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BRASIL

Governo Fátima Bezerra (PT) ensaia estelionato eleitoral ao apoiar a inclusão de estados e municípios na reforma da Previdência

Maurício Moreira, de Natal (RN)

O Nordeste tem sido um importante dique de contenção contra os impulsos autoritários do bolsonarismo. A rejeição às ideias da extrema direita se expressou categoricamente nas eleições presidenciais de 2018 quando no segundo turno Bolsonaro só obteve 30,3% dos votos válidos na região, contra 69,7% de Haddad. Todos os governadores eleitos no Nordeste não faziam parte da chapa presidencial de Bolsonaro. O PT elegeu quatro governadores, dentre eles a ex-senadora Fátima Bezerra no Rio Grande do Norte (RN), com ampla margem em relação ao candidato representante de berço das oligarquias, Carlos Eduardo Alves, que se colocou como o candidato de Bolsonaro no segundo turno. Mas a maioria do povo trabalhador e a juventude nordestina não depositaram na urna apenas um voto, mas também a esperança de que os governos do Nordeste poderiam ser um contraponto ao programa ultraliberal de retirada de direitos do governo Bolsonaro. 

Porém, passados oito meses não é bem isso que vem ocorrendo. Os governadores do Nordeste, tendo à frente os do PT, vêm capitulando à principal agenda econômica do mercado e do governo, que é a reforma da Previdência. Não só passaram a apoiar a contrarreforma (depois de sugerirem algumas poucas alterações que não tiveram quase nenhum impacto negativo nas estimativas do governo – de R$ 1 trilhão baixou para R$ 900 bilhões), como agora atuam na surdina junto ao governo e ao Senado para  que a reforma também inclua os estados e municípios. 

O ministro da Economia, Paulo Guedes, prometeu ao mercado que com a reforma irá “economizar “ 900 bilhões em 10 anos, sendo que 80% desse valor virá de quem ganha até três salários mínimos, portanto a maior parte será subtraído do povo pobre e trabalhador que está na base da pirâmide social.

Nem precisamos nos estender para explicar o tamanho do crime que está sendo cometido, pois o Brasil é um dos países mais desiguais do mundo, onde os 10% mais ricos da população se apropriam de cerca de 60% da renda nacional. Mas só para ficarmos em uma atrocidade, os trabalhadores terão que trabalhar 40 anos para ter direito a aposentadoria integral (hoje 80% delas são de até dois salários mínimos), o que significará na prática o fim do direito a aposentadoria integral e o rebaixamento geral dos valores da aposentadoria em um curto prazo.

Além disso, a reforma é um ataque ainda maior contra as mulheres, que terão que trabalhar mais para tentar se aposentar, em especial as professoras, que terão que cumprir uma idade mínima, o que vai sabotar a aposentadoria especial da categoria. Um tema que deveria ser levado em consideração por Fátima, a única mulher a frente de um governo estadual e que começou sua vida política nas lutas da educação. 

O governo Fátima, que até então vinha expressando uma posição gelatinosa sobre o tema, sinalizando meio que um apoio crítico e afirmando: “defendemos a necessidade dela [Reforma da Previdência], mas desde que a proposta não venha penalizar os trabalhadores e os mais pobres”, agora, no início de agosto deixou clara a fatídica posição do governo. Na ultima reunião do Fórum dos Governadores do Brasil, representado pelo vice-governador Antenor Roberto (PCdoB), firmou o aval do governo estadual para a inclusão de estados e municípios na Reforma. Em discurso durante o encontro, Antenor disparou: “o tema foi o primeiro a ser abordado no fórum e o que durou mais tempo em debate. Os governadores estão convencidos, e também é a posição da governadora Fátima Bezerra que a reforma tem que ser nacional.”

Esse posicionamento que se apoia em desbotadas ideias liberais joga água no moinho dos que ecoam há décadas a falácia de que um suposto “deficit“ da previdência seria responsável pelo “buraco das contas públicas” e pela crise. Mas não nos causa espanto, uma vez que Fátima Bezerra, enquanto deputada federal, apoiou a reforma da Previdência do governo Lula em 2003 que atacou o funcionalismo público federal, enquanto os parlamentares do PT que se insurgiram para não trair os trabalhadores foram expulsos do partido e fundaram o PSOL. 

Mas o que mais impressiona é que agora o governo Fátima, de apoiador crítico da reforma da previdência de Bolsonaro, passou a questionar sua insuficiência e a fazer lobby junto aos senadores para incluir os estados e municípios, o que penalizará sobretudo, os servidores públicos, milhares de professoras, agentes de saúde, assistentes sociais e outras categorias que serão duramente atingidas. Uma atitude que contraria suas promessas durante a campanha eleitoral, quando dizia: “Eu acabei de me reunir com o Fonacate, que é o Fórum Nacional das Carreiras Típicas de Estado, e reafirmei o compromisso com os servidores públicos do Rio Grande do Norte. Gestão profissionalizada, diálogo permanente, políticas de valorização e todo o empenho para regularizar o pagamento em dia dos servidores. Uma gestão onde os servidores de carreira sejam valorizados” Não é demais lembrar, que ela denunciava duramente o seu antecessor, o governo Robinson Faria (PSD) pelos sucessivos saques de recursos da previdência estadual e pela tentativa de aprovar uma dura reforma contra os servidores na ALERN no início de 2018. 

No lugar de escolher o caminho da “gestão responsável”, nome pomposo para um projeto ancorado em fórmulas liberais, o atual governo deveria realizar uma varredura nas contas do IPERN (Instituto de aposentadoria do funcionalismo estadual) através de uma auditoria e devolver ao fundo todo o valor retirado ilegalmente pelo governo anterior, equilibrando financeiramente o IPERN. Também precisa retirar seu apoio a proposta de inclusão dos estados e municípios à reforma e chamar as organizações dos trabalhadores para construir propostas que garantam o direito do funcionalismo a aposentadoria digna.

Porém, o governo parece escolher o caminho que só penaliza os trabalhadores em nome de uma política de austericídio fiscal responsável por nacionalmente aprofundar uma crise que está sendo descarregada integralmente sob os trabalhadores, resultando em arrocho e desemprego em massa. É lamentável que enquanto mobilizações de trabalhadores, jovens, indígenas, quilombolas ocorrem em todo o país e também no RN, se enfrentando contra as ações do governo Bolsonaro (que ataca ostensivamente os direitos sociais e as liberdades democráticas), o governo Fátima Bezerra que foi eleita sob uma agenda política oposta(que ecoava muitas dessas lutas), vire as costas e passe a fazer coro com a burguesia, Bolsonaro e Rodrigo Maia para atacar os direitos da classe trabalhadora e o futuro da juventude. 

Todos as lutadoras e lutadores que tomaram as ruas do país no ultimo período precisam repudiar a postura do governo Fátima, e lutar para que as centrais sindicais, a UNE, o MST façam o mesmo e intensifiquem junto com as demais organizações políticas e sociais da classe trabalhadora a luta em defesa do direito a aposentadoria e demais direitos sociais e trabalhistas ameaçados.