texto da revista começa dando ares de neutralidade. De buscar o Homem, não a Ideia. “Lenin não era um monstro. Podia rir” (sic). Oi? Senti cheiro de encrenca. Uma caricatura que não faz sentido com o próprio texto. A conclusão é uma ideia antigamente dita em todos os cantos, pelo Oeste e pelo Leste. Camaradas, preparem os abrigos antinucleares! Protejam os livros de História! Estamos na Guerra Fria! Apesar da capa, o
O artigo, escrito por Fábio Marton, é uma apresentação do livro Lênin – Um Retrato Íntimo, a tradução da biografia escrita por Victor Sebestyen. Como Marton reconhece, ela não reflete o título original “Lenin – The Dictator” (Lenin – O Ditador). É evidente que a Editora Globo Livros tentou disfarçar o objetivo político da publicação. Não é um “retrato desinteressado” de um ser humano, trata-se de uma caricatura anti-histórica que pretende provar uma tese.
Estimativas ou especulações? Os números exagerados da Guerra Fria
Por falar em caricatura:
Entre a Guerra Civil com brancos, remanescentes do exército czarista, fome, doenças e o Terror Vermelho – nome oficial para as ações de intimidação –, até 10,5 milhões padeceram. Dos quais, algo entre 100 mil e 1,3 milhão pelo Terror Vermelho (como todas as estatísticas de mortes na história soviética, essas variam insanamente).
Ops, o Terror Branco não saiu impresso! Culpa dos editores, com certeza! Não sou anarquista, mas só o Exército Preto dos anarquistas não fez terror. Eles têm mais moral que os liberais pra criticar.
Aí, socialistas, #ficadika: usem menos “terror” e mais eufemismos: Intervenção Militar, Manutenção da Lei e da Ordem, Massacre do Carandiru… É só mudar o nome que ninguém liga.
Por que as “estatísticas” variam insanamente? É que não são estatísticas nem estimativas, mas especulações criadas na Guerra Fria. Compare: os números das vítimas do nazismo variam muito pouco. Veja esta declaração de Timothy Snyder que é um anticomunista honesto:
Hoje, após duas décadas de acesso aos arquivos do Leste Europeu e graças ao trabalho de estudiosos alemães, russos, israelenses e de outras nações, podemos resolver a questão dos números. O número total de não-combatentes mortos pelos alemães — cerca de 11 milhões — é mais ou menos o que pensávamos. O número total de civis mortos pelos soviéticos, entretanto, é consideravelmente menor do que acreditávamos. Nós agora sabemos que os alemães mataram mais pessoas do que os soviéticos. (1)
A Guerra Fria inventou massacres de centenas de milhares de mortes. Já os historiadores sem imaginação estimam que o Terror Vermelho causou em torno de 100 mil mortes. Não é qualitativamente distinto do Terror Branco (com dezenas de milhares de mortes). Certa ou errada, a anarquista Emma Goldman faz crítica com documentos e relatos, não com uma imaginação fértil.
Falar em Terror Vermelho assusta, mas é sincero. Nossa Constituição, por exemplo, em caso de catástrofes (como uma revolta armada) permite que se declare “Estado de Sítio”. Eufemismo. Muitas guerras dos povos nativos da América e da África ocorriam sem terror. No capitalismo, é impossível. Cidades são completamente destruídas, carestia, doenças, torturas, assassinatos, barbárie.
Para quem tem nervos de aço, recomendo o animé Túmulo dos Vagalumes. Aviso: é horrível. É um relato autobiográfico de um menino numa cidade japonesa na Segunda Guerra. Quem assistir pode responder: aquilo não é terror? Filme ótimo inclusive para certos marxistas que diferenciam entre fome e doenças na catástrofe de 1932-33 na URSS. Numa crise de carestia, há cadáveres nas ruas e, óbvio, nenhuma higiene.
As bombas atômicas em 4 dias mataram mais civis que o Terror Vermelho em 4 anos!
Nem Lenin, nem Vladimir
Deve-se ver quanto há de justo na tendência contra o individualismo e quanto há de errôneo ou perigoso. […] Consciência crítica não pode nascer sem uma ruptura do conformismo católico ou autoritário e, portanto, sem um florescimento da individualidade […]. Luta contra o individualismo é luta contra um determinado individualismo, com um determinado conteúdo social, e precisamente contra o individualismo econômico num período em que ele se tornou anacrônico e anti-histórico.
