Os próximos dias serão marcados pela primeira visita de Jair Bolsonaro aos Estados Unidos da América. A comitiva viaja no dia 17 (domingo), e no dia 19 (terça-feira) ocorrerá o esperado encontro entre Trump e Bolsonaro. Para os brasileiros, muito interessa o resultado desse encontro, pois pode significar mais um passo rumo à subordinação total da política externa e da economia do país aos interesses dos empresários e banqueiros estadunidenses.
Petrobrás e empregos no país têm muito a perder com parceria Trump-Bolsonaro
A Petrobrás tem sido vítima de uma verdadeira auto-sabotagem em relação à sua participação no mercado de combustíveis no Brasil, ao menos desde o início da gestão Pedro Parente, em 2016, logo no início do governo Temer. Através de uma política de preços alinhada ao mercado internacional que fez explodir o preço do diesel, gasolina e gás de cozinha no país, o que resultou nas greves dos caminheiros e petroleiros em 2018, também permitiu que a partir de 2017 o país batesse recorde na importação de derivados de petróleo e a Petrobrás perdesse substancial participação de mercado.
Não por coincidência, em 2017 os produtores estadunidenses eram responsáveis por vender ao Brasil 80% do que o país importou de diesel e 60% do que importou de gasolina.
Essa trajetória é coerente com os objetivos anunciados por Roberto Castello Branco, presidente da Petrobrás indicado por Bolsonaro, que pretende entregar mais de 50% da atual capacidade de refino da Petrobrás para as mãos da iniciativa privada, onde certamente as grandes multinacionais petrolíferas dos Estados Unidos terão interesse em abocanhar mais espaço naquele que é o sétimo maior mercado de derivados de petróleo no mundo.
Nesse mesmo período, a Petrobrás bateu recorde na exportação de óleo cru, um produto primário, ao mesmo tempo em que as refinarias da Petrobrás, que transformam o petróleo em produto acabado para o uso como combustível, retrocederam a sua produção aos níveis de 2010, quando havia uma refinaria a menos no sistema, mantendo ociosos em torno de 28% de sua capacidade, no primeiro semestre de 2018.
No entanto, se é verdade que a Petrobrás aumentou a exportação de petróleo, está nítido que a atual gestão da empresa apoia a entrega de campos do pré-sal através de leilões e da cessão do seu direito de produzir as reservas contidas na cessão onerosa a suas concorrentes. Essas políticas enfraquecem a empresa no cenário da indústria do petróleo, porque fortalece a concorrência, além de submeter uma riqueza nacional aos interesses de acionistas das multinacionais estrangeiras sem qualquer preocupação com a geração de emprego no Brasil, ou com a preservação do nosso meio-ambiente, assim como das nossas reservas energéticas.
O impacto das medidas no emprego são gritantes: a Petrobrás que já chegou a contar, em 2013, com mais de 380 mil funcionários diretos e indiretos, hoje conta com aproximadamente 100 mil. Além dos programas de demissões voluntárias para os empregados diretos, a paralisação de obras e projetos a partir da Lava Jato exterminou mais de duzentos mil postos de trabalho entre os empregados indiretos.
Por isso, algumas bases petroleiras no país devem realizar atos e atividades no dia 19/03, mesmo dia do encontro entre Bolsonaro e Trump, denunciando a ameaça que significa essa parceria para o futuro da Petrobrás e de toda a população brasileira, em especial os mais pobres.
Indústria bélica quer lucrar com possíveis acordos
O primeiro projeto de lei do senador pelo Rio de Janeiro Flávio Bolsonaro pretende permitir a instalação de fábricas de armas privadas, inclusive multinacionais, alterando legislação promulgada em 1934, por Getúlio Vargas.
Sendo assim, não é coincidência que a principal marca da campanha a presidente de Bolsonaro tenha sido a famosa arminha com a mão, utilizando inclusive crianças nesse ritual de exaltação da violência, e que uma de suas primeiras medidas como presidente tenha sido a flexibilização das regras para posse de armas.
Tampouco é coincidência a promessa de campanha de Bolsonaro que prometia a mudança da embaixada brasileira em Israel para Jerusalém, em nítida afronta à luta do povo palestino em defesa dos seus direitos como nação, mas sinalizando a Israel, um Estado policial que sobrevive de exportar tecnologia militar e armas sob a proteção dos Estados Unidos, que este teria mais um aliado também do ponto de vista comercial.
Aliança fortalece crescimento da extrema-direita no mundo
Desde a campanha eleitoral, ficou nítido o alinhamento ideológico e na política externa da família Bolsonaro com o atual governo estadunidense. Steve Bannon, que é um dos principais aliados de Trump, e responsável pela estratégia da campanha do republicano baseada em fake news e forte uso das redes sociais, prestou assessoria e realizou um encontro com Eduardo Bolsonaro ainda no ano passado.
