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BRASIL

Salvador: a chuva cobra a fatura do descaso

Priscila Costa, de Salvador (BA)

Durante todo o dia vimos Salvador ir literalmente por água abaixo. Não faltam vídeos e fotos do desastre social e ambiental que se abateu sobre a cidade nessa terça-feira (26), castigando a maioria da população. A capital e região metropolitana estão sob alerta máximo até, provavelmente, quinta-feira (28) quando a previsão do tempo indica alguma mudança climática.

Somente no bairro do Bom Juá, choveram mais de 247 milímetros, o dobro do esperado para todo o mês de novembro. E isso apenas nas últimas 12 horas. Foi neste mesmo bairro que em 2015, quatro pessoas morreram no deslizamento de terra na localidade do Marotinho.

Alagaram-se as ruas, o metrô, as casas, os ônibus. Milhares de famílias que moram na periferia nesse momento estão sob risco de deslizamento. O discurso do prefeito para justificar o caos foi o mesmo de sempre: a intensidade da chuva. A mesma ladainha de sempre, que só revela a ineficiência da prefeitura, o seu descaso com as vidas ameaçadas nas encostas.

Não importa o tempo que chova. Meia hora, uma hora, duas, basta a chuva vir em Salvador, para com ela vir o caos. Não adianta o prefeito buscar justificativa no tempo que choveu. A culpa é a falta de planejamento urbano. Estamos sofrendo os reflexos do que é viver em uma cidade que é pensada a partir da lógica do capital imobiliário e não da vida das pessoas. No último período ACM Neto removeu mais de 6.000 árvores, reduzindo drasticamente as áreas de absorção de água. Esse é apenas um dos exemplos de ações da prefeitura que não só não resolvem o problema como piora.

Ao invés de gastar milhões com a construção e propaganda de um BRT que simplesmente não se justifica – um dos mais curtos e disparado o mais caro do Brasil – o prefeito deveria investir em um plano de contingência para temporais. Com o valor gasto no BRT, quanto seria possível em macro e microdrenagem? Quanto poderia ser aplicado num plano diretor voltado para estruturação de encostas?

Precisamos rever drasticamente a forma como a nossa cidade é organizada. Esse não é um debate em abstrato, é um debate de dias como o de hoje. Mais real e concreto do que nunca para a nossa vida. O que acontece hoje em Salvador não é uma tragédia, é uma fatura cobrada pelo descaso das autoridades.

Exigimos da Prefeitura de Salvador e do governo do Estado soluções imediatas e a longo prazo. Nas áreas de risco, não basta o soar das sirenes de emergência. As famílias reclamam da falta de orientação, suporte e condições para instalação nos abrigos improvisados nas escolas. O aluguel social está muito longe da demanda de desabrigados e muito abaixo do custo de um aluguel na capital. É preciso também um plano de obras públicas que dê moradia digna as famílias em situação de risco.

Por fim, é preciso registrar como esses momentos revelam o quanto nosso povo é capaz de ser solidário e generoso. São muitos os vídeos e depoimentos de pessoas que ajudam como podem as famílias atingidas. Sindicatos e movimentos sociais também podem ajudar muito nesse momento contribuindo com essa corrente de solidariedade, doando roupas e mantimentos. Cuidando uns dos outros e exigindo que os governos assumam suas responsabilidades. Só assim nos fazemos mais fortes.