Antonio Gramsci. (2)
O texto começa criticando duas visões típicas da Guerra Fria: de um lado, uma “espécie de messias ateu” e, de outro, “um maníaco sociopata”. Ambas, apesar de opostas, carregam o mesmo pressuposto: a União Soviética teria sido a materialização das ideias de um único indivíduo. Transforma-se Lenin num messias que veio do céu ou do inferno.
Concordo com o autor que o papel do indivíduo numa sociedade não pode ser reduzido a nada. Ainda mais neste caso! Mas por acaso se resolve essa questão ampliando-o a tudo?
De um jeito ou de outro, quando se amplia Vladimir Ilich Ulyanov a um messias, é impossível enxergar o ser humano. O complexo indivíduo acaba sendo reduzido a uma avaliação moral da União Soviética. Ampliado a tudo, Lenin acaba virando nada.
O erro é tentar superar a Guerra Fria… sem superá-la. Vejamos:
Sebestyen é autor de Lênin – Uma História Íntima. A tese central de seu livro é que o indivíduo Vladmir Ulyanov, ao recriar o marxismo revolucionário, passou a ele suas características pessoais. E que essas características, transmutadas em doutrina, levaram a um regime que matou até 60 milhões de pessoas – numa das estatísticas mais disputadas da historiografia recente (o mínimo são 2,9 milhões, os números oficiais de execuções, mortes nos gulags e migrações forçadas. Na média, os historiadores falam em 20 milhões – cerca de o dobro de Hitler).
Portanto, embora o texto busque a aparência de ser sobre a “História Íntima” superando a “Guerra Fria ideológica” (sic), na verdade é a mesma visão individualista elevada à décima potência. Se já é um erro enxergar Lenin como um messias do céu ou do inferno, imagine torná-lo uma divindade que mata dezenas de milhões depois de morto só porque era “grosseiro”.
Que marxismo é esse?
O concreto é concreto por ser uma síntese de muitas determinações, logo, uma unidade do múltiplo. Eis a razão por que aparece no pensamento como processo de concentração (síntese), como um resultado e não como um ponto de partida, embora ele seja o ponto de partida efetivamente real e, assim, também, o ponto de partida da intuição e da representação.
Karl Marx. (3)
Galera, #ficadika: não dê uma de Sebestyen: se for falar em marxismo, pelo menos leia um livrozinho de introdução, pelo amor de Inanna, senão vocês passam vergonha:
Sebestyen faz questão de notar que é uma enorme ironia da História que o maior marxista de todos seja também uma prova de que Marx estava errado em um ponto central.
Não há como negar que Lenin criticou e modificou conclusões de Marx. O Capital, tal como está, não poderia ser aplicado à Rússia do século XX; porém, suas teses ajudam muito. O autor não explica, por exemplo, que as cidades próximas à capital São Petersburgo era um dos maiores centros industriais da Europa, o que entrava em contradição com o restante do grande Império Russo. Essa crítica que a existência de Lenin falsificou o marxismo é repetida o tempo todo por quem não compreende a lógica dialética entre indivíduo, classe e sociedade.
Faço uma comparação com a revolução da Física no começo do século XX, quando se descobriu que partículas (átomos, prótons, elétrons, quarks) não seguem as leis da Mecânica Clássica. Enquanto esta serve para compreender objetos “grandes”, as partículas seguem outras leis, o que deu origem à Mecânica Quântica.
A crítica que o marxismo sempre fez à visão individualista de mundo é a inversa. Assim como não se pode enxergar os objetos como uma soma direta e ortogonal de seus átomos, a sociedade não se explica como uma simples soma de seus indivíduos. É preciso analisar a sociedade e suas relações sociais para entender o ser humano dentro dela. Caso contrário, o resultado é uma caricatura anacrônica.
De volta à Grande Guerra
Para mim, a guerra era abominável, uma loucura, um crime, e desde o primeiro momento – mais fruto de impulso do que de reflexão – eu, interiormente, rejeitava-a e nunca pude conciliá-la com minhas ideias até este momento atual. A intoxicação por sentimentos patrióticos foi sempre algo estranha a mim; ao contrário, eu sentia uma aversão a tudo que fosse próximo do superpatriotismo. Não encontrei nenhuma compreensão para minha atitude “antipatriótica” entre meus próprios camaradas do partido russo que também viviam na Alemanha. Somente Karl Liebknecht, sua esposa Sofie Liebknecht, e alguns outros camaradas do partido alemão, como eu, possuíam o mesmo ponto de vista e, como eu, consideravam que era dever de um socialista lutar contra a guerra.
