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BRASIL

A complexa situação da greve da PM no Ceará

da redação
Reprodução

Homens encapuzado em um carro da Polícia Militar no Centro de Sobral, no Ceará

A reestruturação salarial dos profissionais da Segurança é o tema que aparentemente motiva a greve dos policiais militares do Ceará. Uma reivindicação justa mas que deve ser considerada no contexto político que vivemos.

Há alguns dias as principais lideranças dos policiais e bombeiros militares negociam com o governo do estado uma proposta de reajuste. As principais lideranças são os deputados estaduais Soldado Noélio (Pros), Delegado Cavalcante (PSL) e Sargento Reginauro (ex-PR, sem partido), este presidente da Associação dos Profissionais de Segurança (APS), criada em 2015 e uma das entidades da tropa que mais cresceu financeiramente até o ano passado. Todos eles articulados com o deputado federal Capitão Wagner (PROS) e, de forma geral, apoiadores do governo federal e de suas políticas de ataque aos trabalhadores e servidores públicos e de empoderamento das polícias frente aos civis.

Após várias negociações e mobilizações da tropa, o governo estadual apresentou uma proposta. Na proposta de Camilo Santana (PT), haveria um reajuste escalonado, conforme a patente. A remuneração de um soldado passaria dos atuais R$ 3,2 mil para R$ 4,5 mil e essa alteração seria em três parcelas, sendo a primeira no próximo mês e as outras duas em março de 2021 e março de 2022. A categoria reivindica um reajuste de 35% no salário-base dos soldados. Além disso, a proposta incorpora as gratificações ao salário e o governo se comprometeu com nenhuma punição aos que participaram da manifestação do dia 06 de fevereiro em frente à Assembleia Legislativa, palco das negociações. 

Essa proposta chegou a ser anunciada como um acordo entre as partes pelos dirigentes do movimento dos policiais. Entretanto, em assembleia da corporação, ela teria sido rejeitada por um setor, que declarou a greve. A partir daí começaram a ocorrer enfrentamentos entre policiais encapuzados e patrulhas do Batalhão de Choque, ocorreu a prisão de três policiais por terem bloqueado viaturas e chegaram informes de amotinamento em alguns locais do interior do estado.

É preciso reconhecer que o reajuste apresentado aos policiais é muito superior ao que outras categorias têm obtido, inclusive os servidores estaduais que, na maior parte dos casos, estão há cerca de 5 anos sem sequer direito à reposição salarial, visto a forte política de ajuste fiscal do governo petista com um pacote de cortes nas áreas sociais e uma reforma da Previdência recém aprovada, similar à do governo Bolsonaro. 

Consideramos legítima a defesa de melhores salários, carreira e condições de trabalho para os funcionários da segurança pública. Lutar por melhores salários, por uma carreira profissional, por melhores condições de trabalho não é crime, é um direito, principalmente em um contexto de profundos ataques aos direitos econômicos e sociais da classe trabalhadora, de grande repressão aos movimentos sociais, de criminalização das lutas e dos dirigentes políticos e sindicais. É justo e é necessário lutar. Defendemos o direito de greve e de organização sindical dos trabalhadores das forças de segurança, assim como a imperiosa necessidade de desmilitarização da Polícia Militar e o fim dessa política e métodos de genocídio do povo pobre e negro da periferia, tão incentivados pela extrema-direita – com características fascistas – que dirige nosso país e alguns estados

Mas a atual greve dos policiais apresenta características muito diferentes de greves anteriores, como a de 2012, no período do governo de Cid Gomes. Na época ocorreu uma greve apoiada pelo movimento sindical e que se mesclou com assembleias de várias outras categorias de trabalhadores. Paralisações anteriores da PM e de bombeiros foram corretamente apoiadas porque além da reivindicação de salários, adotavam os métodos tradicionais de greve, como reuniões e assembleias. A atual é uma greve que ainda que esteja assentada na justa reivindicação de aumento salarial, tem métodos de ataques a instituições públicas, homens encapuzados controlando algumas regiões da cidade, obrigando os comerciantes a baixarem suas portas, e o uso de armas de fogo contra civis – como foi o caso do Senador Cid Gomes, com o qual nos solidarizamos – e uma direção associada à bancada da bala no parlamento.

Neste sentido, e no contexto nacional de um governo que homenageia ditadores e milicianos, que incentiva um partido nacional (Aliança Para o Brasil) com setores mais conservadores e truculentos da polícia, e que as principais lideranças da atual greve no Ceará compartilham dessa ideologia e demonstram abertamente pretensões de uso do movimento para interesses eleitorais, visto que uma das lideranças da greve é pré-candidato à Prefeitura de Fortaleza e simpatizante de Bolsonaro, opinamos que, hoje por hoje, esta greve apresenta limites e contradições que dificultam o apoio de entidades civis e dos movimentos sociais. 

Também não identificamos que a política do governo Camilo Santana (PT), em parceria com os Ferreira Gomes, de mais uma vez solicitar tropas da Força Nacional para o Estado, seja uma medida que dê solução para a situação. É preciso que os métodos de terrorismo que estão sendo utilizados por setores da tropa para amedrontar a população civil devem ser depostos imediatamente e retomadas as negociações parlamentares para solução do complexo problema.