O Diretório Nacional do PSOL, a discussão de tática para derrotar Bolsonaro e as eleições 2020


Publicado em: 4 de novembro de 2019

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Rodrigo Bocão, da Executiva Nacional do PSOL

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Entre os dias 26 e 27 de outubro, ocorreu, em São Paulo, o Diretório Nacional do PSOL. Entre os temas debatidos podemos destacar a conjuntura internacional com foco na América Latina, a atualização da situação nacional e a luta contra o governo Bolsonaro, as eleições 2020 e o lançamento do 7º Congresso do Psol.

O debate internacional foi marcado pela nova conjuntura latino-americana aberta com as rebeliões populares no Equador e, principalmente, no Chile. Ao contrário do Diretório Nacional anterior, marcado pela ofensiva golpista apoiada pelos Estados Unidos contra a Venezuela e que foi objeto de polêmica dentro do partido, perante essa nova conjuntura conseguimos estabelecer um consenso de apoio político e militante aos processos de lutas mais ricos de enfrentamento ao neoliberalismo na América Latina. Diante da ofensiva golpista na Bolívia, posterior ao resultado eleitoral, o Psol posicionou-se em defesa da soberania boliviana e reconhecimento da eleição de Evo Morales, sem que isso signifique apoio ao seu governo.

O governo Bolsonaro e o debate de tática na esquerda

Para compreender o debate de conjuntura travado durante o Diretório Nacional, é preciso entender algumas diferenças estruturais de avaliação que conduzem a desacordos das táticas de como construir a luta contra Bolsonaro. As divergências podem ser resumidas nas respostas dadas às perguntas: 1) No Brasil, nos últimos 4 anos, existiu uma derrota político-social ou apenas uma derrota eleitoral? 2) Em qual correlação de forças entre as classes sociais fundamentais decorre dessa avaliação? 3) Qual a tática para derrotar Bolsonaro?

Podemos resumir duas correntes principais de opinião dentro do Diretório Nacional do PSOL sobre os acontecimentos que vem se acumulando desde o golpe parlamentar que derrubou Dilma Roussef.

Dentro e fora do Psol, uma parte da esquerda defende que, no Brasil, ocorreu fundamentalmente uma derrota eleitoral, uma alternância de poder dentro do regime democrático-eleitoral e que o processo de recuperação do movimento de massas pode ser relativamente rápido. Identificam que a situação aberta em junho de 2013 se mantém viva, ou seja, uma situação pré-revolucionária, mas com oscilações na conjuntura política (como foi a derrota eleitoral para Bolsonaro nas eleições). Sendo assim, a vitória do bolsonarismo é muito passageira e a situação pode mudar a qualquer instante. Assim sendo a tática política coerente é o chamado imediato a derrubada do governo Bolsonaro. A consequência prática é o total desprezo pela luta da frente única da classe trabalhadora. Alegando as traições políticas dos governos petistas defendem uma política contra a frente única e de afirmação do PSOL a partir da negação da necessidade da unidade das organizações da classe trabalhadora como se ainda estivéssemos em um dos governos do PT.  É uma versão contemporânea da Teoria da Ofensiva, defendida nos Congressos da III Internacional em oposição à Frente Única.

Felizmente, o Psol vem, desde o golpe de 2015/2016, se posicionando corretamente no cenário político nacional. O partido foi oposição de esquerda aos governos do PT, mas soube reconhecer que as manifestações dos amarelinhos ao redor da FIESP eram reacionários e expressavam um antipetismo de direita. Avaliamos que a eleição de Bolsonaro não é um raio num céu azul, não é um acaso histórico, é expressão de uma derrota de caráter político-social (mas não histórico). Representa também uma derrota estratégica do projeto defendido pela direção lulista concluindo um ciclo político da esquerda brasileira iniciada nas grandes greves do ABC, encerrando na vitória de Bolsonaro nas eleições de 2018 e na intensa reorganização de direita que existe hoje com formação movimentos de extrema direita inéditos no Brasil.

