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Quem perde com a saída dos médicos cubanos do programa Mais Médicos?

Por: Mariana Pércia, de Maceió, AL
Araquém Alcântara

O programa Mais Médicos foi instituído em 2013, na gestão de Dilma, com o intuito de fazer chegar saúde pública e alcançar o princípio de Universalidade do SUS (garantia de acesso a todos os cidadãos, ainda distante).

Em tempo, o Mais Médicos se somou a um conjunto de ações e iniciativas do governo para o fortalecimento da Atenção Básica do país. A Atenção Básica é a porta de entrada preferencial do Sistema Único de Saúde (SUS), que está presente em todos os municípios e próxima de todas as comunidades. É neste atendimento que 80% dos problemas de saúde são resolvidos, evitando agravos à saúde e também sendo uma fonte de economia ao sistema de saúde, já que contem em si um conceito de ”elevada complexidade e baixa densidade tecnológica“, ou seja, é capaz de resolver grande parte dos problemas de saúde, inclusive de evitar o aparecimento de alguns (já que também atua na promoção e prevenção da saúde), e são necessários muito menos recursos tecnológicos se comparado a um hospital de média e alta complexidade.

Atualmente o programa conta com cerca de 18 mil profissionais, sendo 8500 médicos cubanos e 8459 médicos brasileiros formados no Brasil ou no exterior e 483 estrangeiros de outros países. Os médicos cubanos estão em 2885 municípios do país, sendo a maioria nas áreas mais vulneráveis: norte do país, semiárido nordestino, cidades com baixo IDH, saúde indígena e periferias dos grandes centros urbanos. 1575 desses municípios só possuem médicos cubanos, 700 deles tiveram um médico no próprio município pela primeira vez. Existem 300 médicos cubanos atuando nas aldeias indígenas (DSEIs), isso representa 75% dos médicos que atuam na saúde indígena de nosso país. Os locais onde os cubanos atuam foram oferecidos antes a médicos brasileiros, que não aceitaram trabalhar lá. Em 5 anos de Mais Médicos nenhum edital de contratação de médicos brasileiros conseguiu contratar essa quantidade de profissionais, o maior edital contratou 3 mil.

É óbvio o impacto dessa retirada para a população brasileira. Para a população dos principais bolsões de miséria e vulnerabilidade. Saúde publica é sim sujar o pé de lama, diferente do que disse Lincoln Lopes, o tal indicado a ministro por algumas entidades médicas que apoiam o presidente eleito.. esse senhor disse que “nenhum médico é obrigado a sujar o pé na lama”.

Obrigado ninguém é a nada, inclusive os médicos cubanos que aqui estavam prestando uma ajuda humanitária ao Brasil, estavam por terem outro entendimento de saúde publica, um entendimento de cooperação internacional humanitária, como os que os moveram a prestar ações no Haiti, Venezuela, África e atualmente em 67 países. Como disse em nota o ministério da saúde cubana em 55 anos se cumpriram 600 mil missões internacionais, disponibilizando cerca de 400 mil profissionais de saúde e destacando ações e impactos como a luta contra o ébola na África, a cólera no Haiti, entre diversas ações do contingente internacional de médicos especializados em grandes desastres e epidemias.

As condições impostas por Jair Bolsonaro e a campanha elitista, racista e xenófoba que vêm sendo travada muitas vezes por médicos e entidades médicas brasileiras contra esses colegas que prestam todo esse serviço ao nosso país é vergonhosa.

É vergonhosa porque não é verdade que a preocupação desses colegas se baseiam na qualidade de assistência ou na preocupação caridosa com essa população. Se fosse verdade se baseariam nas pesquisas que já existem sobre o impacto EPIDEMIOLÓGICO dos médicos cubanos não só no PMM, mas também em suas outras ações expedicionárias, se fosse ainda um gesto de solidariedade e preocupação com o aumento salarial desses profissionais teríamos visto nos últimos anos campanhas de solidariedade e de reivindicação nesse sentido a esses companheiros, e o que vimos foi uma extensa campanha de boicote e medo de “perder valor de mercado”, a revelia da opinião da população inclusive.

Nao é verdade que é plausível a ditas “exigências“ de Bolsonaro, sabe por que? Por que significa deslegitimar a formação desses companheiros, em conjunto com uma campanha de ódio a Cuba e ao que ela representa que já existe e que contaminou a população brasileira, e retirar a parte do acordo que dá a Cuba a possibilidade de financiar outras ações expedicionárias a outros países. Vocês sabiam por exemplo que grande parte dos 50% que ficam em cuba do salário desses médicos é devolvido a eles quando eles retornam ao país? E tem sim o intuito de fazê-los retornar e movimentar a economia local. Assim como existem milhares de bolsas da CAPES onde depois que você faz um doutorado fora do país você tem que retornar ao país e ficar pelo menos 3 anos aqui, é parte de um retorno científico do investimento público feito em você.

Não há milhares de cubanos ”escravizados” e obrigados a trabalharem no PMM, é o racismo de grande parte dos médicos brasileiros que não admitem enxerga-los como colegas de trabalho. Eles são e sabem muito de saúde pública, porque não vêm na saúde uma simples relação de trabalho e sim uma relação humana.

Deixo minha singela homenagem ao querido colega Jean Philipe, que é brasileiro e se formou em Cuba e com quem tive a oportunidade de trabalhar numa dessas periferias do grande centro. Amigo que me ensinou muito e muito com o pé na lama.

Quem perde é sem dúvida os cerca de 63 milhões de pessoas atendidas por esse programa. Essas pessoas precisam se mover.

 

FOTO: Livro Mais Médicos. Foto de Araquém Alcântara. O doutor cubano Jean-Gardy Merceus, do “Programa Mais Médicos”. Manacapuru (AM). Brasil, 2015.