Alexandra Kollontai
Apertem os cintos! Nessa máquina do tempo maluca em que o tempo anda para trás, vamos pisar no acelerador! Eis aqui, pouco antes da Primeira Guerra (antes chamada Grande Guerra), o ser humano Vladimir.
Estamos no começo do século XX, uma época muito bizarra em que os Estados colonialistas terminaram de fatiar o que restava do “bolo” chamado Planeta Terra. Lembremos que já foram feitas muitas chacinas por esse motivo. Após o genocídio, o rapto, o tráfico e a escravização dos povos nativos das colônias, ah, chega, não? Não.
Os imperialistas, após repartirem entre si a posse de centenas de milhões de vidas humanas, brigam porque o “bolo” já foi todo distribuído. Os vampiros ainda têm sede! Pelo direito de realizar mais atrocidades humanas, estão prestes a afogar o mundo em sangue! A maioria dos povos da Europa serão levados à barbárie, arrastando consigo suas colônias numa guerra insana jamais vista!
Não quero transformar a agressividade numa virtude nem regra válida para todas as situações. Há contextos e contextos, não é possível generalizar. No entanto, garanto que os imperialistas não parecem “agressivos” nem “rudes”, mas muito educados. Apostam dezenas de milhões de vidas humanas como quem atira fichas num jogo de pôquer sanguinário.
Entre as dirigentes e intelectuais marxistas, as que têm um cérebro e um coração de carne estão furiosas com os imperialistas. Estão dizendo: “Declaramos guerra à Guerra!” Nesta época, isso não é muito popular. Os povos estão embriagados pelas mentiras, sentimentos nacionalistas, discursos de “ordem e progresso”. Quase todos os dirigentes dos partidos social-democratas têm corações de pedra. Não são os agressivos, mas os educados. Eles que diziam “deixa disso, para com isso”.
Pessoas do povo não têm culpa de serem iludidas. Mas dirigentes e intelectuais! Eles querem cargos e vão pagar com nosso sangue!
Polêmicas e mais polêmicas
Que os sentimentais se lamentem e deem os seus gemidos: mais conflitos! Mais diferenças internas! Ainda mais polêmicas! Nós responderemos: jamais se formou uma social-democracia revolucionária sem o contínuo surgimento de novas lutas.
Lenin
Adoro essa citação de Lenin! É pra vida toda!
Coincidência das coincidências: vejam o que estão dizendo as marxistas mais cricris da época: Gramsci, Kollontai, Liebknecht, Rosa Luxemburgo… Georgi Chicherin exagerou na maria-joana e pensa que a Guerra derrubará os césares (o kaiser e o czar). Deem um desconto, menos de 20 anos atrás ele tava procurando a cura gay… (4)
Entre marxistas, há muitas polêmicas. Discutem, mas entendem que não são inimigas umas das outras. Sem dúvida há muitos excessos. Essa grosseria é típica dessa época e muitas marxistas de 2019 não conseguirão superar.
Curiosa a ação dos tempos: hoje, bolcheviques discordam do Lenin em quase tudo. Daqui dez anos vão fazer uma competição assanhada de quem é o mais leninista.
Lenin defende transformar a guerra imperialista em guerra civil. Reclamam de sua fúria, mas nem ele, nem ninguém atinge os ouvidos dos generais. Acabou a munição das armas da crítica. É hora da crítica das armas.
A Revolução Russa
Nós fomos de fumo embriagados
Paz entre nós, guerra aos senhores!
Façamos greve de soldados,
Somos irmãos trabalhadores!
Se a raça vil, cheia de galas
Nos quer à força canibais
Logo verás que as nossas balas
São para os nossos generais!
Trecho do hino A Internacional.
Estação 1917. O povo já percebe que não está ganhando nada com a Grande Guerra.
No dia Internacional da Luta das Mulheres (no calendário russo, é em 23 fevereiro), uma greve de mulheres arrasta zilhões às ruas. O czar ordena educadamente aos soldados que disparem contra a multidão. Pessoas caem, a marcha continua. Imagino elas pensando “Se pararmos de marchar, vamos morrer!” Num ato que irrita qualquer pacifista, na ressaca da embriaguez, vários soldados começam a desobedecer as ordens e viram as armas para os oficiais. Aos poucos, o “violento” “crime” de assassinar quem manda assassinar torna-se banal. Passam três dias e o czar está dando as ordens aos ventos. O outrora grande Imperador não tem mais poder algum. Abdicar ao trono é mera formalidade.
