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Dez motivos para dizer não à reforma da Previdência de Bolsonaro

Editorial de 22 de fevereiro de 2019
Marcos Corrêa/PR


1 – Reforma acaba com a solidariedade: agora é cada um por si
2 – Na Previdência Complementar, a nossa aposentadoria vira um negócio
3 – Aumento da idade mínima e do tempo de contribuição: Vamos trabalhar até morrer

4 – Governo não ataca os privilégios
5 – Reforma atacará os mais pobres
6 – Reforma da Previdência acentuará desigualdades e opressões
7 – Brasil terá legião de idosos pobres nas ruas
8 – Uma reforma machista
9 – Professor@s na mira da reforma
10 – Porteira aberta: PEC transfere poderes a uma lei complementar


1 – Reforma acaba com a solidariedade: agora é cada um por si

A ideia de uma Previdência Social pública nasceu da própria classe trabalhadora, movida pelo sentimento de solidariedade. Na Europa do século XIX, os operários, sem nenhuma proteção, criaram “caixinhas” coletivas, para momentos de desemprego, acidentes, doenças, viuvez, etc.
O regime de repartição da Previdência guarda semelhanças. Prevalece o sentido de solidariedade. Cada um contribui mensalmente, como um fundo coletivo, para garantir dignidade na sua própria aposentadoria e para que ninguém seja esquecido. A geração atual contribui para a aposentadoria da anterior, em sequência.
A reforma quer substituir pelo regime de capitalização, onde cada um contribui apenas para a sua própria aposentadoria, em poupanças individuais. O valor a receber dependeria então do que cada um conseguir economizar enquanto estiver trabalhando.
Esta lógica não considera que a maioria das pessoas trabalha apenas para a sobrevivência, sem nenhuma condição de acumular o suficiente para o futuro. E isto não é uma decisão individual, “preguiça” de um ou de outro, mas é parte da natureza deste sistema econômico, que sempre vai precisar manter milhões sem emprego ou na informalidade, enquanto os que trabalham são cada vez mais vítimas de acidentes e adoecimentos.
O regime de capitalização vira as costas para os milhões de excluídos, a grande maioria vítima do racismo estrutural. Em vez de “ninguém solta a mão de ninguém”, Bolsonaro lança o País do “cada um por si”, aprofundando as desigualdades, acabando com políticas de proteção social, como a Previdência e o SUS, e culpando idosos e miseráveis pela crise econômica capitalista.
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2 – Na Previdência Complementar, a nossa aposentadoria vira um negócio

Pode-se imaginar que o regime de capitalização não é ruim, seria uma chance de conseguir uma aposentadoria melhor no futuro. Mas não é assim, porque a Previdência Privada é, antes de tudo, um negócio. O dinheiro que será confiscado mensalmente vai alimentar o mercado de capitais e, nesse cassino, você pode perder ou ganhar.
No Chile, que criou esse modelo durante a ditadura, e serviu de inspiração para Paulo Guedes, o plano era que, em 2020, os aposentados estariam recebendo 100% do que recebiam na ativa. Mas hoje, os homens recebem somente 33% do que ganhavam e as mulheres, 25%. O dinheiro das contribuições virou poeira.
O grande volume de dinheiro reunido por esse sistema despertou a cobiça dos capitalistas, especialmente, em tempos de crise. Nas últimas décadas, os grupos que controlam a Previdência Complementar e fundos de pensão atuaram para enfraquecer a Previdência Pública, com sucessivas contrarreformas. Puderam, assim, expandir seus negócios, tendo acumulado o equivalente a 12,9% do PIB. Um grande negócio, que deve crescer, caso aprovem o regime de capitalização.
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3 – Aumento da idade mínima e do tempo de contribuição: Vamos trabalhar até morrer

A reforma altera as regras para se aposentar, aumentando a idade mínima. A lógica é forçar a que a pessoa não goze da aposentadoria por muito tempo. Que o direito chegue, se chegar, cada vez mais próximo da hora da morte.
A fórmula proposta combina a idade mínima (65 anos, homens, e 62 anos, mulheres) com a exigência de 20 anos de contribuição (Regime geral) e 25 anos de contribuição (Regime Próprio da União). Atualmente, pode-se aposentar apenas por idade, a partir de 10 anos de contribuição.
A medida por si só fará com que milhões de pessoas tenham que trabalhar mais tempo. Muitas simplesmente não conseguirão se aposentar, por não cumprir os 25 anos de contribuição. É o caso dos 43% da população economicamente ativa, que hoje estão na informalidade, trabalhando com Uber ou por conta própria. Na velhice, sem tempo de contribuição para conseguir se aposentar, e sem se encaixarem no critério de miserabilidade, estarão em um limbo, abandonados à própria sorte.
Outro golpe é o valor a ser pago. Para receber o benefício integral, limitado pelo teto, o trabalhador da iniciativa privada terá que contribuir por 40 anos. Caso se aposente apenas com 20 anos, receberá apenas 60% do valor do benefício.
De contrabando, o projeto da reforma da Previdência ameaça até mesmo mexer em temas trabalhistas. As empresas não serão mais obrigadas a pagar a multa de 40% do FGTS em caso de demissão, se o trabalhador já estiver aposentado. Ou seja, muitos adiarão a aposentadoria, deixando de usufruir do seu direito. A PEC também exige que os aposentados sigam contribuindo para o INSS.
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4 – Governo não ataca os privilégios

