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As faces do neofascismo de Bolsonazi (9)

Paulo César de Carvalho

Paulo César de Carvalho, o Paulinho, é bacharel em Direito (USP), mestre em Linguística e Semiótica (USP), professor de Língua Portuguesa (lecionou na ECA-USP) e autor de materiais didáticos de Gramática, Redação e Interpretação de Texto. Publicou seis livros de poesia, constando em antologias literárias no Brasil e em Portugal (como em É agora como nunca, da Companhia das Letras, organizada por Adriana Calcanhoto). Compositor, tem canções gravadas por diversos músicos da cena contemporânea. Foi militante da organização trotskista Convergência Socialista.

Professores estavam sendo aposentados compulsoriamente. Em vão, a Associação Paulista dos Professores de Ensino Superior, APPES, tentava sensibilizar o ministro [Gama e Silva], que por extensão do cargo presidia o Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana: “… permita Vossa Excelência que esta Associação declare que os professores de ensino superior aguardam, com insopitável ansiedade, o advento de um mundo em que eles possam dar cabal desempenho de seu magistério, sem nenhum temor; (…) pode esta Associação assegurar a Vossa Excelência que o mais profundo desalento se abate sobre todo o professorado brasileiro, independentemente de orientações doutrinárias e filiações políticas, cada vez que o poder discricionário é empregado para dirimir as questões da inteligência. (SOUZA, Percival de. Autópsia do medo: vida e morte do delegado Paulo Sérgio Paranhos Fleury. São Paulo: Globo, 2000, p. 91-92).

 

Não é novidade que o projeto pedagógico reacionário da ditadura militar contou com a adesão “patriotária” de alguns diretores e professores universitários. Uma dessas sinistras figuras de direita – que certamente teriam o perfil ideal de “interventor” na perspectiva do inculto e autoritário Bolsonazi – é a ex-nadadora medalhista Maria Lenk, diretora da Faculdade de Educação Física da UFRJ em 1972. Ferrenha defensora do golpe, ficou indignada com o convite de um dos coordenadores do curso a um professor que havia sido afastado por suas “atividades comunistas, lamentando que 1968 fora um período “de grande tristeza para o Brasil”, quando estudantes e docentes “estavam ausentes dos bancos escolares, em sua maioria desfilando nas avenidas da cidade” (50 anos depois, o ministro da deseducação bolsonazista Weintraub, na mesma linha, chamaria as legítimas reivindicações da comunidade universitária de “balbúrdia”). Em carta ao coordenador, Lenk justificou a proibição em termos categóricos, sob o argumento autoritário de que não poderia jamais tolerar na faculdade a presença da “ameaça vermelha”, que a sua gestão austera teria trazido de volta a ordem e a disciplina abandonadas pela “doutrinação marxista”. Em sua pregação exultante – louvando a Deus, ao regime e a si mesma – a instituição de ensino finalmente teria se ajustado aos (velhos) novos tempos: “Graças a Deus e graças aos nossos esforços. Agora estou tranquila, que meus alunos e meus professores estão cientes de que no recinto de nossa escola a missão a cumprir é formar profissionais capazes, que possam transmitir aos educandos brasileiros os verdadeiros fundamentos da moral e do civismo para o bem do Brasil”. (MOTTA, Rodrigo Patto Sá. As universidades e o regime militar: cultura política brasileira e modernização autoritária. Rio de Janeiro: Zahar, 2014, p. 184).  

Não é novidade que também foram nomeados interventores fardados nas universidades, como o coronel que coordenava, na Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas (Fafich) da UFMG, as disciplinas de Educação Moral e Cívica e Estudos dos Problemas Brasileiros (EPB). Na mesma universidade, nas faculdades de Direito, Odontologia e Educação Física, constavam do programa de EPB temas sintomáticos da pedagogia doutrinária golpista, como “os malefícios do socialismo” e “profilaxia da guerrilha urbana e guerra revolucionária”. No curso de Educação Física, ilustrando emblematicamente a doutrinária cenografia ufanista do regime militar, faziam parte de todas as atividades das duas “novas” matérias o hasteamento da bandeira e o canto do hino nacional. Aliás, nesta distópica viagem de horror de volta àquele passado nebuloso, na máquina do contratempo do desgoverno do ex-milico “interventor” do baixo clero, deu quase para ouvir – à semelhança de um distúrbio alucinatório aterrorizante – os ecos verde-amarelos daqueles jovens coros cívicos naquela indecorosa recomendação que o MEC fez às escolas em 2018, na indigesta gestão do ex-ministro Vélez Rodríguez (aquele adestrador de milicos, lobista das escolas militares e apologista – como a ex-nadadora de águas turvas Maria Lenk – da “revolução de 64”).

