A pandemia do novo Coronavírus parou o mundo dos esportes. Algo antes impensável aconteceu, e hoje basicamente não há nenhum país no mundo com prática esportiva. O maior símbolo dessa paralisação é o adiamento das Olimpíadas de Tóquio para o próximo ano.
No entanto, o Brasil parte na contramão do mundo e, capitaneado pelo Presidente da República, que tem dado diversas declarações a favor da volta as atividades, já projeta a volta do futebol para Maio, mês que as autoridades preveem como mais crítico no combate ao coronavírus.
É importante destacar que a indústria do futebol gera muitos empregos e também passa por dificuldades. Assim como outras áreas da economia, deve, portanto, ter um plano de auxílio do governo federal e da Confederação Brasileira de Futebol (CBF). Os jogadores de salários astronômicos e os clubes milionários dificilmente irão sofrer, mas os clubes menores e seus jogadores e funcionários já estão sentindo a falta de recursos. Enquanto isso, a CBF só programa retorno do Brasileirão série A, não por acaso a competição que traz os maiores recursos a entidade.
Voltar as atividades nesse momento no Brasil é um crime contra a saúde pública por vários motivos:
Falta de testes
Qualquer retomada de atividades deve prever uma testagem massiva de todos os envolvidos. No entanto, o Brasil é um dos países com menor índice de testes por habitante no mundo (0,63 testes a cada mil habitantes). Com isso, a volta do futebol significaria a importação de milhares de testes com essa finalidade, ao passo que em muitos estados faltam testes até para os profissionais de saúde que estão na linha de frente no combate a pandemia.
Contágio
A realização de uma partida, mesmo que sem torcida, envolve uma grande quantidade de pessoas. Atletas, comissão técnica, profissionais de imprensa, profissionais do estádio, segurança entre outros. Sendo assim uma pessoa com Covid-19 poderia espalhar para diversas pessoas, e com isso o problema de saúde aumentaria.
É importante destacar que os atletas de destaque nacional com certeza serão bem tratados para se recuperarem e voltar aos gramados, mas o que dizer daqueles que atuam em equipes de menos visibilidade, bem como os porteiros, repórteres e outros profissionais mais vulneráveis?
Aparente normalidade
Assistir futebol na televisão pode ajudar as pessoas que tem de ficar em casa, e com certeza o esporte tem um papel importante no entretenimento da população brasileira. Mas voltar com jogos nesse momento dará uma sensação de que as coisas devem voltar ao normal, quando o que deve ser feito é justamente o contrário. No estágio em que o país se encontra, o mais correto seria um fechamento total (lockdown) como foi aplicado em diversos países. No entanto, parte do próprio presidente da república o incentivo para aglomerações. Mostrar uma aparente normalidade irreal é mais um plano desse governo, que não se importa com a a vida humana, e tenta transformar o esporte em mecanismo de sua política genocida.
Logística
A realização de uma partida de futebol exige a presença de pelo menos duas ambulâncias no local da partida. Ou seja, se os jogos voltarem, várias ambulâncias e profissionais de saúde deixarão de atender doentes para ficar de prontidão à beira do campo de jogo. Em um contexto em que o sistema de saúde está próximo ao limite, ou já atingiu esse ponto, essa medida pode agravar ainda mais a situação.
Aglomeração
O futebol já mostrou que, mesmo de portões fechados, é um fator aglutinador. A partida entre PSG e Borussia Dortmund pela Liga dos Campeões não teve público, mas ainda assim a torcida francesa se juntou na praça, em frente ao estádio, contrariando as determinações das autoridades de saúde. Aqui no Brasil, a última partida realizada foi o clássico campineiro e, apesar dos portões fechados, houve também aglomeração nos arredores do Brinco de Ouro. Esses eventos mostram como a volta do futebol põe em risco a política de isolamento social, trazendo a possibilidade da volta de ajuntamento de torcedores.
Posicionamento no Futebol
Algumas autoridades do esporte já se colocaram contra o retorno das atividades. O ex-presidente do Atlético-MG e atual prefeito de Belo Horizonte, Alexandre Kalil, foi um dos mais enfáticos, afirmando, em entrevista à ESPN, que “Pensar em futebol agora é coisa de débil mental”. Palavras fortes que refletem a gravidade do momento.
O dirigente do Botafogo, Carlos Montenegro, afirmou que prefere perder por W.O. a que seu time volte a campo. No mesmo tom, Raí, dirigente do São Paulo, disse que não estava na hora do retorno as atividades.
Falta um posicionamento mais expressivo dos jogadores, que também serão afetados diretamente. No meio de todo esse debate, apenas Alexandre Pato se posicionou nas redes sociais.
Na contramão, as diretorias de Internacional, Grêmio e Flamengo já se colocaram a favor do retorno às atividades. Nessa segunda-feira, 4 de maio, o massagista Jorginho, que há 40 anos trabalhava no Flamengo, morreu vítima do novo Coronavírus. Nem isso foi capaz de sensibilizar os dirigentes do clube carioca, que seguem favoráveis ao retorno do futebol.
Exemplos no Mundo
No resto do mundo, os países que melhor controlaram a Pandemia são hoje os primeiros a programar a volta. Melhor exemplo é a Alemanha, que programa a volta aos treinos pra meio de maio. Outros já programam pra mais longe as atividades esportivas, como os EUA, que tem um tempo de pico de contaminações parecido com o Brasil, e pensa num protocolo pra retorno dos esportes a partir de setembro.
Vários torneios já foram cancelados, como Eurocopa e Copa América, além de torneios de tênis, temporada do Novo Basquete Brasil e torneios classificatórios pra Olimpíadas. O esporte é fundamental para a sociedade mas, no momento onde a vida precisa ser protegida com distanciamento social, é necessário parar tudo e pensar no que é mais importante.
A utilização de estádios como hospital de campanha, exemplo do Pacaembu, mostram que as praças esportivas podem e devem ser utilizadas no combate à pandemia. Servindo assim como bem público que são.
Vários belos exemplos tem partido de todas as partes do Brasil, muitas torcidas organizadas tem feito atos de solidariedade, clubes tem lançado campanhas de apoio ao combate ao novo coronavírus e várias personalidades do esporte vem ajudando as comunidades mais afetadas.
Nesse contexto, o futebol, e o esporte em geral, não pode se um joguete na mão de um presidente que não se importa com a morte de milhares de brasileiros e quer ver a bola rolar mesmo que isso custe vidas.
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