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BRASIL

Privatizar a Petrobras só vai aumentar o preço do combustível

Uma Petrobrás para os trabalhadores é a saída para reduzir o preço do combustível

Tiago Amaro*, do Rio de Janeiro, RJ
EBC

Vemos todos os dias uma campanha sobre os preços altos dos combustíveis e GLP, como se a culpa fosse da Petrobrás, que se fosse privatizada permitiria uma maior eficiência, o que levaria à redução dos preços. Será que é verdade?

Você sabia que, em outubro de 2016, a Petrobrás anunciou uma nova política de preços para a revenda de diesel e gasolina? Essa nova política, que acabou servindo para outros produtos de petróleo, como o gás de cozinha, visava principalmente adequar os preços ao mercado internacional, o que também levou a uma série de ajustes sucessivos, que vemos hoje nas matérias de jornal. Mas se produzimos boa parte do petróleo que refinamos (e, portanto, temos um custo relativamente autônomo do mercado internacional), qual o sentido de colocarmos o mesmo preço de quem vende um petróleo lá de outro país?

Essa política de preços foi feita exatamente para que, com os preços controlados pelo mercado internacional, as nossas refinarias ficassem mais atrativas para os investidores privados, que assim teriam uma “garantia” de que poderiam manter suas margens, sem que a Petrobrás pudesse usar sua cadeia integrada (produz o petróleo, transporta e faz gasolina) para produzir preços que impediriam os que não têm essa vantagem. Ou seja, é um “petisco” do que seria o mundo com a Petrobrás privatizada.

E você acha que melhorou? Vamos ver os gráficos da evolução do preço do gás de cozinha:

Evolução do preço do gás de cozinha (em R$ por 13Kg) – preço para o consumidor

Fonte: ANP
Fonte: ANP, Levantamento de Preços e de Margens de Comercialização de Combustíveis

Veja que há um aumento em 2015 (mostrado em janeiro de 2016), quando houve um reajuste ainda antes da política de preços, mas que é pontual (depois continua constante). Após 2016 e principalmente após 2017, quando os reajustes se tornam mais frequentes, o preço aumenta sensivelmente.

E agora a evolução da gasolina e do diesel:

Evolução do preço da gasolina e diesel (em R$ por litro) – preço para o consumidor

Fonte: ANP, Levantamento de Preços e de Margens de Comercialização de Combustíveis

Novamente, é possível ver o aumento a partir de 2017, mesmo com a redução devido à greve dos caminhoneiros em 2018. E se já é assim hoje em dia, como vai ser quando as refinarias do país todas estiverem não só praticando esses “preços internacionais” como forem, de fato, multinacionais, aumentando ainda mais a margem de lucro? E quando for tudo privatizado, e cada empresa na cadeia for querer seu lucro, a que produz, a que transporta, a que vende no posto…

Refinaria privada é sinal de preços ainda maiores e com menos controle – e vale lembrar que combustível e outros produtos de petróleo são uma reserva estratégica para o país. A política de preços criou ociosidade nas refinarias da empresa, obrigadas a praticar os preços internacionais apesar de ter as vantagens de produzir aqui, e abriu assim o mercado internacional. Veja abaixo a comparação entre importação de derivados e a ocupação das refinarias brasileiras:

Importação de derivados (em m³) e fator de utilização do refino

Fonte: ANP, Anuário estatístico 2018

Ou seja, desde a implementação da política de preços (2016) estamos importando mais derivados (produtos de petróleo) e produzindo menos nas refinarias brasileiras (que são quase que totalmente da Petrobrás).

Essa política teve como consequência um aumento terrível nos preços. Uma Petrobrás desintegrada e privatizada só vai piorar ainda mais a situação da população!

Um assalto à soberania nacional

Há um segundo aspecto sobre a privatização da empresa que muitos podem esquecer. Uma empresa brasileira, principalmente sendo estatal, tem seu lucro investido aqui (mesmo que o capital financeiro possa muitas vezes ser um escape deste). Quando uma empresa de outro país compra uma empresa daqui, isso gera uma remessa de lucros para sua matriz que tem dois impactos negativos: o primeiro no déficit comercial do Brasil, e o segundo é que o dinheiro que é produzido com o nosso trabalho vai para fora do país, ser gasto nas matrizes das multinacionais, geralmente países desenvolvidos, que desenvolvem o comércio de lá e pagam seus impostos aos governos de lá que com esse dinheiro do que é produzido por nós constroem hospitais e escolas públicas, entre outras coisas, nesses países desenvolvidos.

Segundo dados do DIEESE de 2018, de 2001 a 2017 as indústrias químicas estrangeiras instaladas no Brasil remeteram para suas matrizes mais de US$ 186 bilhões de lucros e dividendos. Com o avanço da privatização, esse número vai ser cada vez maior!

Remessas de lucros e dividendos na Indústria Química Brasileira (US$ Bilhões)

Fonte: DIEESE / Banco Central do Brasil / Abiquim

Entregar nosso conhecimento é entregar nosso país

Imagina que você está em uma gincana de resolução de problemas matemáticos. Seu time é o grande azarão, mas ali quietinho começa a responder o problema mais rápido do que os favoritos e famosos concorrentes. Conforme a gincana avança e seu time começa a ganhar posições, o técnico tira o computador de todos os membros do seu time e entrega papel e caneta para fazer os cálculos, ao mesmo tempo em que entrega os computadores com todos os cálculos já realizados para os times rivais.

Uma coisa dessas não faz sentido, certo? Que tipo de técnico entregaria os segredos e diferenciais de um time vencedor para os concorrentes? Pois é isso que estamos fazendo com a Petrobrás e com o Brasil como um todo.

Você sabia que antes da Petrobrás outras empresas, inclusive grandes empresas como a Shell, tentaram explorar o pré-sal? Pois é, elas desistiram porque não conseguiram, a tecnologia foi desenvolvida por nós. O CENPES também ajudou a desenvolver novos combustíveis e outros diversos trabalhos que nos colocaram como uma empresa que ocupa uma posição de destaque na tecnologia do setor de energia.

E agora o governo quer sucatear o CENPES – tirar nosso computador e nos dar papel e caneta para fazer os cálculos, no cenário do primeiro parágrafo. Não só isso, como quer transferir nossa tecnologia para outras empresas – que seria, na nossa gincana, como dar nosso computador para os concorrentes. É a mesma lógica do sucateamento das universidades, centros de conhecimento importantes para qualquer país que queira se desenvolver. E o prêmio da gincana, um país mais justo e melhor, vai ficando cada vez mais longe.

A Petrobrás está sendo sabotada

Há um desejo de que as coisas mudem, e uma compreensão de que a privatização da Petrobrás seria ao menos uma chance de tentar algo diferente. Mas a verdade é que a empresa está sendo sabotada de dentro para fora. Por exemplo, você sabia que a Petrobrás em 2016 e 2017 transformou lucros operacionais de, respectivamente, 17 bilhões e 35 bilhões de reais em prejuízos? Parte disso eram manobras contábeis que não impactavam a operação da empresa, mas construiu o mito da Petrobrás quebrada.

Ou seja, se queremos combustível mais barato, tem mesmo que mudar. Mas não é privatizando, que só vai piorar o preço. Vem com a gente pela redução do preço dos combustíveis e do gás de cozinha, por uma Petrobrás integrada e 100% estatal e pela soberania do nosso país!

 

*Tiago Amaro é diretor do Sindipetro-RJ

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