Vivemos tempos difíceis, um líder neofascista chegou à Presidência da República. Os setores mais conscientes da classe trabalhadora sabem a grandeza do desafio. Também se aprende nas derrotas. E o mais importante: existe resistência, existe esperança. Os emocionantes últimos dias de campanha levaram várias pessoas para as ruas e, deflagrado o resultado, muitos têm procurado o PSOL para se filiar e se organizar. É a reação de quem diz: “Estou de pé. Não recuo um milímetro. Um passo em frente”.
Programa e Estratégia
Somos uma classe oprimida e explorada. E quando falamos em classe trabalhadora, falamos de uma classe diversa que não apenas inclui, como é formada, em sua maior parte por precarizados, por mulheres, por negros e negras, por pessoas LGBT. Produzimos tudo, estamos entre as 10 maiores economias do mundo, mas o Brasil carrega uma desigualdade social endêmica, produto da nossa história de dependência, dos 388 anos de escravidão tardia, dos 21 anos de ditadura militar e das opções políticas dos governos da nossa história recente.
O golpe parlamentar e o apoio à um neofascista falam muito sobre a classe dominante brasileira e representam a falência de uma estratégia. Há 10 anos atrás, no auge dos governos petistas, a ideia de que era possível mudar o Brasil com pequenas reformas conquistadas através de alianças e negociações era muito poderosa. Afinal apesar desta estratégia ter mostrado seus limites em diversas outras experiências históricas no século XX, a experiência do Brasil naquela época, a “vivência” de milhares de trabalhadores que sentiam seu poder de compra crescer e de milhões de jovens que chegavam à universidade pela primeira vez parecia dar razão à ilusão reformista. Ainda que estejamos tratando de medidas mínimas e básicas, seus impactos num país muito pobre e desigual, geraram ilusões de que o capitalismo do século XXI poderia aceitar reformas, de que a vida poderia melhorar sem rupturas.
Mas a história mostrou, uma vez mais, que na primeira crise as pequenas conquistas viraram pó e a burguesia utilizou-se do ódio acumulado nos setores mais conservadores da sociedade. Gente que outrora aceitou calado, porém jamais concordou com as cotas, com a licença maternidade de 6 meses (ainda concedida à apenas uma parte das trabalhadoras), com o protagonismo das mulheres, com a legalização (feita via judiciário) do casamento LGBT. Pessoas que diante da primeira oportunidade não perderam a chance de gritar em alto e bom som seus preconceitos. Quando foi necessário a burguesia se aliou ao neofacismo para combater um programa de pequenas reformas e medidas sociais compensatórias.
O que Bolsonaro chama de “comunismo” são em sua imensa maioria propostas do Banco Mundial e das Nações Unidas. O projeto de pequenas conquistas foi abatido como se fosse um programa socialista. Só este fato merece imenso estudo e fala muito sobre o caráter e a covardia da classe dominante brasileira. Para os que querem mudar o mundo é tempo de tira lições deste processo. A força do argumento gradualista não é justamente a sua viabilidade? Uma vez mais as ilusões reformistas e/ou gradualistas mostraram sua inviabilidade histórica. Elas podem viver por um tempo, mas não são capazes de alavancar um projeto de mudança estrutural.
Lutar organizado
Este exemplo mostra como a experiência das nossas vidas, as nossas vivências não são suficientes para mostrar qual direção tomar, qual rumo seguir. E nós não podemos cometer os mesmos erros todas as vezes e nem “inventar a roda” a cada nova luta. Em momentos defensivos como este que nos encontramos, se faz, ainda mais necessário, estarmos juntos lutando pelos mesmos objetivos. Para isso existem as organizações, elas são um instrumento.
Engana-se quem pensa que elas são um fim em si mesmo, mas também se equivoca quem pensa que elas são inúteis. As organizações são ferramentas decisivas para vitória, com elas é possível perder, mas sem organização coletiva a derrota é certa. A história conheceu muitas revoluções espontâneas, mas nenhuma foi vitoriosa sem a existência de partidos políticos que fossem capazes de se conectar a esses processos espontâneos e oferecer a eles um ingrediente fundamental, o fator consciente: o programa.
Organizar-se é dar um sentido consciente à militância cotidiana. É uma necessidade no ascenso e, também, no refluxo da luta de classes. Estudar e conhecer experiências anteriores. Planejar e disputar coletivamente o rumo da história. Todas essas são tarefas que pela sua própria essência só podem ser realizadas pelo coletivo. O individualismo crescente dos nossos tempos combinado com o questionamento da viabilidade de revoluções sociais semeou desconfiança e descrença nos instrumentos coletivos. Filiar-se a um partido político e se engajar na luta social de modo organizado é um projeto em questionamento nos tempos atuais.
As organizações políticas terão que lidar com esta realidade e provar sua eficácia e utilidade. A autoproclamação não levará ninguém à vitória. É com humildade e certeza dos nossos limites que queremos convidar os que estiveram conosco nos desafios da campanha do Guilherme Boulos no primeiro turno, nas emocionantes mobilizações das mulheres e no combate ao fascismo no segundo turno a filiar-se ao PSOL e organizar-se na Resistência. A Resistência é um agrupamento político que atua nos movimentos sociais e no interior do PSOL. Acreditamos na força dos de baixo contra os de cima, na capacidade de resiliência das mulheres, negros e negras e LGBTs. A vida nos pede um passo adiante.
Foto: Igor Dantas | Esquerda Online
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