Indicado para assumir o Ministério da Educação do governo de Jair Bolsonaro a partir de 1º de janeiro de 2019, o colombiano Ricardo Vélez Rodríguez é uma figura relativamente desconhecida nos meios da esquerda, mas devíamos estar atentos para aqueles contra os quais lutamos. Atuando como intelectual orgânico das direitas há pelo menos 40 anos, o ex-professor do Departamento de Filosofia da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), atualmente na iniciativa privada, já foi laureado com diversos prêmios oferecidos por organismos de direita e por instituições das Forças Armadas. Rodríguez, que acumula formação em Filosofia e Teologia, têm dezenas de livros e centenas de artigos publicados, parte deles dedicados a defender o liberalismo e o mercado e também a combater o lulopetismo, a esquerda e àquilo que vem sendo chamado nas hostes da extrema direita de “marxismo cultural gramscista”.
O currículo de Ricardo Rodríguez, como parece óbvio, é demasiado carregado de ideologia, algo que diz querer combater em nome de uma suposta neutralidade. Como defensor incansável da ideologia do movimento Escola sem Partido, é através de sua trajetória como membro do Instituto Brasileiro de Filosofia (IBF), uma entidade criada em 1949 pelo jurista e ex-membro da organização fascista Ação Integralista Brasileira (AIB), Miguel Reale, que Rodríguez se destaca no cenário intelectual das direitas. No IBF, que em 1962 passou a publicar a revista Convivium como parte do esforço conspirador e golpista daquilo que o historiador René Armand Dreifuss chamou de “elite orgânica”, Rodríguez se cacifou para o cargo no primeiro escalão no governo de Bolsonaro, algo que lhe valeu uma indicação por ninguém menos que Olavo de Carvalho, uma espécie de guru do novo governo. O astrólogo que passa por ser o filósofo mais lido e acompanhado nas redes sociais pelos grupos de direita, também indicou Ernesto Araújo para o Ministério das Relações Exteriores. Para quem não sabe, o futuro chefe do Itamaraty é alguém que acredita que o “globalismo” é uma “ideologia anti-cristã pilotada pelo marxismo cultural” e que a esquerda é “abortista” porque não quer que ninguém nasça “muito menos o menino Jesus”.
A indicação de Ricardo Vélez Rodríguez para o ministério da Educação atende ao mesmo princípio ideológico que motivou a indicação de Araújo para as relações Exteriores e confirma toda a movimentação desencadeada contra as universidades e os docentes em geral dos últimos anos. Também confirma que as intenções do futuro governo de Bolsonaro, que pretende promover a dilapidação do patrimônio público e a retirada de direitos dos trabalhadores, pressuporá uma atuação ostensiva a partir de uma frente ideológica de combate ao que Olavo de Carvalho, Ernesto Araújo, Ricardo Rodríguez e o próprio Bolsonaro entendem ser a influência da esquerda nos meios acadêmicos e àquilo que chamam de “doutrinação” nas salas de aula. Tal dispositivo estará consubstanciado na tentativa de criminalização do trabalho intelectual de docentes das universidades e também da educação básica, a partir da aprovação de projetos inspirados na ideologia do movimento Escola sem Partido, o que certamente redundará no desencadeamento de uma ofensiva ideológica com vistas a intimidação e ao cerceamento da liberdade, algo que deverá contar com apoio de parte do judiciário e do Ministério Público.
É justamente para atender a esses dispositivos que o colombiano foi confirmado na pasta da Educação, quando se deixaram de lado os nomes que vinham sendo especulados, inclusive o de Mozart Neves Ramos, ex-reitor da UFPE e ex-presidente da ANDIFES, com ampla circulação entre os reitores das universidades, muito embora com respaldo em setores conservadores. Mozart Ramos foi preterido em função da pressão da bancada evangélica e dos prepostos do movimento Escola sem Partido no Congresso, que pretendiam alguém mais vinculado à ideologia do movimento, mais orgânico nas hostes da extrema-direita e com serviços prestados à causa do liberalismo, da privatização e do mercado. Nesse sentido, não há dúvidas de que Rodríguez foi o escolhido porque é alguém que diz com todas as letras que é bobagem pensar em democratização da universidade, ou seja, o futuro ministro da Educação será um adversário feroz da popularização do ensino superior, inclusive da política de cotas, que permitiu o ingresso de milhares de negros na universidade pública nos últimos anos.
O fato é que entre os membros do governo de Bolsonaro, certamente existe a sensação de que um projeto de governo de cunho entreguista e ultra-neoliberal não poderá obter sucesso sem que sejam caladas as vozes da universidade, escolas e do meio científico, intelectual e artístico do país. Por conta disso, deve-se esperar uma ofensiva no sentido de se intimidar a inteligência, os professores, a intelectualidade, as ciências e as artes, um segmento que foi bastante importante na luta contra o golpe e na mobilização pela eleição de Fernando Haddad no segundo turno do pleito de 2018.
Frente aos desafios que se avizinham, é imprescindível a mobilização dos estudantes, docentes e do corpo técnico-administrativo das universidades e escolas, pois estas serão o alvo prioritário dessa ofensiva contra os trabalhadores que está por se realizar. Construir organismos de frente única antifascista e em defesa da democracia em cada local de estudo e de trabalho, organismos que sejam capazes de se articular em frentes ainda maiores e mais efetivas, é absolutamente essencial para que possamos resistir aos ataques do futuro governo, algo capaz de fazer valer a máxima tantas vezes repetidas nesses dias de que “ninguém solta a mão de ninguém”.
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