Aproveitando-se da situação, os kadetes (5), numa manobra, criam o Governo Provisório.
Ouvindo os gritos de “Viva o Governo Provisório” há mais de 2000 km de distância, Lenin embarca num trem de volta à Rússia. Em abril, Lenin desembarca em São Petrogrado e é recebido: “Viva Lenin, viva a Revolução”! No alvoroço, Lenin elogia a coragem do proletariado e diz algo que não agrada muito. “O Governo Provisório é controlado pelos imperialistas! O banho de sangue não vai parar!” Sussurros dizem que ele vai mudar de ideia. Não, o povo é que vai.
Martov e Sebestyen podem responder essa pergunta: ele é oportunista ou está certo? Na minha opinião, oportunistas são os que agora fingem ser contra a guerra para ganhar cargos. Oportunistas mentem. Marxistas dizem o que é preciso ser dito.
Grosserias, machismos, simplismos…
Considerar Lenin como um messias das ideias é um erro. Mais grave ainda é pensá-lo como um messias da ética, um modelo de ser humano. Isso é extremamente religioso! Marxistas, usem maria-joana com moderação!
O artigo da revista dá exemplos de atitudes machistas que me parecem um tanto exageradas. Não obstante, concordo com o mérito: em feminismo e sexualidade, seus atos e palavras às vezes são certas, meio certas, erradas, muito erradas, erradíssimas. Melhor exagerar que se deixar iludir.
Agora, preconceito eslavofóbico é muita apelação: (6)
Lenin transformou um conjunto de noções europeias em uma criação muito russa. Sua versão do marxismo – com intolerância, violência e crueldade – foi forjada pela experiência de Lenin na condição de russo do século 19. O bolchevismo de Lenin tinha profundas raízes russas.
Numa revista de História! Isso é uma injustiça tremenda! Não há na Europa povos que derramem mais sangue que esses. As maiores vítimas da ira nazista e da stalinista. Dezenas de milhões marcharão para salvar o mundo do maior monstro que esse mundo já viu. Enquanto isso, dezenas de multinacionais das nações inimigas dos nazistas negociarão com estes até o último dia de guerra. Os agressivos não são os que gritam, são os que assinam os papéis!
Ademais, não foi Lenin que inaugurou a grosseria típica dos intelectuais. Em 2019 ainda haverá muitos piores que ele.
Vladimir é muito racional, sem dúvida se exalta, é grosseiro e isso vai piorar durante a Guerra Civil. Mas será que as ideias dele são condizentes com a caricatura?
Pedir pão, paz e terra é querer demais?
“Ideias são mais letais que armas.”
Lenin.
Três palavras muito simples: “pão, paz e terra”. Sebestyen acha isso muito complicado:
Ele adotou um estilo altamente populista. Oferecia soluções simples para problemas complexos. Mentia descaradamente.
Mais fácil é enviar dezenas de milhões para morrerem na Guerra.
Olha só se não é muita implicância:
Não faltou quem apontasse as heresias de Lenin. “Ele costumava dizer que ‘teoria é um guia, não a Palavra Sagrada’”, afirma o autor. “Mas, é claro, mais tarde, sob Stalin e seus sucessores, isso foi o que o pensamento de Lenin se tornou: Palavra Sagrada.
Poxa, fantasma do Lenin! Não puxou o pé do Stalin durante a noite!
Se ele mente, bem, é uma opinião — nada neutra. Liberais nos acusam de mentir porque não engolimos as leis econômicas inventadas por eles. “Vontade do mercado” não é lei econômica, é uma lista de RGs e CPFs. Não somos nós que apagamos indivíduos.
Do contrário, se as soluções que Lenin oferece não servem, o Governo Provisório pode apresentar outras. Por que não dão o mínimo?
Ah, sim, lógico! Se o fizerem, o povo chegará à perigosíssima conclusão que é ele quem manda. Ops, malz aí.
Quem sabe jogar xadrez?
Com um heroísmo sem precedentes, num fato militar inaudito na história desta guerra, nossos cadetes e nossas unidades do Exército Vermelho tomaram de assalto uma fortaleza naval de primeira linha. Sem darem um tiro sequer, eles progrediram sobre o gelo e pereceram. Eles venceram, esses filhos da Rússia operária e camponesa leais à revolução. O povo trabalhador da Rússia e do mundo não os esquecerá.
Leon Trotsky.
Uma informação muito legal sobre Lenin:
Sua única diversão parecia ser o xadrez, vencendo batalhas com múltiplos oponentes.
