Pular para o conteúdo
EDITORIAL

AI-5 nunca mais

Editorial 1 de novembro
reprodução

A fala de Eduardo Bolsonaro sobre a possibilidade de um novo AI-5 no Brasil não foi um raio em céu azul. A família presidencial, sistemática e regularmente, vem apresentando sem disfarces seu objetivo estratégico: destruir as liberdades democráticas e instaurar uma ditadura no país.

As declarações do clã obedecem a um padrão: proferem as ameaças e depois, ante a reação provocada, fazem mea-culpa. Não se trata de um devaneio ou de uma ação desprovida de sentido. O propósito é consciente e calculado: deixar nítido para sua base de apoiadores qual é o projeto do bolsonarismo.

Em setembro, Carlos Bolsonaro postou no Twitter que “por vias democráticas a transformação que o Brasil quer não acontecerá na velocidade que almejamos”. No dia seguinte, disse que foi mal interpretado. Do mesmo modo, nesta quinta (31), após a repercussão de sua defesa do AI-5, Eduardo afirmou que sua declaração havia sido distorcida. O ministro do Gabinete de Segurança Institucional, general Augusto Heleno, deu apoio à fala do deputado, dizendo que “se ele falou, tem que estudar como vai fazer”.

Na defesa de um eventual golpe autoritário, tanto Eduardo Bolsonaro, quanto Augusto Heleno evocam o fantasma de protestos radicalizados contra o governo, como os que estão acontecendo no Chile. O general afirmou: “Se houver algo como no Chile, tem de conter”. Já Eduardo declarou que “se a esquerda radicalizar a esse ponto, vamos precisar dar uma resposta”. Ou seja, o bolsonarismo busca antecipar um cenário que supostamente justificaria o fechamento do regime democrático-liberal.

A nova ameaça de golpe vem na esteira da revelação de uma possível ligação da família Bolsonaro com a execução de Marielle Franco e Anderson Gomes. Para responder à matéria veiculada pela TV Globo, o bolsonarismo colocou, rapidamente e de modo articulado, o Ministério da Justiça (Sérgio Moro), a Procuradoria Geral da República (Augusto Aras) e o Ministério Público do Rio (procuradoras do caso Marielle) a serviço da defesa do presidente, em uma evidente — e escandalosa — demonstração de aparelhamento político das instituições.

Diante da fala de Eduardo acerca de um novo AI-5, diversas autoridades, partidos e lideranças políticas vieram a público manifestar repúdio à ameaça. Rodrigo Maia, presidente da Câmara dos Deputados, afirmou que as declarações são “repugnantes” e passíveis de punição. Por sua vez, o Ministro do STF, Marco Aurélio, disse que “estão solapando a democracia”.

Corretamente, os partidos da oposição (PSOL, PT, PCdoB, PSB, Rede e PDT) protocolaram um pedido de notícia-crime contra Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) no Supremo Tribunal Federal. O grupo argumenta que o filho do presidente da República, e líder do PSL na Câmara, cometeu incitação e apologia ao crime.

Não há duvidas: a família presidencial se prepara abertamente para a possibilidade de um golpe, ainda que ele não esteja colocado neste momento. Suas ameaças não podem ser subestimadas: milhões de brasileiros os seguem, e aumentou sua influência no interior das instituições, especialmente, sobre as Forças Armadas, Polícia Federal, PGR, setores do Judiciário, veículos da grande mídia e igrejas evangélicas.

Perante a perigosa escalada autoritária do bolsonarismo, é urgente que todos os setores (lideranças, partidos, instituições etc.) que se dizem comprometidos com a defesa das garantias democráticas tomem ações efetivas para dar um basta às ameaças golpistas. Palavras e discursos não são suficientes: o mais importante são atos práticos. E o primeiro deles deve ser a imediata cassação do mandato de Eduardo Bolsonaro.

Cabe à esquerda e aos movimentos sociais, sindicais e estudantis, alertar o povo brasileiro do perigo representado por Bolsonaro, assim como retomar a unidade na luta contra o governo e seus ataques.

Bolsonaro faz de modo combinado a destruição de direitos sociais, trabalhistas e democráticos, e o alvo principal é a classe trabalhadora e os oprimidos, assim como suas organizações de defesa. Na terça (5), estão sendo convocados atos em todo país para exigir justiça para Marielle e Anderson (quem mandou matar?) e contra a ameaça golpista. Vamos às ruas. É preciso agir para impedir que eles alcancem seu objetivo, antes que seja tarde.