O governo Bolsonaro já iniciou uma campanha publicitária, apresentando a reforma como o fim das desigualdades. Mas a verdade é que apenas 13% dos aposentados do INSS recebe mais que dois salários mínimos. Os verdadeiros privilegiados não precisam se preocupar com a aposentadoria.
Enquanto culpa servidores públicos e idosos, Bolsonaro adiou o envio do projeto sobre a reforma na Previdência dos militares, cujas aposentadorias são em média, o dobro das demais. E vem negociando um “reajuste” de salário aos militares, para compensar o que vierem a perder com a reforma.
O governo também adiou o projeto com a cobrança dos devedores da Previdência Social, que somam R$ 490 bilhões. E silencia sobre os privilégios dos poderes Legislativo e Judiciário.
Em vez de atacar os mais pobres e os trabalhadores, poderia-se combater a sonegação fiscal, cobrar das empresas que provocaram acidentes de trabalho, para que paguem os auxílios-doença. Sem falar nos bilhões que escorrem através de isenções e renúncias fiscais e no pagamento da dívida pública.
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5 – Reforma atacará os mais pobres

A proposta de Bolsonaro conseguiu ser pior do que a de Temer e é a mais dura contrarreforma já proposta. O alvo principal são os trabalhadores e os pobres, que, contraditoriamente, em sua maioria, votaram em Bolsonaro e têm expectativas de que a vida melhore. Uma em cada quatro pessoas (23%) que têm renda dependem unicamente da aposentadoria ou de benefícios sociais.
Mas a vida pode piorar para muita gente. Um caso gritante é dos cerca de 23 milhões de pessoas que recebem entre 1 e 2 salários mínimos, e que deixarão de contar com o abono salarial do PIS/PASEP. Pela PEC, o valor passaria a ser pago apenas a quem ganha um salário mínimo, em média.
A PEC também é cruel com aqueles que precisarão se aposentar por incapacidade. O Brasil é o quarto país em números de acidentes de trabalho. Mas as vítimas podem vir a receber menos, porque a PEC muda a forma de cálculo. Hoje o valor é a média aritmética simples dos 80% maiores salários de contribuição. Pela proposta, a média será sobre todas as contribuições, incluindo as mais baixas, reduzindo o valor do benefício.
A situação é pior para quem sofrer um acidente fora do ambiente de trabalho. Por exemplo, um atropelamento. A reforma propõe que estas pessoas passem a receber apenas 60% do valor do benefício, mesmo tendo contribuído com a Previdência.
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6 – Reforma da Previdência acentuará desigualdades e opressões

A aprovação da reforma deixaria o Brasil ainda mais desigual. Enquanto os 10% mais ricos ficam com 43% da renda nacional, os 10% mais pobres ficam com apenas 0,8% do bolo. Ao cortar benefícios, a PEC acentuará essa desigualdade, aumentando os contrastes e a extrema pobreza.
As regiões Norte e Nordeste sentirão com mais intensidade o impacto da reforma e a redução dos benefícios. Ali se concentram as menores rendas, as maiores taxas de informalidade do País (gráfico) e as menores expectativas de vida. A PEC vai afetar a economia destas regiões, em especial das cidades médias e pequenas do interior, e aumentar a extrema pobreza e a miséria.

Síntese de Indicadores Sociais. Uma Análise das condições de vida da população brasileira. 2017.
IBGE. p. 35 Disponível em < https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv101459.pdf >

O governo está atacando os trabalhadores no campo. Hoje são cerca de 10 milhões de benefícios em zonas rurais. Além da Medida Provisória publicada em janeiro, que dificulta a comprovação do trabalho rural, a PEC propõe alterar as regras para este setor, que terão que contribuir por 20 anos, em vez de 15, e só poderão se aposentar com 60 anos.
A reforma vai atingir principalmente negros e negras. Entre os mais pobres, três em cada quatro pessoas são negros, segundo o IBGE. E é aí também onde o desemprego é maior e a expectativa de vida são menores: A cidade de São Paulo tem apenas um distrito – Carrão – no qual as pessoas negras vivem, em média, 70 anos. Em todos os outros, a morte chega antes.