Não é novidade que a ordem de meia volta volver a “meia oito” também foi repetida e reafirmada pelo reacionário vice-presidente Mourão (que não tem só o sobrenome e a patente em comum com aquele general que anunciou o golpe de 1964, com aquele capitão que tramou a fake news anticomunista do golpe de 1937, com aquele chefe do serviço secreto integralista que participou do fracassado golpe no golpista em 1938). Apesar de não ser fascista (nem filho de Olympio Mourão Filho), o general nostálgico dos anos de chumbo sempre celebra descarada e criminosamente aquele fúnebre 31 de março – como o facínora ex-capitão terrorista –, engrossando o desafinado coral moralista verde-amarelo da Escola sem Partido de Vélez, Weintraub & Cia. Pouco antes da intervenção de Bolsonazi nas listas tríplices das universidades federais, o milico Mourão sinalizara com o dedo no gatilho a perigosa marcha retrógrada do desgoverno (aludindo – atenção – à conhecida operação limpeza do “entulho marxista”): “Vocês sabem que o Ministério (da Educação) tem sido um lugar de combate direto. Não se desmancha tudo que existe lá da noite para o dia. Tem que ser um trabalho bem organizado. Mas é determinação e a diretriz do presidente é que matérias dessa natureza retornem”. 

Não é novidade que essas anacrônicas disciplinas “disciplinadoras” – as ufanistas EPB e EMC – felizmente não retornaram (ainda) às salas de aula. Aliás, é fundamental não esquecer que tais excrescências pedagógicas “patriotárias” só foram excluídas dos currículos escolares em 1993, uma das provas evidentes do caráter demagógico, farsesco, da “transição democrática” iniciada em 1985, no governo de José Sarney (o antigo político da ARENA, partido governista à época da ditadura militar, assumiu a Presidência da República após a morte de Tancredo Neves, como vice da chapa eleita indiretamente pelo Colégio Eleitoral). Aproveitando a deixa, aliás, vale sublinhar que se não fosse a passividade cúmplice da tradição política conciliatória da “República dos Bananas”, a inadmissível condescendência dos “democratas” com os criminosos fardados, jamais poderia ser eleito um facínora que faz apologia da ditadura e da tortura, que exalta o coronel assassino Ustra do famigerado DOI-Codi, que idolatra generais tiranos como o chileno Pinochet e o paraguaio Stroessner, que foi excluído do Exército como autor de um plano terrorista, que defendeu (ainda deputado) o fuzilamento de Fernando Henrique Cardoso (então presidente), que convocou a horda de extrema direita para o extermínio dos “camisas vermelhas” adversários, que é adversário da liberdade de expressão, que é amigo de bandidos milicianos, que é inimigo das liberdades democráticas, que ameaça fechar o STF e o Congresso Nacional… 

Não é novidade que a ficha corrida do ex-capitão reformado, do recalcado ex-milico deformado na Escola sem Partido (i)moral e (anti)cívica, do pária desqualificado “do fundão” dos imundos porões, é muito grande para que não pudesse ter sido notada pelas “instituições democráticas”. Não se trata, evidentemente, de cegueira, mas de conivente/conveniente “vista grossa” (o trocadilho ajuda a ver melhor a óbvia redundância): a “elegibilidade” do falso Messias foi consagrada pelos “sagrados” poderes legislativo e judiciário (para não desperdiçar a metáfora da missa maquiavélica institucional, o golpe parlamentar “antipetista” – sabidamente – foi abençoado pelas “magistrais” batinas bonapartistas pretas da “imparcial” Corte Suprema). A intervenção de Bolsonazi nas universidades, pois, neste trágico quadro negro, é mais um dos seus graves crimes contra as conquistas históricas do Estado de Direito, com a cumplicidade das autoridades que deveriam zelar por elas. Do MEC, é claro, não se poderia esperar outra coisa a não ser o apoio irrestrito ao gesto autoritário do “patrão”, conforme o órgão justificou no site oficial: “A relação [os indicados nas listas tríplices pela comunidade acadêmica] é enviada para o Ministério da Educação e a palavra final é do presidente da República”. Esse salvo-conduto para o despotismo, aliás, foi divulgado na matéria de Juliana Sayuri no The Intercept Brasil, em 2 de outubro de 2019, com as seguintes observações, que dimensionam a extensão da marcha regressiva do desgoverno Bolsonazi no campo educacional: 

