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BRASIL

Governo promove a agonia da Cedae

Engenheiro denuncia manobra deliberada do Estado para desacreditar a Cedae

Clovis Nascimento*
Reprodução / TV Globo

Estação de tratamento do Guandu

O Ministro da Economia do Brasil, sr. Paulo Guedes, ratificando a sua posição de janeiro de 2019, reafirmou no Fórum Econômico Mundial de Davos que o “Brasil está à venda”, apresentando uma listagem das empresas estatais que serão vendidas, na qual se inclui a Companhia Estadual de Águas e Esgotos do Estado do Rio de Janeiro (CEDAE). A lista completa pode ser conferida na edição de 22/01/2020 do jornal O Estado de São Paulo.

Essa inclusão nos remete à necessidade de que o governo Bolsonaro terá de aprovação e sanção urgentes do PL 4162/2019, agora submetido ao Senado Federal, depois de aprovado na Câmara dos Deputados no final de 2019. Sabe-se que, em face das peculiaridades do setor de Saneamento brasileiro, a privatização somente será viabilizada com a aprovação desse PL.

Em que pese a urgência decretada pelo governo, nós da sociedade civil organizada, contrários à privatização desse importante setor pela sua essencialidade à saúde pública e às condições de vida, intensificaremos a luta em Brasília para barrarmos essa tragédia anunciada para o povo brasileiro, que prejudica principalmente, mas não só, as suas camadas mais pobres.

Visando facilitar sua venda, o governo do Estado está promovendo uma situação de pseudo calamidade pública.

Trabalhando para reforçar o desgaste deliberado da CEDAE perante a opinião pública, visando facilitar sua venda, o governo do Estado do Rio de Janeiro, juntamente com a direção da CEDAE, está promovendo uma situação de pseudo calamidade pública com a qualidade da água distribuída à população da Região Metropolitana do Rio de Janeiro.

Com o objetivo de esclarecer a real situação da qualidade da água, gostaríamos de informar que esse problema é recorrente na região metropolitana do Rio de Janeiro uma vez que a água do rio Guandu que é permanentemente monitorada pelos técnicos da CEDAE, está submetida a várias vezes ao ano a esse fenômeno com maior incidência no verão.

A montante da tomada d`água da Estação de Tratamento de Água (ETA) Guandu desembocam três rios: o rio Ypiranga, o rio Queimados e o rio dos Poços, que são poluídos por esgotos sanitários orgânicos e industriais, o que dá causa a um processo de eutrofização desse trecho do rio Guandu, e provoca uma intensa proliferação de algas.

Em ocasiões anteriores, quando essa situação foi detectada, a estação de tratamento foi paralisada por algumas horas, as comportas da barragem foram abertas e se evitou receber na ETA água com concentrações elevadas de algas.

Neste janeiro, esta operação não foi permitida pela direção da CEDAE, e houve a admissão na ETA de água bruta com algas

Neste janeiro, esta operação não foi permitida pela direção da CEDAE, e houve a admissão na ETA de água bruta com algas, o que não deixou outra alternativa para eliminá-las senão o aumento da dosagem de cloro. O resultado desta manobra era previamente conhecido: formação da geosmina, que provoca na água o cheiro e o sabor de terra, que, mesmo que não causem malefício à saúde, induzem a rejeição da água tratada e distribuída. É sabido que a inibição desse cheiro e sabor ocorre com a adição de carvão ativado no tratamento, opção que o governo do Rio de Janeiro evitou financiar.

A melhoria da qualidade dos serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário no Rio de Janeiro e sua universalização, direitos inalienáveis do seu povo, não passa por transformar estes serviços em negócio, e por arrecadar com a venda da estatal recursos para enfrentar o déficit fiscal do estado, cedendo à chantagem do governo Bolsonaro.

Por isso, é necessário combinar a luta contra a privatização do setor de saneamento brasileiro com a luta pelos direitos humanos à água e ao saneamento, exigindo que os governos priorizem a expansão de serviços de qualidade, a preços acessíveis a todos, rumo à universalização.

Vamos à luta sem vacilar. Água é vida e não pode ser tratada como mercadoria.

* Clovis Nascimento é Engenheiro civil e sanitarista, pós-graduado em Políticas Públicas e Governo. Foi subsecretário de Estado de Saneamento e Recursos Hídricos do Rio de Janeiro e diretor nacional de Água no Ministério das Cidades, além de presidente da Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental (ABES). Atualmente é presidente da Fisenge (Federação Interestadual de Sindicatos de Engenheiros), vice-presidente do Senge-RJ (Sindicato dos Engenheiros no Estado do Rio de Janeiro), integrante da coordenação do movimento SOS Brasil Soberano e membro da coordenação do ONDAS (Observatório Nacional dos Direitos à Água e ao Saneamento) e parceiro do BrCidades.
Artigo publicado originalmente no portal do SENGE-RJ.