Adoro jogar xadrez e adoraria perder para ele. Contra o Marton e Sebestyen, ah, ganho fácil:
Em outubro, o governo se mantinha por um fio. São Petersburgo era puro caos. Era chegada a hora do que foi, basicamente, um golpe militar – e Lenin, discordando da posição do partido, fez questão que fosse golpe, e não uma tomada pelas eleições próximas, ao menos um voto no soviete, a organização dos trabalhadores.
Conhecem a história da Comuna de Paris? Leiam como ela terminou: uma chacina que deixou um trauma no movimento comunista. Os sovietes que surgiram em 1905 desapareceram por quê? Outro massacre. Lenin consegue prever o que vai ocorrer se o Governo Provisório não for derrubado a tempo. No xadrez, um vacilo pode levar à derrota. Entretanto, Lenin irá ao Congresso dos Sovietes para dizer: “Aqui está o poder, não é meu nem do partido, ele é dos sovietes”.
Se os eslavos não vão à Guerra…
Nossa muito sofrida República Soviética passou por tanta coisa durante os últimos dois anos que, no espaço de um breve jornal de revisão, é possível apenas apontar os marcos mais importantes deste período. A história política das relações exteriores da Rússia Soviética nesses dois anos é uma trágica história de luta sem fim, inspirada por inúmeros inimigos que literalmente não deram nenhum descanso ao jovem regime dos trabalhadores e camponeses.
George Chicherin.
Vários povos eslavos estão imitando a “grosseria” russa. Aqui, na estação 1918, uma das ironias da História: os imperialistas se apressam para terminar a Guerra, ou melhor, mudá-la de lugar e de nome. Basta de sangue anglicano, francês e alemão: levemos a Guerra aos eslavos!
(Quem são os agressivos agora? Hein? Hein?)
Começa a Guerra “Civil” russa. O Exército Vermelho, com amplo apoio popular. O Branco, sem muito povo, mas muito financiamento, suprimentos e tropas de várias nações. Quem não tem apoio por baixo, procura por cima. Tem também o Exército Preto, dos anarquistas.
As marxistas estão arrancando os cabelos pela Europa. Conseguimos ouvir os gritos há milhares de quilômetros de distância. Os social-democratas são xingados de oportunistas e fingem que não têm nada a ver com nada.
O artigo de Marton, como os social-democratas, culpa os eslavos pela guerra.
Georgi Chicherin está tendo seu desejo realizado: foi a infame Revolução Russa que chegou até a Alemanha e vai, daqui um ano, derrubar o Kaiser. Os imperialistas estão desesperados!
E a conclusão…
Mas Stalin, segundo Sebestyen, só seguiu um plano deixado pelo criador.
A viagem chegou ao fim. Deixo para vocês medirem se essa conclusão está justa. É possível equiparar o terror em uma guerra com a chacina de quem só está sendo cricri? Causar dor nos ouvidos é tão ruim quanto atirar uma bala na nuca?
Qual foi a ditadura do Lenin? Ser insistente nos debates? Ser convincente? Alcançar consenso em um momento difícil de Guerra “Civil” sem disparar uma bala nos camaradas? Quantos bolcheviques foram expulsos do partido, do país, da vida, durante o período leninista? Quais correntes foram expulsas? Nem sequer uma!
Devemos questionar tudo. Isso é autêntico leninismo. Lenin errou muito, ainda mais durante a guerra. Ainda vou criticar o discurso dele do Congresso de 1921. Mas sejamos coerentes! O Terror Vermelho não chegou aos pés do terror feito em inúmeras guerras do século XX. Ou denominamos todos eles de ditaduras, ou assumimos honestamente: Lenin não foi ditador.
NOTAS
1 – Para os números: SNYDER, T. Bloodlands: Europe Between Hitler and Stalin. New York: Basic Books, 2010, p. 384.
2 – Cadernos do Cárcere, n 9, § 23.
3 – O método da economia política. (https://www.marxists.org/portugues/marx/1857/mes/metodo.htm)
4- Veja o texto “Georgi Chicherin: homossexual, ex-aristocrata e bolchevique”
(https://esquerdaonline.com.br/2016/02/15/georgi-chicherin-homossexual-ex-aristocrata-e-bolchevique/)
5 – Membros do Partido Constitucional Democrata, nome que vem da sigla KD (Konstitutsionno-Demokraticheskaya Partiya).
6 – Eslavofobia é xenofobia contra povos eslavos, a maioria do leste europeu (como poloneses, ucranianos, sérvios e russos).
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