Fonte: PRO-AIM (Programa de Aprimoramento das Informações de Mortalidade. Prefeitura de SP.
Elaboração: Hugo Nicolau Barbosa de Gusmão. Disponível em https://desigualdadesespaciais.wordpress.com/

As travestis e as mulheres trans têm expectativa de vida estimada em 35 anos por causa da violência, da exclusão familiar, da escola e do emprego. O preconceito, que o governo Bolsonaro se nega a combater, contribui para que permaneçam na informalidade ou no desemprego. Por isso, raramente conseguem se aposentar, o que será ainda pior se essa reforma for aprovada.
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7 – Brasil terá legião de idosos pobres nas ruas

Em 2060, o Brasil terá 58 milhões de pessoas acima de 65 anos. Muitas delas poderão vir a receber um valor abaixo do salário mínimo ou nada. A imagem do Chile, pais que vive uma onda de suicídio de idosos, por conta das aposentadorias menores do que um salário mínimo, é um alerta.
A PEC é cruel. Mas um dos pontos mais assustadores é o corte no Benefício de Prestação Continuada (BPC), que hoje paga um salário mínimo para quem tem 65 anos e deficientes, em condições de miséria. Pela PEC, a idade para receber este valor subiria para 70 anos, e seria criado um valor intermediário, R$ 400,00 (sem vínculo com o mínimo), pago a quem completar 60 anos, sem condições de se sustentar.
A medida é de uma desumanidade, pois ataca idosos pobres, os que mais necessitam e pode condená-los à morte. Só tem direto ao BPC quem tem renda per capita de 1/4 do salário mínimo, ou seja, R$ 248,50 por pessoa. Ou seja, são pessoas que vivem na extrema miséria, e cuja expectativa de vida já é muito menor.
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8 – Uma reforma machista

Na maioria dos casos, a proposta de reforma iguala as regras para homens e mulheres. Por exemplo, a idade mínima passa a ser a mesma, nas aposentadorias especiais de professores, policiais e trabalhadores rurais. Nas regras gerais, apesar de haver distinção, a idade mínima das mulheres sobe para 62 anos, e se aproxima da dos homens, que permanece em 65 anos.
No entanto, a exigência de contribuição mínima de 20 anos ou de 25 anos é um duro ataque às mulheres, pois estas sofrem mais com o desemprego, com a diferença salarial e têm mais dificuldades em contabilizar este tempo. Ao estabelecer regras iguais ou muito próximas entre homens e mulheres, a reforma a opressão e ignora o machismo, que faz com que as mulheres acumulem o trabalho doméstico e, em muitos casos, deixem de trabalhar fora.
Outro ataque às mulheres é a mudança na fórmula da pensão. Pela PEC, o valor passaria a ser 50% mais 10% por dependente. Ou seja, uma viúva que, pela regra atual, receberia 100% do benefício, passaria a receber apenas 60%.
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9 – Professor@s na mira da reforma

Professoras e professores da Educação Infantil ao Ensino Médio contam com aposentadoria especial, em função do desgaste causado pela profissão. Assim, no setor privado, professoras podem se aposentar após 25 anos de contribuição e professores após 30 anos. No setor público, podem se aposentar após 30 anos, com a idade mínima de 55 e 50 anos, respectivamente.
Pela regra proposta, os professores – homens e mulheres, da rede pública e privada – só poderão se aposentar após 60 anos, se tiverem cumprido 30 anos de contribuição. Na prática, a maioria acabará contribuindo mais de 30 anos, aguardando completar 60 anos.
É um grande ataque a uma categoria que já é alvo da perseguição da extrema direita, através do Escola Sem Partido, e que foi uma das que ajudou a impedir a reforma em 2017, com uma greve nacional.
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10 – Porteira aberta: PEC transfere poderes a uma lei complementar

A Proposta de Emenda Constitucional institui a Previdência Complementar, e dá prazo de até dois anos, para estados e municípios criarem seus regimes próprios. Mas o texto traz uma grande armadilha. Transfere a regulamentação da capitalização para uma Lei Complementar, que pode ser aprovada por maioria simples, sem os três quintos para aprovar uma PEC. Ou seja, os deputados irão aprovar um texto que transfere decisões e dá poderes a uma lei complementar para mudanças profundas.
O texto do ministro, que acompanha o projeto, apresenta o espírito: “Essa Proposta de Emenda Constitucional demonstra ser desnecessária a definição de regras de elegibilidade na carta magna, aprimorando a estrutura legal constitucional, adotando a forma sintética semelhante as constituições da maioria dos países, por exemplo, a dos Estados Unidos.”
Enquanto a Constituição assume uma “forma sintética”, a Lei Complementar, a ser enviada pelo governo, irá legislar livremente sobre as aposentadorias. Tudo poderá ser mudado, para pior.
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Foto: Entrega da PEC da reforma da Previdência. Marcos Corrêa/PR

SAIBA MAIS

Vídeo: Sara Granemann analisa o novo projeto da reforma da Previdência