Reflexões no limiar de 2020

José Carlos Miranda

José Carlos Miranda é ativista social desde 1981. Foi ferroviário e metalúrgico e faz parte da Coordenação Nacional da Resistência-PSOL.

Não consegui terminar o ano sem fazer algumas reflexões sobre este ano de 2019 e mesmo sobre o período pós a crise de 2008/2009, como diriam muitos camaradas, “que fase hein”. E como estamos no período mais festivo do mundo ocidental, – no Brasil tem o Carnaval que talvez seja mais festivo que a semana de Natal e Ano Novo – a reflexão vai um pouco mais longe para tentar ajudar a compreender este período.

A força da conservação de ideias e crenças tem raiz nosso passado primitivo. Tradições, hábitos e rotinas pesam enormemente na consciência humana. É uma constatação da natureza conservadora do pensamento, portanto da consciência em geral. As pessoas, em geral, não gostam de mudanças que confrontem suas crenças e conceitos.

As festividades mais importantes do mundo ocidental, com exceção do Ano Novo, estão ligadas ao calendário cristão, por conseguinte, estas têm origem nas antiquíssimas religiões pagãs e estavam, em geral, ligadas aos diferentes solstícios (dias mais longos em cada hemisfério) que, por sua vez, estava ligada à agricultura.

O Natal tem origem na Saturnália romana, misturada com outras festividades pagãs de origem germânica e eslava. Não existe referência à data de nascimento de Cristo na Bíblia. O cristianismo primitivo celebrava o nascimento no dia 6 ou 7 de janeiro (tradição ainda da Igreja Ortodoxa). Os espertos líderes romanos da Igreja mudaram a data para 25 de dezembro para aproveitar as antigas tradições pagãs.

Poderíamos citar outras datas e festas, existem incontáveis exemplos de demonstração como o passado pesa na consciência e no presente da humanidade. Não à toa, a força enorme que as direções tradicionais da classe e em especial as organizações e forças políticas que despertaram a consciência de classe e lutaram “ombro a ombro” com as massas em suas conquistas tem tanta resiliência.

Os pensadores das classes dominantes, em suas respectivas épocas, sabem bem como manipular e envenenar as mentes contra as “mudanças bruscas” e através de seus meios busca e querem fazer acreditar que o passado era muito melhor e que para o bem-estar geral é melhor conservar as velhas ideias, hábitos, conceitos e valores.

Mas em momentos especiais, uma série de acontecimentos e quase imperceptíveis mudanças transformam quantidade em qualidade. Nestes raros momentos, as velhas ideias, valores, conceitos, hábitos e rotinas são colocados em “xeque”. Homens e mulheres apesar de si mesmos, a realidade objetiva os leva a questionar antigas ideias.

Vivemos sob uma situação reacionária onde as velhas ideias e conceitos “ressurgem” com enorme força e ganham materialidade com o crescimento da extrema direita e do fascismo. Serão necessárias forças poderosas, ou seja, milhões nas ruas e em movimento para criar uma massa crítica com suficiente energia para quebrar essa força reacionária.

Mas, para tal tarefa, não basta o movimento de milhões, o que em si já é um grande feito. É fundamental que essas forças tenham um vetor, ou melhor dizendo, uma direção e ainda que esta direção tenha uma bússola, o que no caso é um programa político que, apresentando um programa de reivindicações transitórias, possa disputar mentes e corações para um caminho diferente da extrema direita e das direções tradicionais que, por sua vez, também não desejam transformações radicais no “status quo”.

Não é uma equação simples, muito pelo contrário, mas ela começa com uma ideia simples, a saber, firmeza titânica nos princípios e flexibilidade tática que necessita compreensão do conjunto da situação, das tarefas e suas hierarquias.

Em toda história da luta de classes, os revolucionários são minoria dentro da minoria durante a maioria do tempo. Por óbvio, essa situação causa efeitos, mas se tivermos a paciência e firmeza necessárias, poderemos ser úteis num grande movimento progressivo para a humanidade.

O acúmulo de quadros experimentados na luta de classes, na paciência de enraizamento no proletariado, no estudo do marxismo e do amplo movimento da classe trabalhadora. São as tarefas gerais deste duro período que poderão preparar uma coluna de quadros para estar à altura do próximo momento raro e especial que citei no início, onde as ideias revolucionárias estarão entre as massas.

Que em 2020 caminhemos mais passos nesta direção.