Um dos argumentos da direita para defender Bolsonaro é fato dele não ser, ainda, um ditador. “Cadê a censura? Cadê as pessoas nos porões sendo torturadas?”, perguntam eles. De fato, Bolsonaro não fechou o Congresso, não expulsou ninguém do país e ainda não censurou nenhum site de oposição. Mas isso não quer dizer que seu pessoal não esteja agindo no submundo.
Um exemplo são as recentes ameaças à família do jornalista Glenn Greeenwald, que expôs vazamentos de gravações do atual ministro da Justiça, Sérgio Moro. O estilo dos criminosos é o mesmo das ameaças contra o ex-deputado Jean Wyllys, que teve que deixar o Brasil para não ser assassinado.
Jean é um desafeto pessoal de Jair Bolsonaro. Glenn e seu marido, o deputado David Miranda, também se tornaram inimigos do presidente. As ameaças são complementadas com declarações ofensivas. Um bolsonarista influente nas redes sociais afirmou que “a única coisa positiva na matéria [de Glenn] é o HIV”, fazendo referência à lenda de que todos os homossexuais têm o vírus que causa a AIDS. Esse é só um exemplo dos vários comentários homofóbicos contra Glenn.
Além disso, nos últimos dias, um perfil anônimo chamado “pavão misterioso” prometeu acabar com a reputação de Glenn Greeenwald. O tal “pavão” mostrou uma série de falsificações tão grosseiras que o próprio Glenn fez graça delas em seu Twitter.
Apesar de toda essa virulência dos militantes bolsonaristas, o próprio presidente parece agir de modo diferente. A gente percebe essa diferença no tratamento com os deputados e senadores. Enquanto Bolsonaro se mostra aberto ao diálogo, sua militância na internet ataca os parlamentares.
Seria isso uma diferença entre Bolsonaro e os influenciadores digitais que o apoia? Na verdade, mais parece uma divisão de tarefas. O presidente se mostra moderado em suas declarações oficiais enquanto as milícias virtuais fazem o jogo sujo.
No autoritarismo do século XXI, não é necessário decretar a censura ou mandar as pessoas para os porões. Basta deixar os criminosos de internet trabalhar livremente. O perigo hoje não é um grupo de militares armados entrar dentro de sua casa e te prender. O perigo é um maluco qualquer, incitado pelas redes socias, brigar com você em um bar. Ou uma Fake News associar você a um crime e causar seu linchamento.
Carta para nazista, disparos em massa e lentidão da Justiça
Um fato estranho pode mostrar que a relação entre o atual presidente e os criminosos da internet pode não ser indireta. Em 2013, o então deputado Jair Bolsonaro trocou correspondências com um nazista declarado de Minas Gerais. A carta do atual Presidente da República ao militante está sob poder do Ministério Público, que até hoje não revelou seu conteúdo.
Esse não é primeiro caso em que a Justiça se mostra lenta para investigar as milícias virtuais. A investigação sobre os supostos disparos em massa ilegais na campanha de Bolsonaro ainda não foram para frente.
Pelo visto, a chance de algum dos criminosos que ameaçam e caluniam na internet serem investigados é zero. A Polícia Federal comandada pelo ministro Sérgio Moro vai investigar os criminosos que agem a favor do governo? Bom, já está provado que o ministro não é nada imparcial.
Milícias virtuais
As ameaças de morte, as ofensas homofóbicas e as calúnias contra o jornalista que desagradou o governo são parte de uma articulação com um comando central? Não há provas. No mínimo, são pessoas inspiradas no preconceito, na violência e no ódio que Jair Bolsonaro sempre fez questão de incitar em seus discursos. Afinal, ele já disse abertamente que quer “fuzilar a petralhada”.
Atitudes como essa logicamente excitam o submundo da internet, infestado de homens desajustados que querem achar um alvo para extravasar suas frustrações. E eles são perigosos. As ameaças a Jean Wyllys, por exemplo, continham detalhes de seu cotidiano e placas de carros de seus familiares. O recente massacre em Suzano mostrou que de vez em quando o pessoal dos fórum do Dogolachan saem da internet e cometem crimes na vida real.
Se esses grupos têm um comando ou são apenas estimuladas pelos discursos de Bolsonaro e seus filhos não sabemos. Mas sabemos que o número de vítimas aumenta. Além de Jean Wyllys, a militante feminista evangélica Camila Mantovani e a escritora Márcia Tiburi já tiveram que sair do país para em função de ameaças de morte. Quem será a próxima ou próximo?
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