Em protesto por ações em combate às mudanças climáticas, países de todo o mundo irão às ruas nesta sexta-feira (20) compor a Greve Mundial Pelo Clima, inspirada no movimento Fridays for Future. A Greve que acontecerá no Brasil está sendo chamada pela Coalizão Pelo Clima, uma frente ampla e suprapartidária composta por cerca de 70 organizações sociais e ambientalistas. Embora o principal mote seja cobrar do governo o seu compromisso em diminuir a emissão de gases do efeito estufa, essa mobilização também especifica uma série de medidas que podem, de fato, alterar as estruturas que sustentam a crise ambiental.
Por que devemos mobilizar junto à Greve Mundial pelo Clima? Porque se não formos nós, não será ninguém. O governo nunca se preocupou em sequer parecer favorável de fato à pauta do meio ambiente e sempre o relacionou à lógica do lucro, mesmo que um dos mecanismos para isso seja impor no raciocínio de muitas pessoas que “temos muito” e vamos usar disso a nosso favor. O que faltou explicar foi que usar o meio ambiente a nosso favor implica, justamente, em preservá-lo.
Em tempos que o capitalismo esgota os recursos naturais ao redor do mundo, os olhos desse mesmo mundo se voltam para o Brasil. Em nove meses de governo houveram flexibilizações, cortes de verba, estrangulamento financeiro e esvaziamento de órgãos ambientais e, tudo isso, culminando na salvaguarda dada aos madeireiros, nos assassinatos de ambientalistas, na criminalização de movimentos sociais, no “genocídio à luz do dia” dos povos originários e no dia do fogo. Frente à isso e ao fato de o Brasil abrigar a maior biodiversidade e a maior riqueza natural do planeta, não seria esperado que esse mesmo país fosse o precursor e principal impulsionador da Greve Mundial Pelo Clima? Não desejando tirar das mãos da corajosa Greta Thunberg a precursão do Fridays for Future, mas é um questionamento que devemos fazer.
Um dos maiores obstáculos para se ter uma forte mobilização pela garantia do que seja é a falta de memória. À exemplo da ditadura militar (ou, como dizem erroneamente nos Colégios Militares, “revolução de 1964”), que outrora não condenou os assassinos do regime e hoje colhe os frutos de uma política de esquecimento. A ditadura foi um período desesperador para a natureza brasileira. Podemos citar a construção da Transamazônica (remoções forçadas e nenhum estudo de impacto ambiental); a mina de Serra Pelada (e as relações de trabalho lá existentes); as usinas de Tucuruí, Balbina, Itaipu e Ilha Solteira; a energia nuclear e seu potencial catastrófico nas usinas Angra I e II; e, é claro, a frase de Castello Branco, que justificava tudo isso: “integrar para não entregar”. Assim como não era do interesse dos poderosos que os trabalhadores lutassem pelos seus direitos, diretamente atrelados à preservação do meio ambiente, também não é do interesse do nosso governo entreguista, muito menos dos capitalistas, que se preserve o bem (não renovável) que eles visam lucrar em cima. Como se ludibria, então, uma massa de pessoas crentes de que vivem em um sistema plenamente democrático de que se pode extrair bens não renováveis e que está tudo bem? Não se ludibria, se omite. Há privações quanto ao acesso aos direitos mais básicos de uma população, a começar pela educação, e isso se dá das mais diversas formas, começando pelos cortes de verbas do ensino público e terminando no governo “refutando” dados científicos simplesmente porque não concorda, como se dados científicos fossem passíveis de discordância ou não.
Nós estamos vivendo uma avançada fascista, para compreender melhor: três dias antes do dia do fogo, o Ibama recebeu do MPF um alerta sobre essa ação. A resposta do Ibama, datada do dia 12 de agosto e assinada por Roberto Victor Lacava e Silva, diz que as ações de fiscalização “estavam prejudicadas por envolverem riscos relacionados à segurança das equipes em campo”. Na resposta também consta que o Ibama acionou o Ministério da Justiça, solicitando o apoio da Força Nacional, pedido que foi ignorado por Sérgio Moro. Porém, no dia 8 de agosto, Moro publicou uma portaria autorizando a atuação da Força Nacional contra os protestos de estudantes que aconteceram dia 13 em todo o país.
Contra os estudantes, a Força Nacional. Com os garimpeiros, um vergonhoso respaldo do Planalto. Nesta segunda (16), garimpeiros envolvidos com desmatamento ilegal foram, pasmem, recebidos por ministros. Nas palavras de um deles: “…disseram que nunca houve tanto ministro para atender a gente numa reunião dessa”. A reunião, que não constava na agenda oficial, pautou a alteração das leis sobre as florestas nacionais, as áreas de preservação ambiental e a mineração em terras indígenas. Como o estopim da reunião era a destruição do maquinário ilegal pelos fiscais do ICMbio, Ibama e também da Força Nacional, foi exigido dos ministros medidas de sanção contra esses fiscais. Vale lembrar que, mesmo que a destruição de máquinas usadas no desmatamento ilegal tenha sido desestimulada por Ricardo Salles, ela está dentro da lei.
Nos marcos dos tempos atuais, estamos vivendo uma perigosa combinação de fatores: o Brasil é amplamente diverso em fauna, flora e recursos naturais e é também um dos poucos países onde a pesquisa ainda pode ser desatrelada da iniciativa privada. Para os que ainda pensam que a iniciativa privada poderia impulsionar pesquisas de grande interesse para a sociedade, na verdade, empresas impulsionam pesquisas que garantem a venda de seus produtos. Então, não são à toa as recorrentes e violentas investidas contra os cientistas e qualquer um que possa se opor ao modelo de “preservação” empregado hoje por Bolsonaro.
O principal mote da Greve Mundial pelo Clima é o aquecimento global. Infelizmente, tivemos 95% das verbas para políticas climáticas cortadas, o que não é de se surpreender, tendo em vista que Bolsonaro é cético em relação à alta abrupta na temperatura global. Mesmo que ele não seja cético por informação e sim porque não o convém respeitar esse fato. Dentre as ações que intensificam a liberação de gases do efeito estufa está a queima de biomassa vegetal, o desmatamento e a criação de gado, atividades que temos visto com perturbadora frequência nos últimos meses. Essas mesmas atividades se fortalecem, também, no enfraquecimento de quaisquer meios alternativos, como a agricultura sustentável, por exemplo.
Posto isso, é nosso dever estar firme contra as medidas de Bolsonaro e não apenas resistir à elas, mas combatê-las. Certamente um dos motivos pelos quais o atual governo tenta criminalizar movimentos sociais e desacreditar cientistas, é o de que esses dois grupos concordam e se unem no fato de que as mudanças climáticas e o aquecimento global resultam dos processos de destruição ambiental causado pelo modo capitalista de produzir e o modo liberal de lucrar. A natureza não é rapidamente cíclica como o mercado financeiro, bem como uma floresta milenar não se reconstrói em décadas. Nos somando à Greve Mundial pelo Clima estamos também lutando pelos povos originários, pelo funcionamento e permanência dos órgãos de proteção ambiental e pela preservação. Essa, que por vezes parece tão distante de nós que vivemos rotinas atribuladas, é o começo, meio e fim da nossa vida. Pela pesquisa, pela cobrança aos grandes devedores (agronegócio, pecuária, bancos, igrejas e indústrias), pelo reflorestamento, pelo investimento em energias renováveis e pela neutralização das emissões de dióxido de carbono até 2030, às ruas na Greve Mundial pelo Clima. Somos muitos, somos fortes e não há tempo para temer!
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