Chegamos em Caracas no sábado, dia 23 de fevereiro, dia anunciado para a entrada da chamada ajuda humanitária dos EUA, pelas fronteiras de Brasil e Colômbia. Em Cúcuta, na Colômbia, também aconteceu um show de apoio a essa iniciativa. Havia muita apreensão nossa ao chegar em Caracas, com a ameaça de um confronto nas fronteiras e que isso pudesse ter reflexos na capital.
O aeroporto internacional Maiquetía – Simon Bolívar estava pouco movimentado, por causa dessa situação e também pela suspensão de vários voos à Venezuela, por conta do boicote. Nos 26 km de trajeto até o centro de Caracas, tivemos que fazer apenas um desvio, pois uma via estava interditada. Depois soubemos que era por conta da manifestação que ocorreu em apoio ao governo Maduro. Há uma unanimidade em dizer que foi a maior manifestação dos últimos anos, os mais otimistas falam em 1 milhão de pessoas. De qualquer ocorreu uma demonstração de força de Maduro, que impediu a entrada pelas fronteiras dos amigos de Trump e fez esse ato em Caracas.
Nosso domingo (24/02) foi especial pois pudemos ouvir na parte da manhã a prefeita de Caracas, Érica Farias, e a tarde a vice-presidenta da Venezuela, Dayse Rodrigues, na abertura da Assembleia Internacional dos Povos. Ambas reafirmaram o compromisso das Forças Armadas com o governo, que as deserções são individuais e muito residuais e que o povo venezuelano irá resistir. Mas como todo domingo, a cidade estava pacata.
Nessa segunda feira (25/02) fomos às ruas de Caracas e encontramos uma cidade em movimento, como todas as grandes cidades pelo mundo afora. A Venezuela tem cerca de 30 milhões de habitantes e a Grande Caracas cerca de 5 milhões. Os comércios estão abertos, nas bancas de jornal haviam jornais que defendiam Maduro e outros que defendiam Guaidó, o metrô é gratuito e funciona e os postos de gasolina, com algum rodízio garante o abastecimento dos automóveis. Um tanque de um carro de passeio pode ser abastecido por cerca de R$ 1 real e estes baixos preços se estendem à água e a luz.
Mas a situação da população está muito difícil. Há alimentos. Os preços, porém, são impagáveis para a maioria da população, fazendo que dependam da cesta básica distribuída pelo estado. A inflação aqui é galopante e a moeda nacional, o bolívar, muito desvalorizada. Há muita gente na rua vendendo todo tipo de coisa e a situação está se agravando com o boicote, que já bloqueou mais de R$ 30 bilhões de dólares da Venezuela, o que impede a compra de alimentos de outros países. As escolas seguem funcionando, mas com dificuldades, pois a alimentação dos alunos está precária pela crise.
De um modo geral a população tem se alimentado com menos calorias que o necessário, sendo comum o relato de que a maioria tem perdido peso nestes anos, porém a maior dificuldade é o acesso aos remédios. A dificuldade de comprar remédios, por conta do boicote, para diabetes e pressão alta por exemplo, é um assassinato silencioso de parte da população e esse crime é de responsabilidade dos EUA e seus apoiadores, como o Brasil.
Apesar de tudo isso, a população trabalha e a cidade funciona, mas caso sigam o bloqueio e as sanções econômicas, pode ocorrer uma crise humanitária de grandes proporções.
A Venezuela, por um acidente geográfico, tem a maior reserva de petróleo do mundo, e possivelmente a segunda maior reserva de ouro e esses são os verdadeiros motivos da agressão imperialista. Não há interesse humanitário, mas sim no petróleo que segue sendo a principal matriz energética do mundo capitalista moderno.
Encontramos um povo sofrido, passando por uma situação de carestia, mas muito corajoso, que sabe quais são os interesses dos EUA e defendem a manutenção de Maduro, mesmo tendo muitas críticas ao seu governo. É com esse povo que estamos solidários e na luta contra o imperialismo.
*João Zafalão, DIRETOR da APEOESP e do PSOL-SP, direto de Caracas
Foto: João Zafalão
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