Há quem diga que o PT é um dos culpados pela vitória eleitoral de Bolsonaro. E, com certeza, é. O PT cometeu, em nossa opinião, dois grandes erros: um político e outro estratégico.
O primeiro erro foi não ter combatido politicamente a candidatura de Bolsonaro no 1º turno das eleições presidenciais. O PT deixou essa tarefa nas mãos de outros candidatos, inclusive de Geraldo Alckmin do PSDB. Na visão da cúpula petista, Bolsonaro era o melhor adversário para o 2º turno, uma ideia baseada nas pesquisas de opinião.
Não é possível afirmar que o resultado eleitoral seria diferente se o PT tivesse priorizado o combate ao projeto neofascista desde o 1º turno, pois a força do bolsonarismo nas urnas foi surpreendente. No entanto, se o PT usasse seu tempo de TV, sua militância e seus recursos para enfrentar Bolsonaro, a resistência ao seu governo hoje estaria muito mais forte, uma vez que o PT é a principal organização política da esquerda brasileira. Esse erro foi um crime político!
Não é correto estender essa crítica à batalha política do PT pela inscrição e validação da candidatura de Lula. Essa linha foi parte da campanha contra a prisão do ex-presidente, um capítulo do golpe. A denúncia da prisão de Lula e do caráter reacionário da operação Lava Jato deve ser parte do programa da esquerda contra o fechamento do regime político brasileiro. Além disso, dificilmente Haddad e Manuela chegariam ao 2º turno sem toda a operação política de transferência de votos de Lula, para a qual a manutenção da candidatura de Lula até o limite legal foi necessária.
A exigência de que o PT tivesse trocado antes a candidatura de Lula pela de Haddad para não insuflar o antipetismo é conservadora. Sobre esse tema, à esquerda cabe fazer outras críticas: Lula não deveria ter se entregado, deveria ter fugido e pedido asilo político em um país democrático, para poder fazer luta política, ou seja, dar entrevistas, declarações, gravar vídeos etc.; o PT não poderia ter confiado no Judiciário e deveria ter construído um processo de mobilização social contra a perseguição que sofria, que era a antessala de uma perseguição à esquerda e aos movimentos sociais de conjunto.
Por outro lado, a exigência para o PT retirar a sua candidatura em favor de Ciro Gomes, que supostamente era um candidato mais competitivo para enfrentar Bolsonaro no 2º turno, também não era correta. Falamos “supostamente” porque essa hipótese era baseada igualmente nas pesquisas de opinião, as mesmas que apontavam que era melhor para o PT encarar o candidato do PSL no 2º turno. Ademais, essa exigência era, na prática, um pedido para o PT se autossabotar e aceitar sua derrota antes da luta chegar ao fim.
O segundo erro, o estratégico, foi ter desperdiçado as duas últimas ofensivas da esquerda e dos movimentos sociais, a que resultou na vitória de Lula em 2002 e as jornadas de junho de 2013, para enfraquecer o poder econômico e político das elites brasileiras e das forças políticas da direita.
Em mais de treze anos de governos petistas, os acordos com os representantes das classes dominantes impediram a realização de reformas estruturais progressivas que ampliassem qualitativamente os direitos sociais, trabalhistas e democráticos do povo brasileiro, como a democratização da mídia, as reformas agrária e urbana, a redução da jornada de trabalho, a universalização do ensino superior público etc.
O crescimento econômico vivido nos três primeiros governos do PT serviram apenas para impor pequenas reformas, ampliar o consumo e para uma política de redistribuição de renda baseada em programas sociais e aumento real do salário mínimo, limitadas pelo superávit primário e pelo pagamento religioso da dívida pública. Isso não quer dizer que essas medidas não foram relevantes. Elas foram sim, e muito, principalmente nos estados do Nordeste. No entanto, era possível fazer muito mais se a estratégia não fosse a política econômica do ganha-ganha, se o lucro dos grandes capitalistas tivesse sido atacado.
Evidentemente, a estratégia que defendemos não poderia ser construída através do presidencialismo de coalizão, da busca por governabilidade no Congresso Nacional. Ela teria que se sustentar na mobilização permanente dos trabalhadores e da juventude, na valorização da consciência de classe e na organização coletiva do povo.
Dessa forma, mesmo com a crise econômica e social que vive o país, haveria mais reservas políticas entre setores do proletariado e das baixas classes médias para interromper o crescimento do neofascismo no Brasil. Do ponto de vista da consciência, o Brasil poderia ser o espelho do que é hoje a região Nordeste, onde os governos petistas promoverem mudanças tão profundas que, até hoje, são um dique contra o antipetismo.
Essa compreensão dos reais erros do PT pode não ser tão importante para a organização imediata da resistência popular aos primeiros ataques do governo Bolsonaro, mas é imprescindível para a construção de um novo projeto de esquerda no país.
Nesse sentido, a frente política e social forjada pelo PSOL nessas eleições, ao lado do MTST, da APIB, do PCB e da Mídia Ninja, é o melhor projeto em desenvolvimento, pois ela une a independência de classe, o vínculo com os movimentos sociais e o protagonismo das mulheres, dos indígenas, da juventude negra e da população LGBTQI. Essa é a melhor aposta para o futuro, justamente porque já cumpre um papel determinante no presente.
Foto: Divulgação
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