“Mas, em diversas notas à imprensa, o MEC vem martelando o argumento de que não há hierarquia entre os indicados das listas tríplices (…). E, na escolha dos novos reitores, o governo leva em conta até as redes sociais dos candidatos para se certificar de que eles estão alinhados com o governo. Os deputados de cada estado ajudam o governo a levantar a ficha de cada um dos possíveis reitores. A intervenção não termina na nomeação – até porque os reitores perderam poder no novo governo. Em maio, Bolsonaro assinou um decreto que tira dos reitores a autonomia para nomear dirigentes (como diretores e pró-reitores) de instituições federais, que terão que passar pelo crivo de Onyx Lorenzoni, ministro-chefe da Casa Civil. Os indicados a ocupar cargos nessas instituições serão investigados pela Agência Brasileira de Inteligência, a Abin, e pela Controladoria Geral da União. Em julho, Weintraub também assinou a portaria 1373/2019, que puxa para o ministério da Educação a prerrogativa de nomear e/ou dispensar cargos nas instituições de ensino. As ações foram consideradas ‘ataques’ à autonomia de universidades, institutos federais e centros de educação tecnológica. A assessoria jurídica do Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior, o Andes-SN, considera o decreto inconstitucional. ‘É mais uma tentativa do governo federal de controlar as universidades públicas e destituí-las de caráter republicano. Tirar a nossa autonomia para eleger, entre nossos pares, quem vai assumir os cargos do cotidiano do trabalho’, definiu, em nota, Eblin Farage, secretária-geral do sindicato”.

Não é novidade – é necessário um parêntese para a contextualização da dinâmica reacionária – que o teatro do golpe parlamentar de 2016, com a participação ativa dos atores semibonapartistas togados, não apenas destituiu a “presidenta” Dilma Rousseff, mas também conduziu à prisão o ex-presidente Lula (que estava à frente do candidato neofascista nas pesquisas eleitorais), fabricando assim todas as condições favoráveis para que Bolsonazi pudesse subir a rampa do Planalto, em 1º de janeiro de 2019. Todo o rito condenatório, obviamente, foi cuidadosamente preparado para criar a ilusão de “imparcialidade”, produzindo a impressão de funcionamento regular das “instituições democráticas”, como se o Estado fosse realmente um árbitro “neutro”, pairando acima dos conflitos de interesses entre as classes sociais (e suas frações). Para quem conhece a teoria marxista, é redundante dizer que o Estado é uma forma de dominação de classe, que se consubstancia, pois, através de uma série de instrumentos institucionais de poder e de saber. Como bem explicou o cientista político Nicos Poulantzas, “o Estado encarna no conjunto de seus aparelhos, isto é, não apenas em seus aparelhos ideológicos, mas igualmente em seus aparelhos repressivos”, a aparência de “autonomia” sobre os interesses individuais e coletivos conflitantes – e, logo, o ocultamento da sua verdadeira natureza de instrumento de dominação política. 

Não é novidade que a “área jurídico-política” tem papel predominante – desde a sua constituição – na estrutura organizativa do “Estado burguês”: através do “poder simbólico do discurso competente” (nos termos da filósofa Marilena Chauí), as instâncias judiciárias e legislativas constroem o discurso institucional que legitima – fazendo-o parecer “natural” – o poder de Estado. Em outras palavras, simulando a imparcialidade, a isenção de interesses, dissimulam que os aparelhos repressivos (a justiça, a polícia, o exército, a administração pública) e ideológicos (órgãos que definem políticas culturais, diretrizes educacionais, regras comportamentais) funcionam de forma desigual e combinada para sustentar o poder de classe. Sem entrar em maiores detalhes, dada a complexidade do assunto e o recorte temático desta série, destacamos uma síntese analítica de Poulantzas para ajuda a compreender melhor os mecanismos de legitimação dos poderes estatais e de apagamento das marcas ideológicas de quem os exerce:

“Isto ultrapassa, aliás, o simples discurso oficial e estende-se a essas formas primeiras de ideologia produzidas pelo Estado, que garantem as relações internas ao aparelho (autolegitimação interna) e a legitimação de suas práticas para o exterior: legitimação das práticas do Estado e de seus agentes como portadores de um saber particular, de uma racionalidade intrínseca. Tudo isso, aliás, não faz mais do que reforçar-se atualmente, sob as formas particulares da relação saber-ciência que implica a transformação da ideologia jurídica-política em ideologia tecnocrática (…). O Estado capitalista não funda a sua legitimidade em sua origem: ele comporta uma série de fundações sucessivas na soberania, constantemente renovada, do povo-nação. Esse Estado afirma assim um papel organizacional particular em relação às classes dominantes em face do conjunto da formação social: seu discurso é um discurso da ação. Um discurso da estratégia e da tática, imbricadas certamente à ideologia dominante, mas alimentada igualmente de uma ciência-saber açambarcada pelo Estado (conhecimentos econômicos, políticos, históricos). (…) Trata-se de um discurso segmentário e fragmentado segundo os objetivos estratégicos do poder e as diversas classes às quais ele se dirige”. (POULANTZAS, Nicos. O Estado, o poder e o socialismo. São Paulo: Paz e Terra, 2000, p. 55-56).

Não é novidade que a ordem do discurso “jurídico-político” se consubstancia através de diversas vozes autorizadas (como os juízes, promotores, desembargadores, procuradores, vereadores, deputados, senadores, secretários de Governo, ministros de Estado e presidentes da República) e procedimentos normativos e decisórios (sentenças, portarias, leis complementares, emendas constitucionais e medidas provisórias). Nos regimes de crise, como o bonapartismo do Estado Novo ou a ditadura militar, historicamente se verifica uma hipertrofia do Ministério da Justiça, órgão que é responsável direto pela institucionalização do autoritarismo, por meio de normas restritivas ou suspensivas de garantias individuais e liberdades democráticas – cujo alvo, obviamente, são os opositores de todos os matizes políticos, sobretudo os “inimigos vermelhos”. Vale lembrar, a título de ilustração, o papel central do ministro da Justiça de Vargas, o teórico “eugenista” Francisco Campos, autor da Constituição de 1937 (a “Polaca”, de inspiração fascista), ou o protagonismo do ministro da Justiça do ditador Costa e Silva, Luís Antônio da Gama e Silva (primo do general), que baixou a Portaria 177 (tornando ilegal a Frente Ampla de Lacerda, JK e Jango) e o famigerado AI-5 (que fechou o Congresso Nacional e suspendeu o habeas corpus). Antes disso, aliás, o entusiasta do golpe tivera seus trabalhos sujos reconhecidos pela Junta Militar, acumulando as funções de ministro da Justiça e da Educação e Cultura até a posse de Castelo Branco.

Não é novidade que o professor catedrático de Direito Internacional Privado da Faculdade de Direito do Largo São Francisco foi nomeado reitor da USP no mesmo ano, sendo reconduzido ao cargo em 1966. Nessa época de triste memória, não se pode jamais esquecer, o tirano Gama e Silva elaborou uma lista negra de professores, a serem processados no Inquérito Policial-Militar que entraria para a história dos anos de chumbo como o “IPM da USP”. Entre os supostos “infiltrados marxistas” – que estariam “doutrinando” os estudantes – constavam intelectuais de renome, como o economista Paul Singer e os sociólogos Florestan Fernandes e Fernando Henrique Cardoso (que Bolsonazi, três décadas depois, ameaçaria – em “pleno” Estado de Direito (sic) – de fuzilamento). Como se não bastasse tanto desmando, em 1968 – o ano que parece não ter terminado – o despótico jurista autorizou, investido dos “superpoderes” de ministro da Justiça, a brutal invasão da Universidade de Brasília. O jornalista Zuenir Ventura, a propósito, destacou este sintomático trecho de um artigo do Jornal do Brasil denunciando a arbitrariedade: 