Dentro do “Psol e Todas as Lutas” existe em geral um acordo entre as correntes ao redor dois pontos decisivos: 1) que vivemos uma correlação desfavorável de forças para a classe trabalhadora; 2) que ganhou a luta política no país a ala de extrema-direita neofascista que esteve nas ruas no golpe parlamentar. Como decorrência da avaliação da derrota político-social, da situação reacionária, da correlação de forças desfavorável, emerge a tática da frente única. É a defesa da unidade dos partidos e movimentos sociais da classe trabalhadora para resistir aos ataques da burguesia e à ofensiva do capital. Aceitando o caráter defensivo das lutas, buscando as brechas que se abrem para conseguir uma contraofensiva para inverter a correlação de forças. É a busca para “erguer uma muralha de defesa da classe trabalhadora” para lutar por um desgaste contínuo apostando nas ruas para acumular forças. O centro da luta política é apostar na contra-ofensiva vitoriosa. A frente única foi responsável pelos momentos de maior dificuldade do governo Bolsonaro quando conseguimos colocar milhões de jovens nas ruas com o 15 de Maio em defesa da educação colocando o governo na defensiva.

A tática da frente única não expressa uma capitulação, historicamente esta tática é expressão de uma luta política. As direções do PT e do PCdoB que apostam tudo no calendário eleitoral pensando em 2020 e 2022, na oposição bem comportada que não deve ter como centro as ruas, que não pode desafiar o governo Bolsonaro sob pena dos riscos que isso pode significar ao regime, que pode se aproximar e entregar a liderança da oposição para líderes como Ciro Gomes ou apostar que o enfrentamento à ele deve ser feito sob a liderança de figuras como Rodrigo Maia.

A discussão sobre o “Fora Bolsonaro” no Diretório Nacional do PSOL

A discussão no Diretório Nacional do PSOL não foi entre os que eram favoráveis ou contrários a queda do governo Bolsonaro. O debate está baseado na visão do desenvolvimento da luta política no país, no confronto de visões que identificam a necessidade do chamado permanente à derrubada do governo (como se este estivesse a um passo da queda). Do outro lado, a luta pela frente única cujo objetivo é derrotar a agenda de ataques de Bolsonaro, mobilizar a classe trabalhadora para a resistência e organizar a contraofensiva, sem isolar o PSOL da oposição ao governo Bolsonaro e dos movimentos sociais.

A Resistência defendeu a resolução aprovada porque significa permitir que o PSOL continue nos rumos corretos ao redor da frente única, da organização da luta para uma contraofensiva para derrubar o governo Bolsonaro nas ruas.

Um exemplo importante que devemos observar atentamente foram os acontecimentos da semana 28/10 a 1/11/2019. Denúncias graves surgiram sobre a possibilidade de envolvimento de Bolsonaro no assassinato de Marielle e Anderson, e abriram uma brecha para testar mobilizações, ações e frentes única. Rapidamente o governo reagiu ancorado numa rede de apoio, não só nas suas tradicionais milícias virtuais, mas contando com a conivência de parte das instituições do regime. O pronunciamento do Procurador Geral da República e do Ministério Público do Rio de Janeiro (em tempo recorde) na defesa do presidente evidenciam que o neofascismo da família Bolsonaro tem uma rede de apoiadores dentro das instituições do Estado brasileiro. Longe de mostrar “fraqueza” o episódio foi uma demonstração de relativa força do governo.

Ações como a entrada de pedido de impeachment( defendida pelo deputado David Miranda) desconectadas de um movimento real da classe trabalhadora e da juventude que possa dividir as forças de apoio do governo Bolsonaro ou da sua agenda de governo( que está avançando na Câmara) são também uma expressão dessa avaliação equivocada que pode acabar favorecendo e fortalecendo Bolsonaro caso seja rejeitada pela base de apoio do governo( cenário evidente) que além de sustentar o governo Bolsonaro, apoia sua agenda de ataques a classe trabalhadora que continuam tramitando com prioridade máxima no parlamento.

