Um estudo realizado pela Imperial College London estabeleceu as projeções para as consequências da pandemia provocada pelo novo coronavírus nos EUA e Reino Unido e têm sido utilizado como principal parâmetro para as ações dos governos no combate à doença. Uma análise desse estudo, transpondo os resultados para a realidade brasileira, foi realizada pelo virologista Átila Iamarino. Ele alerta que mesmo com as atuais ações de mitigação, que reduzem a circulação de pessoas, teremos pelo menos 1 milhão de mortes até agosto. Segundo Iamarino, a única alternativa é a supressão total da circulação de pessoas, com a manutenção estritamente de atividades essenciais. Sobre as dúvidas relativas às consequências econômicas de manter todos em casa, o especialista é categórico em afirmar que esta é uma opção entre preservar centenas de milhares de vidas ou arcar com 1 milhão de mortes.
Não são poucos os céticos quanto a gravidade da situação, começando por Bolsonaro, que chama de gripezinha a Covid 19 mesmo diante do crescimento de casos e das primeiras mortes provocadas pela doença no país. Os argumentos contra o isolamento geral da população seriam as consequências econômicas. É verdade que o sustento das famílias está ameaçado, mas não é essa a preocupação no andar de cima. O que inquieta Paulo Guedes e os endinheirados é o quanto deixarão de lucrar neste período.
Apesar da pompa no anúncio do plano econômico para combate à crise, de R$ 170 bilhões, quase tudo consiste na antecipação de benefícios já concedidos à segurados pelo INSS. A única medida que representa uma injeção de novos recursos seria um benefício provisório de R$ 200 destinado a cerca de 20 milhões de pessoas. Um investimento de apenas R$ 12 bilhões em um período de três meses, que será insuficiente para os contemplados e ainda excluirá pelo menos outros 18 milhões de informais e outros tantos que devem engrossar a fila do desemprego.
Apenas R$ 12 bihões? Sim, apenas! Pois em isenções fiscais para empresas em 2019, o governo federal abriu mão de R$ 306 bilhões, sem epidemia ou crise econômica. Agora, enquanto encaramos a pior tragédia sanitária da humanidade desde a gripe espanhola, o governo destina 25 vezes menos recursos para garantir a alimentação de quem não tem alternativa.
Numa comparação didática, se garantíssemos um benefício de 1.000 reais para a metade mais pobre do país, cerca de 105 milhões de pessoas, pelos próximos três meses, o investimento seria de apenas R$ 315 bilhões. Sim, com a mesma generosidade dedicada à mega empresários em tempos de normalidade, podemos garantir condições dignas aos mais pobres para enfrentar o isolamento dos próximos meses.
Quanto às demissões, redução de salários e demais medidas que jogam sobre os trabalhadores as consequências da epidemia, a lógica é a mesma: prevalece o lucro sobre as necessidades da humanas. É possível, manter os salários, empregos, garantir o isolamento de todos e dirigir esforços e investimentos no atendimento médico dos que certamente precisarão. Prefeitos e governadores podem e devem manter trabalhadores terceirizados em licença remunerada, distribuir a alimentação prevista para a merenda escolar na forma de cestas básicas. É apenas uma questão de opção, queremos uma minoria endinheirada preservando lucros sobre 1 milhão de cadáveres ou centenas de milhares de vidas preservadas usando esses recursos?
O combate à esta pandemia nos faz encarar a face mais perversa do sistema econômico que domina o planeta: o acúmulo de riqueza acima de tudo. Se queremos superar esta e encarar as futuras epidemias, catástrofes ambientais e crises econômicas temos de superar o individualismo martelado sobre nossas cabeças diariamente e retomar a luta coletiva dos trabalhadores por uma sociedade onde nosso trabalho não esteja a serviço do lucro, mas da igualdade entre os seres humanos, da busca pelo equilíbrio ambiental e da garantia de algum futuro às próximas gerações.
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