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BRASIL

Cerrar fileiras em defesa da educação pública

Gabriel Santos, de Maceió, AL e Juliana Bimbi, de Porto Alegre, RS
Agência Brasil

Estudantes e professores de institutos federais e universidades fazem manifestação na Avenida Presidente Vargas em protesto contra o bloqueio de verbas da educação.

Na virada de 2019 para 2020, Bolsonaro passa a mirar novamente as universidades e institutos federais. Em pleno Natal, dia 24 de dezembro, editou uma medida provisória alterando a forma de consulta à reitorias, impedindo a possibilidade de paridade na escolha de reitores entre alunos, professores e técnico-administrativos. Ainda no dia 03 de janeiro, o MEC lançou para consulta pública no Diário Oficial da União uma nova versão do Projeto Future-se, na qual traz algumas diferenças com o texto original, mas mantém seus pontos centrais.

A maior parte das universidades, através de assembleias e conselhos universitários já haviam recusado por unanimidade o Future-se quando foi apresentado pela primeira vez em agosto de 2019.  De norte a sul foram organizados imensas assembleias nas universidades, milhares de estudantes participaram das discussões, e centenas de milhares tomaram as ruas de todo o país, primeiro contra os cortes de verbas e o sucateamento, e em seguida contra o projeto. 

A proposta era amplamente criticada pelos estudantes e profissionais porque, se aplicada, ameaçaria o caráter público e gratuito das universidades. O MEC propõe que as reitorias possam captar recursos com empresas privadas, podendo inclusive ceder os direitos do nome dos campi e prédios para essas mesmas. Apesar das alterações apresentadas por Weintraub na reformulação, a essência do programa segue a mesma, atacando a forma de financiamento das instituições federais, desresponsabilizando o governo pela liberação das verbas.  

A universidade pública foi desde o início um dos alvos preferenciais do governo Bolsonaro. Foram diversos os momentos que o capitão da reserva e sua equipe ministerial falaram mal das instituições de ensino superior, assim como dos professores e estudantes universitários, além das já tradicionais ofensas desferidas ao movimento estudantil brasileiro. O governo federal anunciou primeiramente a doença, um imenso corte de verbas para as Universidades Públicas, e em seguida ofereceu o suposto remédio, o projeto Future-se, que substitui o financiamento público pelo privado. 

O plano do governo federal é por meio do corte de verbas, do contingenciamento e bloqueio de recursos, fazer com que não se tenha outra forma de recurso para as universidades que não seja aceitar o ingresso no projeto. Uma espécie de asfixia financeira. O texto de 2020 ainda  insere que os recursos da CAPES terão prioridade de envio para as universidades que aderirem o programa assinando um contrato de resultado, sendo cobradas por parte do governo. Na atual situação de corte para bolsas de pesquisa na graduação, mestrado e doutorado, essa forma de barganha é desrespeitosa com aqueles que têm compromisso com a produção de conhecimento.

Para este ano os recursos para o desenvolvimento de pesquisa por meio do CNPq foram reduzidas em 88% quando comparados com o aprovado para o ano passado. A CAPES sofreu, por sua vez, um corte de 48% em relação ao que havia sido definido na Lei Orçamentária Anual (LOA) de 2019. O orçamento para custeio e capital das Universidades e Institutos Federais também sofreu uma drástica redução. 

O “novo” Future-se reforça a ideia de  criar uma verdadeira hierarquia entre as universidades, e desenvolve uma concorrência interna entre os docentes, além de ser um risco a autonomia universitária. Ele termina pondo abaixo a lógica sobre a qual as instituições de ensino superior do Brasil se sustentam, que é o ensino, a pesquisa e a extensão, separando estes, e dando ênfase ao que ele chama de desenvolvimento científico e empreendedorismo. 

Uma das mudanças apresentadas nesta nova versão é mais uma chantagem. Acaba por terceirizar a gestão das universidades e IFETs e as atividades fins das mesmas, como ensino, pesquisa e extensão, para entidades privadas chamadas Organizações Sociais (OSs), colocando assim a educação superior dentro de uma lógica de mercado, transformados universidades em empresas. O projeto é o primeiro passo para que o Estado não seja obrigado a exercer o financiamento público da educação superior, deixando o mesmo nas mãos da já ditas OSs e demais instituições externas.

Aqueles que o propõe não conhecem a realidade da educação superior brasileira. Um exemplo disto é que em todo projeto a questão sobre a permanência estudantil é completamente negligenciada. Não se fala sobre políticas de assistência que são fundamentais para a manutenção de estudantes advindos de baixa renda, e em especial de estudantes negras e negros. No que tange sobre fontes de recursos, ele busca apresentar como novidade algo que já existe, que é a captação de recursos junto a instituições da sociedade. A questão é que as universidades ao buscar recurso externo o fazem em maioria com empresas e instituições públicas.

Além disso, o movimento estudantil vem sendo alvo para a intensificação do discurso autoritário e antidemocrático da presidência da república. Não à toa a medida provisória do dia 24 de dezembro. Esse governo vem combinando o corte orçamentário com a ofensiva ideológica e reacionária, tentando colocar a população contra os universitários e reprimir o movimento de resistência. Essas medidas repressivas visam justamente os estudantes de universidades e cursos que estiveram na linha de frente da resistência às atrocidades cometidas em 2019. O Future-se no mesmo pacote que os cortes de verbas, a mudança na consulta de reitorias e o discurso de ódio do governo. 

Com o aumento da precarização das universidades e os reflexos congelamento de gastos, a realidade exigirá que sigamos mais firmes para erguer uma muralha contra a interferência do mundo privado na educação pública. As reitorias das universidades precisam estar preparadas para resistir à pressão em aderir ao projeto. Desta forma reforçamos a necessidade de mobilização permanente nas Universidades neste período de volta às aulas para o combate à esse programa. O papel do movimento estudantil nesse momento é manter em cada sala de aula, e por todos os centros acadêmicos e DCE’s do país, mobilizações contra o projeto. É preciso a mais ampla unidade do movimento estudantil com as demais entidades da educação, independente da filiação política para alcançarmos nossos objetivos.

O governo quer encurralar as UF’s, mas o que aprendemos com o “tsunami da educação” de 2019 é que a nossa força também é capaz de pressionar os de cima. É papel da União Nacional dos Estudantes organizar um calendário de ações e uma campanha de rejeição ao Future-se, que se repita em terreno local por DCEs, CAs e DAs. A tarefa mais imediata é ganhar a comunidade universitária para se manter em rechaço ao Future-se.  Aderir ao programa nesse momento é cair na armadilha do governo. Para isso, a propaganda e a disputa ideológica, o diálogo com cada um e cada uma é fundamental para desmascarar as intenções do MEC. É momento de cerrar fileiras em defesa da educação pública.

Não ao Future-se!

Em defesa da educação pública, da ciência e da soberania nacional!

Fora Weintraub!