Por 379 votos a favor e 131 contra, a reforma da previdência foi aprovada na Câmara dos Deputados em primeiro turno. Ao final da votação, o presidente da Câmara, o sr. Rodrigo Maia, tomou a palavra e fez um discurso com a pompa de um primeiro-ministro da República Federativa do Brasil.
O líder do PSL na Câmara, Delegado Waldir, em sua fala, dedicou parte importante a homenagear Rodrigo Maia como o principal responsável pela aprovação da reforma. O destaque do líder do PSL, foi bem menor para o próprio presidente Bolsonaro.
Havia uma preocupação sobre a capacidade do governo e sua base aliada no congresso em conduzir com segurança a tramitação da reforma. Tudo indicava que as confusões criadas por Bolsonaro e sua turma eram um elemento que jogava contra esse objetivo. Essa tarefa foi assumida efetivamente pelo presidente da câmara e partidos aliados. Muitas vezes em polêmica pública com o próprio governo.
Com a aprovação da “nova previdência” na Câmara, Maia ganhou autoridade para chamar a atenção da extrema direita (leia-se: puxou a orelha de Bolsonaro) para se responsabilizar e se comprometer com os poderes da República, levantou a moral dos deputados em especial dos partidos que compõem o chamado “centrão”, que em muitos momentos foram atacados pelos apoiadores do presidente Bolsonaro. Quem não lembra do boneco do “botafogo” vestido de presidiário nas manifestações da direita nas ruas?
Em discurso após a votação, Maia expressou a vitória sobre a oposição, os setores progressistas e a esquerda em geral. Aproveitou o momento para anunciar a continuidade da ofensiva, que terá a reforma tributária e administrativa pela frente no qual os trabalhadores do funcionalismo estão na mira. Sem dúvida nenhuma, Maia é um pilar importante para a sustentação dos interesses econômicos do mercado financeiro no Brasil.
Mas, quais foram os elementos que permitiram a aprovação desse duro ataque contra a classe trabalhadora? Como organizar a mobilização para tentar impedir que o Senado finalize o processo de aprovação dessa contrarreforma?
Agora é hora de fazer o balanço de erros e acertos e preparar a resistência no segundo semestre.
A correlação de forças segue desfavorável…
Desde o início do ano, o setor social que vem demonstrando mais capacidade de luta são os trabalhadores da educação e os estudantes. Construíram grandes mobilizações de rua por todo país em defesa da educação, como também incluíram na pauta dessas manifestações a luta contra a reforma da previdência. Infelizmente essa disposição de luta não se generalizou para outros setores da classe trabalhadora, carregar essa tarefa de maneira isolada e num período agora de férias escolares não criou as melhores condições e força suficiente para fazer que o Congresso recuasse na aprovação do que estão chamando de “nova previdência”.
Outro elemento que atua com força na consciência do conjunto dos trabalhadores, é a situação dramática de desemprego. Quem ainda tem emprego acaba tendo mais precaução e prudência, mesmo nos setores mais tradicionalmente participativos e combativos. Ainda que haja o convencimento sobre as consequências do direitos que estão em risco com essa proposta de previdência aprovada, não se traduz em mobilização automática. Isso talvez ajude a explicar o fato da greve geral de 2019, ter tido menor alcance e potência que a greve geral de 2017.
Já em relação aos milhões de trabalhadores desempregados, o desespero pela sobrevivência acaba facilitando o trabalhado da propaganda do governo sobre corações e mentes que deixam se seduzir pela promessa de mais empregos e renda com a aprovação da reforma da previdência.
Há também, uma parte muito significativa do povo que está em compasso de espera, paciente, esperançosa com o “novo” governo… As ilusões em parte importante da população, deram um salto de qualidade. Deixaram de se desenvolver num governo de conciliação do período anterior e passou a se dar diante de um governo de extrema direita. As organizações da direita liberal e conservadora ganharam musculatura, se organizaram, desenvolveram capilaridade, ocupam postos de poder a cada dia e tem ganhado projeção e poder de decisão. Vários de seus líderes são admirados pela massa, em especial na classe média.
Há disputas pesadas entre as distintas frações da burguesia brasileira. Mas em relação a radicalização do ajuste fiscal e o desmonte dos direitos sociais nos parece haver muita convergência programática. Leia-se: Um grande acordo com o supremo com tudo para aprovar a reforma da previdência.
