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BRASIL

COVID-19: é preciso romper os grilhões

Rosa Araújo*
Fotos Públicas

Uma tragédia se anuncia ao mundo. E a busca de alternativas com políticas econômicas equivocadas para manter o equilíbrio financeiro pode ser o pontapé para transformar a sociedade em um barril de pólvora.

Diante de um cenário catastrófico acompanhamos o desespero econômico daqueles que sobrepõe seus lucros a necessidade da população de ter garantido o direito à vida. O COVID-19 não irá mudar apenas nossos hábitos pessoais, ele poderá ser o salto que faltava para mostrar aos mais ricos,  aquele 1% da população, que se não abrir mão agora e investir na sobrevivência e bem estar do povo, a grande massa de trabalhadores, a sua prosperidade está fadada ao fracasso, pois diante da miséria absoluta não haverá consumidores para suas mercadorias e serviços.

Acompanhamos neste cenário o descaso com os serviços públicos e a desmoralização dos servidores. Na quarentena imposta e questionada até mesmo pelo presidente da república, porta voz da elite empresarial, vemos o desconhecimento e despreocupação com o caos social instaurado. O fechamento das escolas e de serviços não essenciais questionados. Hora,  não é de impressionar que estes senhores acostumados a se locomoverem com aeronaves, donos de propriedades enormes com até mesmo quadras esportivas  não sintam  o mínimo de comoção com a realidade social e econômica imposta aos seus funcionários que labutam diariamente tendo como perspectivas ônibus lotados, carga de horária excessivas, baixas remunerações, hospitais públicos  e escolas sucateadas.  Essa elite ignora a realidade de estudantes da escola pública que vivem confinados em casas minúsculas e que, muitas vezes, para dormir é preciso retirar parte da mobília da casa para acomodação de todos que ali residem.

Por isso não é estranho que para parte dessas pessoas frequentar um baile funk pode parecer mais seguro, em tempos de pandemia, estando em espaço aberto e não amontoados. São esses que aguardam ansiosos o retorno das aulas, pois devido a suas dificuldades financeiras, ali encontram comida, itens de higiene e contato com meios de comunicação como internet e mídias digitais, uma vez que na realidade isto lhes é negado.

Neste cenário de guerra é previsível que tenhamos uma disputa pela liderança política da situação. Dória, governador de São Paulo, busca este posto. Possui uma boa retórica, mas as ações não o diferenciam de nosso presidente. Suas políticas de enfrentamento com a crise sanitária no estado de São Paulo mostram total descaso com os trabalhadores e seus filhos. Na educação tardou em suspender as aulas, mas mantém as escolas funcionando internamente colocando em risco gestores e parte dos funcionários. Encerrou contrato com as empresas terceirizadas puxando para a fila do desemprego as merendeiras das escolas com as aulas suspensas. Institui ensino a distância (EAD), desconsiderando que uma parcela grande de alunos e até mesmo professores não possuem estrutura midiática para acompanhar, assistir e preparar aulas. Junto com Covas, prefeito da cidade mantém o sucateamento de hospitais e postos de atendimentos. Constrói hospitais de campana nos estádios, mas nas periferias mantém as AMAS e UBS´s com atendimento precário sem profissionais e equipamentos, não abre os hospitais como o da Brasilândia, com estrutura pronta mais sem equipamentos e mantém o fechamento do Hospital Sorocabana, na região da Lapa.  Fábricas estão autorizadas a manter seu funcionamento. Poderiam estar produzindo equipamentos como aparelhos respiratórios, a exemplo do que fez a Alemanha, mas mantêm sua linha de produção, na expectativa de garantir seus lucros, pois contam com as medidas de Bolsonaro, elogiadas por Dória como o corte do salário de seus empregados. Testes para saber quem está infectados só para aqueles em estados críticos.  Os suspeitos continuam confinados em suas casas correndo o risco de infectar o núcleo familiar. Se apostasse em testes massivos, poderiam tratar e isolar de forma mais eficiente, diminuindo o número de contágio.

Por outro lado, vemos os canais de televisão glamourizando a quarentena. Dando sugestões de atividades: leituras de livros, maratonas de séries, artesanato, culinária, dicas de organização. O que só evidencia o obvio: a sobrecarga de trabalho impede o mínimo necessário para ser ter um bem estar social. E não é a quarentena que irá resolver isso. Vivemos em uma sociedade sem tempo para atividades pessoais necessárias e prazerosas. No caso das mulheres, a cobrança é maior. Responsáveis pelo bem estar, pela higiene, pela saúde da família a quarentena se torna um período maçante de elaboração de tarefas domésticas, cuidado com os filhos aliada com a home office, pois é preciso garantir também o sustento da casa. Não existe descanso.

As tarefas estão postas e cabe aos trabalhadores arcar sozinhos pelo custo e as mazelas de um sistema liberal que não enxergou que aí está uma cartada perigosa. São nestes momentos que os grilhões podem se romper.

O acirramento da crise pode colocar em xeque esta política desumana.  A Comunidade europeia começa a repensar a necessidade dos serviços públicos estatizados e de acesso a toda população. Os discursos insanos e preocupados apenas com os lucros de grandes empresas colocam em risco a sobrevivência dos trabalhadores. E cresce a lógica de que os ricos precisam dar sua cota. Taxar as grandes fortunas ao invés de fazer cortes nos salários miseráveis dos trabalhadores. Políticas para acolhimento financeiro aos desempregados, trabalhadores informais, valorização e investimento no SUS, com a abertura de hospitais da rede privada para atendimento gratuito a toda população, testes massivos para ajudar conter a propagação do vírus, são algumas medidas necessárias e urgentes.  Ou os governos entendem que isto é o mínimo para garantir a sobrevivência da população e consequentemente da economia ou estaremos diante de uma crise sem precedentes, genocida.

Não é possível ter confiança em um governo que acena como política emergencial para conter a crise a medida provisória 927 que permitia inclusive a suspensão de pagamento das empresas aos trabalhadores por até quatro meses aliada a proposta de Paulo Guedes de oferecer o recurso de 1 trilhão aos banqueiros.  Medidas como estas comprovam que para Bolsonaro a conta desta crise vai ficar nas costas dos trabalhadores e no conjunto da população brasileira: crianças, idosos e desempregados.

A unidade dos trabalhadores é imprescindível.  As centrais sindicais, os sindicatos e movimento populares tem um papel fundamental: chamar a unidade do povo para inverter a lógica capitalista. Que os ricos paguem a conta!

 

* Integrante da executiva da APEOESP e militante da Resistência/PSOL.