inferior ao brasileiro. A China não registra apenas nenhuma morte e teve apenas 61 novos casos nos últimos 14 dias.

Brasil, México e Índia são, também, disparadamente os três países com menor número de testes. O número de testes por milhão de habitantes que Brasil (4.378), México (2.104) e Índia (2.783) é absolutamente inexpressivo e várias vezes inferior aos demais países com números análogos de mortes e casos (ainda que a Índia já tenha feito quase quatro milhões de testes). É um patamar de testagem que torna absolutamente inviável qualquer planejamento de reabertura. Na relação entre testes realizados e resultados positivos, o Brasil tem os piores números do mundo, inferior a 2 testes realizados por resultado positivo.  

O elevado ritmo de crescimento das mortes no Brasil contraria a tendência internacional de melhora da situação e indica um rápido e intenso agravamento do quadro nacional. Já tendo passado de 30.000 mortes oficializadas, o país deveria ter já há muito tempo um ritmo de crescimento diário de novos casos bem abaixo de 1% para ao menos ter a expectativa de começar a reduzir o ritmo de crescimento das mortes em duas a três semanas. No entanto, o ritmo de crescimento de casos vem aumentando dia a dia. Tornam-se cada dia mais urgentes políticas efetivas de isolamento social e inclusive de lockdown em várias regiões. Medidas deste tipo foram adotadas por todos demais os países muito antes de chegarem no trágico patamar em que estamos no momento. Por exemplo, no dia em que a Itália chegou à marca de 30.000 mortes, registrou 243 mortes, mas apenas 1.327 novos casos, enquanto que no dia em que Brasil atingiu a mesma marca, tivemos 7326 mortes e 14.556 novos casos. Nosso isolamento social continua sendo relaxado e sabotado pelas autoridades federais, com cumplicidade explícita do grande empresariado, produzindo a conjunção trágica entre altas taxas de crescimento das mortes e dos novos casos, em um cenário de subnotificação generalizada. 

No Brasil, o número de mortes está duplicando a cada 16,5 dias e o número de casos a cada 13 dias, enquanto no mundo o tempo de duplicação das mortes é de 40 dias e o dos casos é de 34 dias. Além de sermos o país com mais mortes diárias, também já somos o país com mais novos casos diários (ultrapassando os EUA, que realizam dezenas de vezes mais testes), o segundo país com o maior ritmo de crescimento de mortes (depois do México, mas sob uma base numérica 3.5 maior) e o país com maior ritmo de novos casos diários. Certamente também somos o país com mais pacientes em estado grave, mas este dado não é atualizado há um mês.

Outros países, situados na América Latina, África, Ásia e Oriente Médio, embora com números de casos e de mortes que ainda são menos expressivos, vêm tendo crescimento bastante superior à média mundial. Dentre estes, tiveram crescimento do número de casos superior a 100% nos últimos 14 dias: Haiti (3.98), Tajdiquistão (2.32x), Guatemala (266x), Bolívia (2.44x), Chile (2.28x), Afeganistão (2.23x), África do Sul (2,09x), Bangladesh (2.08x), Sudão (2x), Omã (2.27x). O Peru já é o 16o  em número de mortes e teve um crescimento de 79% dos casos no período. A Suécia, 18º em número de mortes, segue como país da Europa Ocidental com maior ritmo de de crescimento de casos, tendo aumentado 24.5% em 14 dias, sendo e país continental da Europa Ocidental com mais mortes na última semana 374).

De outro lado, há um crescente número de países com a situação estabilizada e que praticamente não tem tido novos casos, como Coréia do Sul, Taiwan, Tailândia, Vietnã, Nova Zelândia, Eslovênia, Suíça, Áustria, Croácia, Dinamarca, Finlândia, Noruega, Bósnia, Costa Rica, Cuba, Uruguai e Paraguai, todos eles com expressiva redução do número de casos ativos. Dentre 213 países considerados, 21 não tem registrado nenhum caso ativo e outros 21 tem menos de 5 casos.

É imprescindível e urgente reduzir o ritmo de crescimento do número de novos casos, para em consequência reduzir o número de mortes, pois a manutenção dos índices atuais projeta um cenário que é pior a cada dia e só vai piorar se o processo de reabertura tiver continuidade na situação atual. Se por hipótese considerarmos que este ritmo se mantenha o mesmo (crescimento de 78% a cada 14 dias), o número de mortes no Brasil atingiria 53.481 em 15/6, 95.198 em 27/6 e 169,452 em 9/7. Não se trata de uma previsão, mas de projeção do que pode ocorrer caso não sejamos capazes de diminuir o atual ritmo de forma muito mais vigorosa. Para isto, são inadiáveis medidas para ampliação do nível de isolamento individual, associadas à garantia de efetivas condições de sobrevivência ao conjunto dos trabalhadores, em especial aos mais precarizados. Um pequeno aumento ou uma pequena diminuição no percentual produz um grande efeito em cascata nos números em dois ou três ciclos, o que reforça a urgência do reforço das medidas protetivas.