Extrema direita cresce na Alemanha e consolida o segundo lugar em duas eleições estaduais

Resultado aponta enfraquecimento da esquerda radical em regiões em que teve forte apoio nas eleições passadas

Gustavo Rotte, de São Paulo (SP)

Neste domingo (01/09), ocorreram duas importantes eleições estaduais na Alemanha: uma em Brandemburgo, estado que circunda Berlim, e outra na Saxônia. Na Alemanha, os votos as eleições são realizados para os partidos que ocuparão o parlamento estadual. A depender do resultado, forma-se uma coalizão de maioria simples e define-se o gabinete que governará o estado indiretamente.

O resultado confirmou a tendência prevista tanto pelas pesquisas de opinião quanto pela opinião dos analistas: o crescimento do partido de extrema direita AfD (Alternativa para a Alemanha). A extrema direita angariou 23,5% dos votos em Brandemburgo e 27,5% na Saxônia, o que representa um crescimento gigantesco de, respectivamente, 11,3% e 17,8% em relação à última eleição. Para a extrema direita, o resultado está em consonância com os números da eleição para o parlamento europeu de maio desse ano, da qual o AfD saiu vitorioso, em primeiro lugar, nos dois estados. Se já era extremamente forte na região desde sua criação, o AfD mostra agora que sua base se consolidou e tende a crescer, tirando votos dos dois lados do espectro político-partidário.

Conservadores e sociais-democratas

O primeiro lugar ainda ficou nas mãos dos dois partidos tradicionais: o SPD (Partido Social-Democrata), em Brandemburgo, e o conservador CDU (União Democrata-Cristã), na Saxônia. No entanto, a vitória vem com ares de derrota, pois acarretou, no caso do SPD, uma perda de 5,7% dos votos e, no caso do CDU, uma diminuição drástica de 7,3% em relação ao último parlamento. Com isso, o resultado mostra que os dois partidos sofrem com uma erosão cada vez maior de suas bases, apesar de serem ainda hegemônicos. Suas perdas só não foram maiores do que a da esquerda radical.

A esquerda radical

As eleições deste domingo mostraram também a mudança na influência política do partido Die Linke (A Esquerda) na região que era a Alemanha oriental. Nela, a esquerda radical sempre teve uma base eleitoral consolidada, formada por aqueles afetados pelo choque de capitalismo que veio após a queda do muro e por gente de esquerda que nunca deixou de crer na possibilidade do socialismo em uma estrutura democrática progressista.

Em Brandemburgo, de 2004 até 2014, a esquerda radical ocupou o segundo lugar no processo eleitoral, atrás apenas do SPD. Em 2014, perdeu lugar para o CDU, ficando em terceiro, mas mesmo assim conseguindo participar no governo em uma coalizão com o SPD e os verdes (Bündnis 90/Die Grünen). Agora, o partido ocupa o quarto lugar, empatado com os verdes e atrás do SPD, AfD, CDU. De 2014 para cá, a queda foi de 7,9%. Ainda assim, se a esquerda radical se juntar com os verdes e o SPD novamente, é possível que o AfD fique longe do governo.

Já na Saxônia, o Die Linke ocupa o segundo lugar desde 1999, a segunda eleição após a unificação da Alemanha. Na região, o primeiro lugar foi sempre ocupado pelo CDU. Agora, com o crescimento da AfD, o Die Linke caiu para o terceiro lugar. Em um percentual similar ao resultado de Brandemburgo, o partido perdeu 8,5%. No ano passado, a esquerda radical ficou fora do governo, que foi dirigido por uma coalizão entre SPD e CDU, o que deve se repetir para deixar o AfD de fora.

De qualquer modo, o resultado se coloca como uma pesada derrota para a esquerda radical, que parece não ter conseguido aproximar a população de seu projeto nem nos estados onde sempre teve apoio. Agora, parece que o AfD tem conseguido obter não apenas votos do conservador CDU – marcado por anos de administração federal relativamente aberta à imigração – como também da esquerda progressista e democrática.

Os verdes e o futuro da Alemanha

A segunda previsão para estas duas eleições, o crescimento do partido verde, não se confirmou. O resultado das eleições para o parlamento europeu, em que o partido verde ficou em segundo lugar, havia dado a impressão de que seriam uma nova potência nessas eleições estaduais. Acreditava-se também que o partido iria dobrar o número de votos. No entanto, não foi isso o que ocorreu e o crescimento moderado do partido deu sinais de que sua plataforma não foi atraente como o esperado em um local onde os verdes sempre tiveram dificuldades. Ainda assim, em Brandemburgo eles conseguiram empatar com a esquerda radical e garantiram 10 assentos no parlamento estadual.

Em centros urbanos importantes, como Bremen e Berlim, eles têm mais apelo e têm governado em coalizões com a esquerda radical e o SPD, mostrando uma certa afinidade com o espectro mais progressista do cenário partidário alemão. Assim, foi nas grandes cidades que os verdes tiveram seus melhores resultados neste domingo. Em Potsdam, capital de Brandemburgo, e Dresden e Leipzig, maiores cidades da Saxônia, eles conseguiram garantir votações expressivas. Nas eleições municipais deste ano, eles já haviam garantido primeiro lugar em Leipzig e segundo lugar em Dresde, atrás do Die Linke.

No entanto, as eleições deste domingo mostraram que o entusiasmo ecológico não foi capaz de superar o ressentimento que alimenta a extrema direita, apesar de ter sido responsável por ter tirado pequena parcela de votos da esquerda radical e, em maior grau, dos partidos tradicionais

Por todos esses motivos, o resultado das eleições estaduais deste domingo se comprova como um dos principais indícios dos novos rumos da política na Alemanha e um sinal preocupante para a próxima eleição federal. Isso porque, independentemente do resultado, uma grande mudança política deve ocorrer em nível federal, dado que Angela Merkel deve deixar o cargo depois de 20 anos à frente do país. Somado a isso, tudo indica que já há uma recessão em curso no país, o que tende a inflamar ainda mais a extrema direita.