Bilhões, em recursos públicos, financiaram a aprovação da reforma
Bilhões de recursos jorraram para comprar parlamentares e fazer propaganda sistemática sobre a população para convencer a opinião pública que todos devem fazer algum sacrifício para tirar o país da crise econômica.
Todos os dias, em rádios, TVs, revistas e redes sociais a propaganda que a reforma da previdência vai gerar mais empregos martelam na cabeça de milhões de trabalhadores no qual boa parte vive o drama do desemprego. Somados, a propaganda oficial tanto de Temer como de Bolsonaro chega a uma cifra de R$ 200 a R$ 250 milhões de verba pública destinada a publicidade e propaganda especificas sobre a reforma.
Já em relação as emendas parlamentares, foram gastos mais de R$ 1 bilhão no qual, segundo denúncia da bancada do PSOL, R$ 444 milhões foram liberados pelo governo sem autorização legislativa o que configura crime de responsabilidade.
Vejam que o governo Bolsonaro utilizou verba pública para promover um verdadeiro estelionato iludindo a população que a reforma será boa para o país. Ao mesmo tempo que deixaram de fora da reforma as forças armadas e agentes de segurança pública, no qual terão tratamento privilegiado. Se a reforma é mesmo tão boa, porque esses setores se recusaram a sofrer as consequências da reforma da previdência?
Sem falar que o discurso do governo Bolsonaro de que agora acabou a mamata e não terá mais o famoso “toma lá dá cá” decorrente da velha política caiu por terra. O dinheiro gasto com emendas parlamentares é um escândalo que institucionaliza a compra de parlamentares para votarem com o governo.
A importância e os limites da resistência
A resistência dos trabalhadores construiu grandes mobilizações que tinham na sua pauta a luta contra a reforma da previdência. Isso vem desde o governo Temer com a greve geral de abril de 2017 como também com as mobilizações desse ano que colocaram milhares de pessoas nas ruas tendo como vanguarda os estudantes e trabalhadores da educação. A frente única construída entre as centrais e movimentos sociais foi um elemento decisivo para unificar a luta dos trabalhadores contra a ofensiva da extrema direita.
Mas houve erros e limites no processo de resistência, um dos elementos regressivos que mais chamou a atenção foi o comportamento dos governadores da oposição (incluindo aí governadores petistas) que estão no Congresso negociando a inclusão dos estados e municípios na proposta de reforma. E claro que essa movimentação acaba respingando em setores do movimento sindical ligados à CUT e à Força sindical, bem como outras centrais sindicais.
Em relação a bancada dos partidos de oposição, aproximadamente 20 votos migraram para o governo e votaram a favor da PEC da “nova previdência”. O caso mais polêmico foi da deputada Tábata Amaral (PDT-SP), que recentemente se destacou como referência na luta em defesa da educação, mas que em relação a reforma da previdência traiu a expectativa de seu eleitorado e votou de mãos dadas com Maia e Bolsonaro. Uma minoria de deputados do PDT e PSB também votou com o governo, demonstrando a fragilidade e o vacilo desses partidos enquanto representantes da oposição. As únicas bancadas que votaram 100% contra esse gravíssimo ataque ao direito do trabalhador se aposentar foram o PSOL, PT e PCdoB, além do deputado da Rede.
Houve também uma dificuldade por parte das centrais sindicais e movimentos sociais em construir um calendário de lutas que pudesse estar sintonizado com o calendário da Câmara. Durante essa semana, no qual está se desenrolando a votação da PEC da previdência em primeiro e segundo turno, a mobilização na capital do país está bem menor que o esperado e com certeza é um elemento que deixou muitos deputados que estavam em duvida a optarem no ultimo momento a votar com o governo.
A batalha no Senado
Após a votação da PEC, o Congresso vai entrar em recesso. E no segundo semestre essa PEC terá que ser aprovada no Senado, no qual vai precisar de 49 votos, de um total de 81 senadores.
Isso significa que a batalha para defender o direito de se aposentar com dignidade não acabou, vai ser preciso dar continuidade a frente única entre as centrais sindicais e movimentos sociais, fortalecer o trabalho de base e construir um forte calendário de lutas.
Explicar ao povo brasileiro a situação da Argentina é um bom começo, o governo de Mauricio Macri fez uma reforma da previdência em 2017. Dois anos depois esse país é um exemplo de economia arrasada, cresce a pobreza, desemprego e miséria. A inflação corroeu a renda dos trabalhadores e muito provavelmente Macri terá dificuldades para se reeleger em outubro desse ano, se é que ele vai se candidatar, pois sua popularidade está em baixa.
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