Ontem, dia 30 de outubro, assistimos a uma mega operação política que visa blindar e livrar o atual Presidente da República, Jair Bolsonaro (PSL), de qualquer investigação sobre suas relações com as milícias do Rio de Janeiro e até com os principais acusados de serem os executores de Marielle e Anderson. Depois de evidente e forte pressão sobre o Ministério Público do Rio de Janeiro (MP-RJ) e sobre a Polícia Civil do Estado, esses órgãos envolvidos diretamente na investigação concluíram, de forma ligeira e superficial, que o porteiro mentiu.
Ou seja, segundo essa nova versão, o porteiro resolveu mentir sobre o simples fato de ter sido um homem que estava na casa 58, a de Bolsonaro, que ele identificou como “seu Jair”, que autorizou a entrada de Élcio Queiroz, um dos acusados de ter participado diretamente no assassinato Marielle e Anderson, no condomínio de luxo em frente a Praia da Barra da Tijuca, onde mora o atual presidente e também Ronnie Lessa, o outro principal suspeito deste crime político brutal.
Essa pressão política foi realizada, principalmente, pelo Procurador Geral da República, Augusto Aras; e pelo Ministro da Justiça, o ex-juiz da Lava Jato, Sérgio Moro. Os dois agiram rápido, depois da reação absurda, autoritária e desequilibrada de Bolsonaro, através de um vídeo, gravado na Arábia Saudita e publicado numa rede social.
Houve uma ameaça direta de federalizar toda a investigação do caso Marielle e que a Polícia Federal (PF) seria acionada para colher imediatamente um novo depoimento do referido porteiro. Segundo Aras, o Supremo Tribunal Federal (STF) já havia, inclusive, arquivado qualquer investigação sobre o envolvimento de Bolsonaro no caso.
Outra informação relevante, divulgada ontem, foi que o governador do RJ, Wilson Witzel (PSC), seu ex-aliado político, já havia avisado Bolsonaro sobre a citação do nome do presidente na investigação. Portanto, apesar da pseudo indignação demonstrada por Bolsonaro no vídeo, ele já sabia desta informação desde pelo menos o dia 9 de outubro.
O fato de Bolsonaro ter estado em Brasília no dia 14 de março de 2018, quando ocorreram os fatos, não anula a denúncia de que a autorização para entrada do miliciano Elcio no condomínio tenha partido da casa do presidente.
Mesmo que o áudio sobre essa conversa no interfone não tenha sido encontrada, ou mesmo se o porteiro mudar agora seu depoimento, é necessário investigar. Por que o porteiro teria mentido? Inclusive, por que ele mentiu sobre um episódio envolvendo dois perigosos assassinos profissionais e um presidente da República?
No mínimo, todo o episódio é estranho, e precisaria ser melhor esclarecido e, para tanto, deveria ser amplamente investigado. Mas, ao contrário, a decisão é encerrar o caso de forma açodada.
Essa operação de blindagem de Bolsonaro revela uma perigosa subordinação de importantes instituições do Estado, especialmente do Poder Judiciário, às pressões políticas do presidente e seus aliados.
Uma situação gravíssima, ainda mais diante da evidente escalada autoritária realizada durante o primeiro ano deste governo de extrema direita neofascista, que ameaça a liberdade de imprensa e os mínimos direitos democráticos. Se calar diante deste fato é um grave erro.
Relações perigosas
Além do episódio envolvendo o depoimento do porteiro, o que precisa ser investigado de fato são as possíveis relações da família Bolsonaro com as milícias do Rio de Janeiro.
A cada dia que passa ficam mais evidentes as relações do ex-policial Fabrício Queiroz, amigo antigo de Jair Bolsonaro e operador político de Flávio Bolsonaro (seu filho 01) com as milícias, especialmente a de Rio das Pedras, comunidade localizada no bairro de Jacarepaguá, Zona Oeste da cidade do Rio de Janeiro. Queiroz pode ser o elo da família com as milícias. Um assunto de enorme gravidade, que deve ser investigado.
Existem fortes evidências de que Queiroz manteve negócios de transporte alternativo nesta comunidade, controlada por vários anos pela milícia. É desta mesma região a origem de muitos milicianos do escritório do crime, inclusive do miliciano Adriano da Nóbrega, foragido da polícia, que foi homenageado por Flávio Bolsonaro na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj). A esposa e a mãe deste conhecido criminoso trabalharam por anos no gabinete de Flávio na Alerj. Queiroz assume ser um amigo do miliciano Adriano e os áudios de Queiroz, divulgados recentemente, demonstram que, até hoje, ele tem influência nos negócios políticos dos Bolsonaro.
Portanto, estes fatos, dentre outros, são mais que suficientes para justificar uma investigação de forma séria, profunda e transparente. E não um arquivamento apressado, provocado por uma operação absurda de blindagem de Bolsonaro.
Manifestações devem cobrar investigação, já
Diante da operação política de blindagem de Bolsonaro, essas manifestações aumentaram ainda mais a sua importância. Não podemos nos calar diante de todo esse absurdo. E muito menos deve-se confiar que o STF vai realmente investigar Bolsonaro. A saída passa pela retomada das mobilizações, cada vez mais unificadas e construídas desde os locais de trabalho, estudo e moradia. O caminho é retornar às ruas para derrotar o governo Bolsonaro e seus terríveis ataques aos diretos sociais e democráticos. Basta!
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