MBL muda discurso para parecer “limpinho e cheiroso”, mas seu passado o condena

Direita Volver

Coluna mensal que acompanha os passos da Nova Direita e a disputa de narrativas na Internet. Por Ademar Lourenço.

Muita gente se espantou com o discurso do deputado Kim Kataguiri atacando Eduardo Bolsonaro. Ele e seu “Movimento Brasil Livre” sempre estiveram lado a lado com a família presidencial: no Impeachment da Dilma em 2016, na defesa da Reforma trabalhista em 2017, na campanha de 2018 e na Reforma da Previdência nesse ano. Porque essa briga entre antigos aliados?

Uma explicação seria a queda de popularidade do presidente Jair Bolsonaro. Os ratos são os primeiros a abandonar o navio quando ele está afundando. O governador de Santa Catarina, eleito pelo mesmo partido da família Bolsonaro, PSL, também já está mostrando diferenças com o governo federal. Sem falar no deputado Alexandre Frota, que saiu da base governista denunciando as Fake News na campanha presidencial de 2018.

Eles sabem que o presidente não consegue dialogar para além dos 30% da população que o apoia. E os outros 70% estão a cada dia mais insatisfeitos. Para evitar que a esquerda vença a disputa pela opinião pública, tem surgido nos últimos dias a “direita limpinha e cheirosa”, que critica os absurdos ditos pelo Bolsonaro.

A ideologia desse pessoal que rompe com Bolsonaro continua a mesma do presidente. Eles são defensores da Reforma da Previdência, que vai obrigar a maioria a trabalhar vários anos a mais para se aposentar. Eles também defendem a retirada de direitos dos trabalhadores e a privatização de empresas públicas. Não se vê um pio dessa direita limpinha e cheirosa contra o estrangulamento das universidades públicas promovido pelo Ministério da Educação.

Não se trata de diferenças, mas de uma divisão de tarefas. Enquanto Bolsonaro fala para uma base mais fiel às ideias da direita, o MBL e outros grupos fazem um discurso menos radical para confundir o resto da população. Na hora de aprovar medidas que prejudicam os trabalhadores, eles estão todos juntos.

MBL “paz e amor” não engana ninguém

Em entrevista recente, o líder do MBL Kim Kataguiri chegou a fazer uma “autocrítica” por ter simplificado demais o discurso durante o impeachment de Dilma e que agora o movimento estaria em uma nova fase. Seria mais dialogável e menos agressivo. Ele chegou até a dizer que “tem gente bem intencionada na esquerda”. Os xingamentos chulos contra quem pensa diferente teoricamente ficaram para trás.

Esta mudança se deu porque agora os líderes do MBL se deram bem na vida. Kim se tornou deputado federal. Arthur do Val “mamãe falei” não faz mais seus vídeos intimidando militantes de esquerda. Agora, além de deputado estadual, virou “coach” para quem quer melhorar a retórica. O discurso juvenil e cheio de xingamentos e palavrões não cabe mais para aqueles já conseguiram emprego “top” e dinheiro no bolso.

Mas a internet está aí para lembrar o que é o MBL. É aquele pessoal que espalhou mentiras sobre Marielle Franco para justificar seu assassinato. São os mesmos que foram às ruas para impedir uma palestra da filósofa Judith Butler, que escreve sobre diversidade sexual. Nesses atos, uma boneca da escritora era queimada sobre os gritos de “queimem a bruxa!”.

Na primeira oportunidade, eles vão voltar às agressões e xingamentos. Não dá para confiar neste tipo de gente. São oportunistas que fazem o que é preciso para se dar bem na vida. Se Bolsonaro decidir dar um golpe e implantar uma ditadura, eles vão estar do lado do Bolsonaro.

De UDR a UDR, a história do MBL

Eles se tornaram bem populares nos atos de 2015 pelo impeachment de Dilma. Antes, já chamavam a atenção trabalhando na campanha de Aécio Neves para presidente em 2014. A grande novidade que eles apresentavam era um discurso conversador e privatista com humor e linguagem juvenil. Era a “estética da zueira” a serviço das ideias de direita.

Nos primórdios desta estética esteve a banda “Bonde do Rolê”, liderada por Pedro D’Eyrot, que também é um dos fundadores do MBL. Entre outras coisas asquerosas, suas músicas “brincavam” com temas como pedofilia e apologia ao tráfico. Eles se inspiraram no estilo criado pela banda UDR 666, que misturava funk, rap, apologia ao estupro e satanismo.

Não se espantem. Esse movimento musical do início dos anos 2000 era composto por meninos muito bem criados por suas mães. Apenas falavam coisas nojentas na internet para chamar a atenção. Seu público era composto por jovens de classe média que achavam aquilo uma espécie de evolução dos Mamonas Assassinas. Foi ali que surgiu a fórmula “falar merda na internet e ser tosco para conseguir fama”.

Vamos para 2013, quando o grupo “Estudantes Pela Liberdade” criou a página Movimento Brasil Livre no Facebook para intervir nos gigantescos atos daquele ano. O nome MBL era parecido com MPL (Movimento Passe Livre), que os organizou na época protestos contra o aumento da passagem em São Paulo. Foi o início da onda de manifestações. Os “estudantes pela liberdade” era um grupo de jovens direitistas que tinham relação com movimentos semelhantes fora do Brasil.

Em 2014, o grupo fez campanha para o candidato à deputado Paulo Batista com vídeos toscos e o slogan “contra comunista, vote Batista”. Ali, Pedro D’Eyrot e sua turma ensaiaram a revolução estética que iriam implementar na direita brasileira. Depois, veio o trabalho de redes sociais para a campanha presidencial de Aécio Neves.  Durante os atos contra Dilma, passaram a usar a página do “MBL” no Facebook. O resto da história já é bem conhecido.

Hoje, os jovens “zueiros” se tornaram senhores mais sérios. Se filiaram ao DEM, que tem como base os grandes fazendeiros que controlam currais eleitorais em cidades pequenas, os famosos “coronéis”. Se tornaram a reserva de quadros da velha política. Agora fazem de tudo para parecer “homens sérios e confiáveis”. Viraram “tiozões” muito precocemente.

Em sua atuação como deputado federal, o líder do MBL Kim Kataguiri defende ferozmente os interesses dos grandes fazendeiros. Os mesmos que na década de 80 criaram a UDR (União Democrática Ruralista) para defender seus interesses e se armar contra os movimentos sociais do campo.

Da “zueira” irresponsável na internet até o trabalho de terno e gravata, o MBL mudou de estética mas não mudou de opção de classe. Sempre defenderam e sempre defenderão os interesses dos ricos e poderosos. Sempre mostraram desprezo pelo povo e pelos movimentos sociais. De UDR a UDR, o movimento de direita juvenil continua sendo nosso inimigo.