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BRASIL

Quem vai pagar a conta da crise com o coronavírus?

Abel Ribeiro, de Florianópolis (SC)

Desigualdade em São Paulo

Ainda não sabemos a intensidade e o grau da crise econômica mundial aberta com o Covid-19, mas temos certeza que não será menor. As principais bolsas de valores do mundo acumulam quedas superiores a 20% desde o início do ano. A recessão é inevitável, cito apenas crescimento do PIB brasileiro que deve fechar o ano próximo de zero, como um primeiro exemplo.

Em 2008, o mundo foi acometido por uma crise de natureza financeira que causou grande intervenção do Estado para salvar empresas que quebraram, em particular nos EUA, porém sua dimensão não se alastrou direta e imediatamente sobre todos os países do globo. Doze anos depois, a crise causada pela pandemia do coronavírus neste momento não tem precedente na história e suas consequências serão drásticas; estamos vivendo apenas no início dos seus efeitos sobre os povos do mundo.

A crise estrutural do capital hoje se combina com uma crise de ordem sanitária, portanto estamos diante de algo inédito não só numa perspectiva econômica quanto social. Diante do cenário qual remédio adotar? Benjamin Steinbrunch, CEO do grupo Vicunha, disse em reunião dos empresários com o governo que “o ideal seria haver um alinhamento entre governo federal, estados e municípios. Mas, na impossibilidade, a federação deve dar o exemplo, e os estados vão seguir”.

Há economistas defendendo que a única saída no momento é aplicar estímulos fiscais devido a paralisação de oferta e da demanda, que não vai ser destravada tão cedo, a não ser quando a epidemia acabar, ou quando se achar uma vacina que acabe de vez com o vírus. Todos agora vão recorrer ao governo, para evitar quebradeira, foi assim no Reino Unido que aprovou um pacote fiscal de 30 bilhões de libras e também com os Estados Unidos, que já anunciou estímulo fiscal e redução de impostos.

Os empresários pedem a salvação do Estado brasileiro agora sob peso do sacrifício dos trabalhadores.

Quem é mais vulnerável?

O Brasil é um dos países de maior de desigualdade social do mundo, possui 11,6 milhões de desempregados (IBGE), aproximadamente 150 mil pessoas em situação de rua (IPEA), 33 milhões sem ter onde morar (Correio Brasiliense), 54 milhões de brasileiros recebe em média 928 reais mensais (IBGE) só pra citar apenas alguns números.

Por outro lado temos 56 bilionários (Revista Forbes) que pagam o mesmo percentual de impostos de quem ganha salário mínimo, uma distorção absurda que torna o Estado brasileiro um Robin Hood às avessas. O lucro dos quatro maiores bancos do pais (Itaú, Bradesco, Banco do Brasil e Santander) cresceu em 2019 18% – R$ 81,5 bilhões (G1).

A questão central agora é saber quais serão as medidas do governo, dos políticos e empresários para conter ou minorar a crise. O editorial do Jornal O Globo (órgão de imprensa das Organizações Globo) defendeu abertamente e de forma irresponsável à aprovação da PEC 186/2019 – PEC Emergencial, que reduzirá, caso aprovada, as jornadas e os salários dos servidores da União, estados e municípios em até 25%. Guedes e Bolsonaro atenderam rapidamente a solicitação e publicaram a Medida Provisória que autoriza a suspensão de contrato de trabalho por quatro meses sem pagar salários (item depois revogado).

Centenas de milhões de pessoas vão depender dos servidores do SUS, que é um bom sistema de saúde e vai precisar ser fortalecido, pois não tem capacidade de absorver os danos que essa pandemia pode causar. Na Itália, país de economia mais desenvolvida, com menor população e com bons hospitais, o sistema de saúde público colapsou como o aumento do numero de mortos e infectados. O que será do Brasil daqui a um mês?

Taxação progressiva das grandes fortunas!

É preciso impedir um colapso completo, principalmente sobre o ponto de vista dos trabalhadores, esse tem de ser o debate neste momento. O remédio dos empresários e do governo Bolsonaro vai servir a ampliação dos óbitos. Reformas como a Administrativa, Previdenciária (que aumentou a idade mínima para a aposentadoria para 65 anos, público mais vulnerável ao vírus), Trabalhista retiraram direitos e ampliaram a possibilidade dos trabalhadores serem infectados, ao passo que os mais ricos conseguem se proteger muito mais nas suas belas casas e mansões. As condições para a defesa do Covid-19 para classe trabalhadora são mais frágeis e desfavoráveis.

Não duvidamos que nesse momento medidas urgentes devem ser tomadas e implantadas para combater o avanço do Coronavírus, porém a sociedade brasileira precisa encarar o debate desde o ponto de vista econômico e social, ou seja, de onde sairá o dinheiro que evitará a morte de milhares. A taxação das grandes fortunas é mais do que necessário diante do caos pandêmico, desse modo urge uma reforma tributária que combata os danos à saúde de milhares, que parta do princípio da diminuição de impostos aos mais pobres e ampliação de impostos aos mais ricos com aplicação do imposto progressivo para que possamos derrotar a crise provocada pelo vírus, diminuir a desigualdade e impedir que os trabalhadores de menor renda sejam os que paguem pela conta da crise.

Aqueles que se reivindicam defensores da nossa classe, movimentos sociais e partidos, não podem aceitar nenhuma votação no Congresso Nacional que retire direitos e rebaixem salários dos trabalhadores nesse momento, afinal elas estão funcionando online e sem participação presencial das entidades da sociedade civil e do povo em geral. Em defesa da vida, que os ricos paguem pela crise!

 

*Abel Ribeiro é Professor e sociólogo