Do ponto de vista ideológico, os principais laços entre Trump e a família Bolsonaro são o empenho na construção de uma internacional de extrema-direita, fortemente baseada em ideias racistas, contra as mulheres, LGBTs e imigrantes, que recicla o anti-comunismo para o século XXI, elegendo Cuba e Venezuela como alvos a serem combatidos.
Já na política externa, Ernesto Araújo foi escolhido por ser discípulo de Olavo de Carvalho, um filósofo brasileiro que mora há anos nos Estados Unidos da América e é admirador confesso de Trump e de seu grupo político. Em suas primeiras declarações como ministro disse que Trump teria como missão salvar o Ocidente do “globalismo”, que supostamente seria uma corrente de pensamento hegemônica no mundo, e que resultaria na destruição dos valores cristãos e da família tradicional, além de favorecer o expansionismo econômico e geopolítico da China.
Na prática, no entanto, esse discurso serviu de base para que o Brasil estivesse entre os mais de 50 países que reconheceram Juan Guaidó como presidente auto-proclamado da Venezuela, mesmo que este nunca tenha participado de eleições para o cargo, ao passo que Maduro foi eleito em meados de 2018.
Além de apoiar o aumento do isolamento político e econômico que tem destruído a já frágil economia da Venezuela e levado o seu povo a uma situação de miséria, o governo Bolsonaro também patrocinou a aventura da entrega dos dois caminhões das supostas ajudas humanitárias, que resultou em mortes de venezuelanos e nada mais, numa vergonhosa posição de bucha de canhão da política externa de Trump.
Ainda no campo militar, o acordo para que a Base de Alcântara, no Maranhão, seja utilizada pelas Forças Armadas dos Estados Unidos para lançamento de foguetes significa, na prática, que o país militarmente mais poderoso do mundo, e conhecido por desrespeitar a soberania dos países por onde passa, terão livre acesso a uma instalação militar brasileira.
Soma-se a isso a possibilidade de que Bolsonaro sele acordos comerciais desvantajosos para o Brasil, em detrimento de acordos com a China, tudo em nome de aparecer para Trump como um cão de guarda fiel, como no caso da liberação de vistos para cidadãos estadunidenses entrarem no Brasil sem exigir qualquer contrapartida, enquanto muitos brasileiros são deportados ou vivem de forma ilegal há anos nos Estados Unidos.
Trump e Bolsonaro representam um fenômeno mundial, que é o fortalecimento de alternativas políticas de extrema-direita e neofascistas, que tem como característica o rechaço aos mecanismos tradicionais da relação entre os Estados nacionais, como acordos comerciais, militares e até mesmo acordos sobre o meio ambiente.
Na América Latina, houve uma verdadeira onda que, seja através de eleições ou através de golpes, substituiu governos ligados a organizações de esquerda e frutos de processos de ascenso popular, por governos populista de direita, neoliberais, alguns com elementos neofascistas, como Bolsonaro. Na Europa, esse fenômeno também pode ser notado de forma mais emblemática na Hungria, Polônia, Ucrânia, mas também em países centrais, como a França. Na Ásia, podemos citar o exemplo mais brutal nas Filipinas, com Rodrigo Duterte, mas podemos ver na Índia que a onda conservadora atingiu um dos países mais populosos do mundo.
Essa aproximação ocorre no mesmo momento no qual a corrida pela reforma da Previdência já foi iniciada pelo governo e, caso aprovada, significará mais recursos públicos transferidos para o pagamento dos juros da dívida pública, que só aumenta, e que tem como credores fundos e especuladores dos Estados Unidos.
Enfrentar as reformas econômicas e defender a vida das mulheres e dos jovens negros
Os brasileiros já sentem na pele os efeitos dos primeiros meses do governo Bolsonaro, através do aumento da violência contra as mulheres e a escalada de violência policial que extermina jovens negros das periferias das grandes cidades. Além disso, está cada dia mais escancarada as relações entre a família Bolsonaro e as milícias, estando alguns desses milicianos diretamente ligados ao assassinato de Marielle Franco.
Por isso, é fundamental que os objetivos da visita de Bolsonaro a Trump sejam denunciados, como parte de uma campanha em defesa dos nossos direitos, da vida dos setores mais explorados no nosso país, contra as privatizações e em defesa da soberania do Brasil, assim como a soberania do povo venezuelano.
No dia 22/03, está marcado um dia nacional de mobilizações, que deve unir as centrais sindicais e diversos sindicatos, além da Frente do Povo Sem Medo e Frente Brasil Popular, cujo foco é enfrentar a Reforma da Previdência, como primeiro passo para derrotar o governo Bolsonaro e os seus objetivos contra a maioria da população e contra os interesses soberanos do Brasil.
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