Paraná, agosto de 2018. Tatiane Sptizner é agredida por seu marido na garagem do apartamento e jogada do 4º andar de seu prédio. São Paulo, janeiro de 2019. Simone Fernandes é assassinada a tiros dentro de casa e seu marido é o principal suspeito. Rio de Janeiro, fevereiro de 2019. Elaine Caparroz é espancada por 4 horas durante primeiro encontro. Os casos recentes de feminicídio chocam pelo grau de violência e expressam a realidade das mulheres no país que ocupa o 5º lugar no ranking da violência contra a mulher.
Em média, 13 mulheres são assassinadas por dia no Brasil e, só no início de janeiro deste ano, 107 casos foram registrados, entre tentativas e assassinatos consumados. Os números crescem na mesma proporção em que a cultura de violência e o menosprezo pela diversidade são referendados pelos discursos de ódio do então presidente, Jair Bolsonaro. Escancaram, ao mesmo tempo, o machismo presente em nossa sociedade e o descaso do estado em relação às políticas públicas de prevenção.
RAIO X DO FEMINICÍDIO EM SÃO PAULO
No Estado de São Paulo, a realidade não é diferente. Em 2018, 148 assassinatos foram registrados. Em média, uma mulher é vítima de feminicídio a cada 36 horas. O número cresceu 12,9% em relação ao ano anterior e representa 27% do total de assassinatos de mulheres, segundo os dados da Secretaria de Segurança Pública (SSP) de São Paulo.
A situação fica ainda mais assustadora a partir da constatação de que a maior parte dos crimes acontece em ambientes domésticos. De acordo com a pesquisa realizada pelo Núcleo de Gênero do Ministério Público-SP, entre 2016 e 2017, 66% das 364 denúncias ocorreram na residência da vítima, sendo as armas de fogo responsáveis por 17% das mortes. Nesse sentido, a política de flexibilização da posse de armas do governo Bolsonaro é ainda mais letal às mulheres.
É preciso reconhecer que o feminicídio no Brasil combina questões de gênero e raça. A taxa de homicídios de mulheres negras aumentou 15,4%, enquanto que entre as não negras houve queda de 8%, segundo o Atlas da Violência. À despeito dessa realidade, os instrumentos de proteção da vida das mulheres não estão a serviço das mulheres negras e pobres.
POLÍTICAS PÚBLICAS DE PREVENÇÃO
Se por um lado, os esforços legislativos nesse âmbito – a exemplo da Lei Maria da Penha, promulgada em 2006, e a recente tipificação do feminicídio, em 2015 – representam avanços nos parâmetros de proteção, por outro, os altos índices de mulheres agredidas e mortas escancara que as apostas feitas no sistema de justiça – enquanto protagonista da política de proteção – são insuficientes.
Os erros na hora da tipificação e nos registros de BO’s, assim como, debilidades nas infraestruturas e no acolhimento integral das mulheres nas próprias delegacias especializadas escondem um número possivelmente maior. O veto do governador João Dória ao projeto de lei que obrigava todas as 133 Delegacias de Defesa da Mulher funcionarem 24 horas por dia vai, então, na contramão das necessidades de milhares de mulheres.
A construção de uma rede de enfrentamento à violência está longe de ser realidade nas cidades brasileiras. E para que, de fato, se constitua, é necessário oferecer às mulheres apoio e estratégias reais de rompimento do ciclo de violência, capazes de articular políticas de moradia, transporte, trabalho e assistência, aliadas ao pleno acesso à justiça, seja para as mulheres concretizarem o desejo de denúncia da agressão sofrida, ou mesmo para garantir sua assistência em possíveis ações que discutam divórcio ou pensão alimentícia, por exemplo.
Diante desse cenário, é preciso tratar a violência contra a mulher de forma não apartada da desigualdade social e das múltiplas opressões que as mulheres enfrentam todos os dias. É a luta anticapitalista, da qual não escapa a luta contra a retirada dos direitos da classe trabalhadora e do aprofundamento da miséria, que será capaz de também provocar uma ofensiva contra toda forma de opressão, especialmente contra o machismo que nos mata todos os dias.
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