Queremos dizer com isso que devemos aproveitar as oportunidades abertas, não ficar imóveis, como é o caso da direção do PT e do PCdoB. Mas, é infantil pensar que o bolsonarismo é frágil, que vamos conseguir fazer frente ao governo por fora de uma frente única dos partidos e movimentos sociais.

O PSOL e a tática eleitoral para 2020

O centro da Resolução aprovada no Diretório Nacional é o combate à extrema-direita e a apresentação do PSOL como oposição ao governo Bolsonaro, reafirma a tática de candidaturas própria como prioridade do partido, a política de lançar 1000 candidatos a prefeitos e aumentar a bancada de vereadores em todo o país.

Seguirá o debate nos estados e municípios sobre coligações e o arco de alianças que o partido estará autorizado a fazer. Ainda será pauta de um novo Diretório Nacional e também no VII congresso nacional. Chegou-se ao patamar básico: não fazer coligações com partidos da base do governo Bolsonaro e do chamado “centrão”. Mas, isso é totalmente insuficiente.

Existe em aberto algumas polêmicas sobre o tema das coligações. Entre as posições apresentadas existe uma majoritária que defende a possibilidade de coligações mais amplas que envolve todos os partidos de Oposição ao governo Bolsonaro e a grosso modo uma posição que privilegia coligações com partidos da antiga frente de esquerda (PSTU e PCB).

Na opinião da Resistência a tática de coligações do partido, no marco de privilegiar candidaturas próprias do PSOL, deve estar restrita aos partidos de origem na classe trabalhadora e nos movimentos sociais. Neste sentido, esse arco de aliança envolveria o PT, PCdoB, PCB, UP, PSTU e PCO. Sendo assim, somos contrários a coligações com partidos de oposição burguesa ao governo Bolsonaro como o PDT, PSB, Rede e PV. A nossa posição sobre o Governo Bolsonaro e a existência de uma situação reacionária não nos leva a conclusão de que é preciso buscar construir “frentes amplas no terreno eleitoral”. Este tipo de frente é expressão de um projeto e de uma aliança de classe. Obviamente estamos dispostos à unidade na ação com quem quer que seja na luta contra medidas concretas do Governo Bolsonaro, mas isso não tem qualquer relação com a construção de pactos políticos cujo único acordo real é o pragmatismo eleitoral. A ironia da história é que quando o tema é eleições, algumas das principais correntes que defendem o “Fora Bolsonaro” são as primeiras à buscar acordos “amplos” com partidos da oposição burguesa.

Somos favoráveis a mais ampla unidade de ação com partidos burgueses de oposição nas pautas democráticas. Mas, somos contrários às alianças eleitorais que signifiquem um giro programático do PSOL ao centro, uma espécie de frente ampla eleitoral. Esta também é a política que a Resistência defenderá nos Diretórios Estaduais e Municipais

Em nossa opinião, o PSOL fornecer palanques eleitorais para Ciro Gomes (PDT), mesmo em candidaturas onde nosso partido encabeça, serve para confundir as estratégias da oposição ao governo Bolsonaro. Vale lembrar o papel reacionário por ele desempenhado: ao se diferenciar do PT, pela direita, se mostrou mais confiável para a grande burguesia nacional (um eventual líder de um projeto alternativo ao PT), dialogando essencialmente com o antipetismo de direita. Estar numa chapa no primeiro turno misturado e ocupando o mesmo palanque que Ciro ajuda a gerar uma confusão quando neste momento deveríamos observá-lo como um adversário político que deve ser derrotado. Podemos falar a mesma coisa do PSB que governa vários estados do nordeste aplicando variações das políticas federais. Em muitas regiões do Brasil esses partidos são, além de tudo, verdadeiras legendas eleitorais.

Existe também um debate estratégico. A estratégia do PT para chegar ao poder passou por coligações amplas para governar, esse caminho testado na história nos governos Lula e Dilma terminou no golpe parlamentar de 2016 e nas derrotas que estamos acumulando. Uma nova esquerda deve ter um novo caminho para o poder. Esse caminho passa por um programa anticapitalista e um balanço das experiências dos governos de conciliação de classes, sem sectarismo, mas trilhando uma nova estrada para a esquerda brasileira.


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