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Intervenção militar no RJ completa 10 meses batendo recorde de mortes geradas por policiais

Por Tião Torres, do Rio de Janeiro (RJ)

No domingo, 16 de dezembro, o Rio de Janeiro completou dez meses desde o anúncio, pelo presidente ilegítimo Michel Temer (MDB-SP), da intervenção federal e militar na área de segurança pública do Estado. No dia 20 de fevereiro, apenas quatro dias depois que Temer anunciou a intervenção militar, a Câmara de Deputados e o Senado autorizaram o início das operações militares. Pela medida, a intervenção tem data para terminar: 31 de dezembro de 2018.

A marca de dez meses do início das operações e a proximidade do fim do prazo legal da intervenção federal e militar na segurança do RJ – caso não seja renovada – abre necessariamente uma discussão sobre um balanço urgente e necessário desta medida inédita até então.

Como já vem sendo fartamente divulgado pela grande imprensa, a intervenção militar passou longe de resolver o grave problema da segurança pública do Estado do Rio de Janeiro. A maioria da população do Estado, principalmente aquela que reside nas favelas e regiões próximas, segue com um grande sentimento de insegurança.

Segundo dados divulgados recentemente, principalmente pelo Observatório da Intervenção (ligado a Universidade Cândido Mendes), ainda que a intervenção tenha gerado alguma melhora pontual e pequena de alguns indicadores de criminalidade (especialmente em crimes contra o patrimônio), de fato ela não só não diminui a violência, como piorou qualitativamente outros fatores ainda mais preocupantes.

A polícia que mais mata, gerando ainda mais violência

2018 ainda não acabou, mas até o momento, os dados divulgados pelo Instituto de Segurança Pública (ISP), um autarquia ligada ao próprio Governo do Estado, já demonstram que houve um salto qualitativo nas mortes geradas por policiais, que atingiu seu maior índice em uma série histórica de 16 anos.

Os números realmente impressionam e preocupam. Até novembro deste ano, existiram 1.444 mortes provocadas por policiais, uma morte a cada cinco horas e meia. O número já supera e muito o do ano passado e também o de 2007 (1.330 mortes) – que era até agora o ano com mais mortes em decorrência de operações policiais.

De fevereiro a novembro deste ano, meses completos em que estava vigente a intervenção militar, o aumento das mortes provocadas por policiais cresceu 38%, em comparação aos mesmos meses do ano passado.

A violência policial e as mortes geradas pelos agentes de segurança do Estado tem endereço certo: a juventude, especialmente os jovens negros que vivem nas favelas cariocas. Os dados são evidentes: 77% das mortes são de negros (ou pardos) e 35% são jovens de 18 a 29 anos.

O número de morte de policiais também é alto, chega a 103 no período da intervenção militar na segurança pública do RJ, embora este índice tenha caído um pouco, se comparado com índices de outros anos.

Toda essa violência policial só vem gerando ainda mais violência. Afinal, por exemplo, o número de tiroteios disparou – especialmente na capital fluminense. De fevereiro a dezembro de 2017 foram computados 5.238 tiroteios, neste ano, nos mesmos meses, período da vigência da intervenção militar, esse número atingiu 8.193 tiroteios, um incrível aumento de 56%. Portanto, se explica com números a constante e crescente sensação de insegurança da maioria da população.

O desrespeito aos direitos humanos é outra marca da intervenção militar no RJ. Segundo relatório divulgado pela Defensoria Pública e entidades ligadas a luta pelos direitos humanos, mais de 30 tipos de abusos e crimes foram cometidos por agentes de segurança do Estado nas favelas cariocas, durante os meses da intervenção militar. Entre eles, destacam-se: invasão a casas, ameaças e agressões físicas, roubo de comida, impedimento de gravação de ações policiais, alteração de cenas de crimes, uso de aeronaves para atirar a esmo, entre outros. Este relatório, divulgado recentemente, se apoiou em cerca de 500 depoimentos, colhidos em 25 comunidades diferentes, principalmente na Rocinha, Cidade de Deus, Complexos da Maré e do Alemão.

Outros exemplos da situação trágica do RJ na área de segurança pública, mesmo depois de 10 meses de intervenção militar, são: a execução sumária da vereadora Marielle Franco (PSOL) e de Anderson Gomes, um crime político bárbaro, ainda sem solução, depois de mais de nove meses de acontecido; e a recente descoberta de um plano de uma das milícias que atuam na zona oeste para executar o deputado Marcelo Freixo, também do PSOL.

Bolsonaro e Witzel defendem intensificação da mesma política fracassada de segurança pública

Independentemente se a intervenção militar continuar no ano que vem, nada indica que haverá uma mudança na política de segurança pública praticada no RJ. Afinal, o governador eleito, Wilson Witzel (PSC), um dos principais aliados de Bolsonaro (PSL) no Estado, defende não só a manutenção desta política, como a sua intensificação.

Witzel fez campanha prometendo um combate violento contra a criminalidade. Chegou a afirmar que a polícia devia mirar na “cabecinha”, atirando para matar. Nesta semana, na inauguração de uma escola da PM, em Duque de Caxias, fez um gesto simulando um tiro na cabeça, brincando e lembrado da sua frase absurda e irresponsável.

O governador eleito pratica um discurso populista e de direita, que pode até gerar apoio popular num primeiro momento, devido ao desespero da população, mas nada resolve. Afinal, todos os dados disponíveis demonstram que a manutenção e intensificação da mesma política de segurança pública, praticada pela intervenção militar, só vai gerar mais violência e insegurança para a maioria da população.

A partir de janeiro de 2019, com a posse de Bolsonaro como Presidente e Witzel como Governador do RJ, será aprofundada ainda mais a política de violência e a criminalização da juventude pobre e negra das comunidades do Estado.

A luta diária e prioritária contra essa política racista e contra os pobres deve ser um dos principais compromissos da esquerda e dos movimentos sociais. Vivemos tempos de resistência. Enfrentar realmente o grave problema de segurança pública exige uma mudança completa da política praticada pelos governos anteriores, que deve ser ainda piorada nos próximos governos.

Este combate exige encarar temas mais estruturais, como: uma política prioritária de ampliação de investimentos em serviços públicos e geração de empregos para a maioria da população, combatendo a crescente e terrível injustiça social; abrir imediatamente a discussão em toda a sociedade brasileira sobre a necessidade descriminalização das drogas, como vem acontecendo em vários países; e ampliar o debate sobre a urgência da desmilitarização da Polícia Militar (PM), construindo uma polícia única e sob o controle da sociedade.

Sem ter a coragem de discutir a necessidade de medidas mais de fundo como estas, entre outras, seguiremos reféns de discursos oportunistas de governos, que se sucedem no poder, apenas se utilizando do discurso do combate de segurança pública apenas para ganhar votos, mantendo políticas que na prática só pioram ainda mais este grave problema.