“Partiu do ministro da Justiça, professor Gama e Silva, a ordem para a Polícia Federal invadir a UnB e retirar de lá estudantes que estavam com prisão preventiva decretada. Não se sabe se a operação correu a gosto do professor, mas pode-se antecipar que os resultados políticos da agressão armada cobrem os notórios objetivos do ministro que mais pleiteia do presidente medidas de exceção. A ordem, executada com requinte, elimina as veleidades do governo de criar no país um clima de otimismo e repõe no ambiente aquela ansiedade pânica, que é matéria-prima dos radicais [de extrema direita]”. (VENTURA, Zuenir. 1968: O ano que não terminou. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1988, p. 197).  

Não é novidade que tudo isso ocorreu há cinco décadas, que o país não está sob a sombra fúnebre da ditadura militar. Não há dúvidas, entretanto, de que a nostalgia confessa de Bolsonazi pelos inglórios “anos de sangue”, bem como as suas declarações e (des)medidas na Presidência da República, despertam os espectros plúmbeos dos carrascos para assombrar o frágil presente. Em outras palavras, se aquelas décadas trágicas fossem realmente páginas viradas do livro de história do autoritarismo verde-amarelo, um candidato cujo “programa” é fazer o Brasil voltar “há 50 anos atrás” (sic), com a promessa de reintroduzir a Educação Moral e Cívica no currículo escolar, de varrer o “lixo comunista” das salas de aula, de exterminar os “camisas vermelhas” da cena política, elogiando governos ditatoriais, homenageando torturadores e condecorando milicianos, convenhamos, jamais poderia cumprir os requisitos de elegibilidade nas condições de “normalidade” de um tradicional regime “democrático” (sempre entre aspas, porque a democracia burguesa, é sempre débil, parcialíssima; a igualdade, no capitalismo, é sempre uma categoria abstrata, um valor meramente formal). Aliás, o ex-capitão terrorista não só não poderia ter sido eleito, mas também – uma vez consumada a tragédia eleitoral – jamais poderia continuar (des)governando o país, cometendo impunemente tantos flagrantes crimes de responsabilidade. 

Não é novidade que o mais grave ocorreu no dia 19 de abril, em Brasília, quando o facínora participou de um ato golpista da horda verde-amarela aglomerada em frente ao Quartel-General do Exército. Desrespeitando novamente todas as taxativas recomendações mundiais de isolamento social para evitar a disseminação do mortal coronavírus, o presidente saudou a massa ensandecida, entre faixas e cartazes exigindo a decretação de um “novo” AI-5 e o fechamento do Congresso Nacional e do STF. A passividade da Câmara, do Senado e da Corte Suprema, que não apenas não frearam as suas reiteradas investidas reacionárias, mas também não agiram pronta e energicamente depois da gravíssima manifestação inconstitucional, interditando o tresloucado ex-milico neofascista, que segue conspirando abertamente contra o Estado de Direito, é prova inequívoca de que os poderes Legislativo e Judiciário são cúmplice desses crimes. Diante da evidência dos fatos, portanto, todas as declarações de deputados, senadores e magistrados, tentando convencer a opinião pública de que o país está num quadro de normalidade, de que as instituições “democráticas” estão funcionando regularmente, seriam mais cômicas se não fossem tão trágicas. Nos termos de Mário de Andrade, enfim, essas palavras anódinas, a esta altura do campeonato, são simples “discurseira de arrastão”; ou, parafraseando Lenin, para os ouvidos bem abertos, não restam dúvidas de que essa retórica farsesca não passa de mera “fraseologia oca” de dissimulados propagandistas extraoficiais da classe dominante.       

 

 

OBS: Este artigo faz parte de uma série de textos de análise e caracterização do governo Bolsonazi, bem como do regime político que garantiu a sua eleição e o sustenta – por enquanto – no poder. Some-se ao que foi dito a gravíssima “delação não premiada” do imoral ex-ministro da Justiça Sérgio Moro, em 24 de abril, anunciando o abandono da nau desgovernada. Os novos fatos não foram incorporados porque o artigo já estava concluído quando o “justiceiro” de Curitiba anunciou a sua carta de demissão. Para maiores informações, recomendamos a leitura do editorial Moro expõe novos crimes de Bolsonaro.