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Haddad acena à direita

Gabriel Casoni

Gabriel Casoni, de São Paulo (SP), é professor de sociologia, mestre em História Econômica pela USP e faz parte da coordenação nacional da Resistência, corrente interna do PSOL.

As pesquisas retratam crescimento rápido de Fernando Haddad. Desde que  foi oficializado como candidato do PT, a menos de dez dias, o ex-prefeito de SP deu um salto nas intenções de voto.

A transferência da popularidade de Lula está se demonstrando bastante eficaz e pode levar o petista ao segundo turno, onde deve enfrentar, ao que tudo indica, Jair Bolsonaro.

A veloz subida de Haddad reorganiza o tabuleiro da disputa político-eleitoral, colocando em primeiro plano a polarização entre o antibolsonarismo e o antipetismo. Em outros termos, entre o neofascismo ascendente e a força do lulismo.

Antevendo a possibilidade de um duelo com Bolsonaro no 2o turno, Haddad modela seu discurso para agradar a classe dominante. Em diversas entrevistas e declarações nos últimos dias, o petista afirmou ser favorável a uma reforma da previdência e ao ajuste fiscal (ainda que de forma mais moderada), declarou que não dará indulto a Lula, não se comprometeu com a revogação das reformas e privatizações de Temer, entre outros gestos à direita.

Haddad tem em mente dois objetivos principais com esse movimento: (1) do ponto de vista tático mais imediato, conseguir apoio de setores da burguesia para o provável embate contra o capitão fascista no 2o turno; e (2) do ponto de vista estratégico, refazer o pacto rompido pela classe dominante com o golpe parlamentar de 2016.

Neste compromisso, a burguesia aceitaria o governo Haddad sem promover a desestabilização do novo presidente (como ocorreu com Dilma) e o PT, por sua vez, governaria o país respeitando os limites impostos pela classe dominante. O partido de Lula oferece ao andar de cima seu compromisso com a estabilidade do regime democrático-burguês ante a ameaça de ruptura aventureira representada por Bolsonaro, que chegando ao governo tende a impor um regime autoritário (bonapartista) de extrema-direita – intenções golpistas se fazem mais explícitas na cúpula bolsonarista.

Outra vez, emerge à superfície a perigosa duplicidade do discurso petista. De um lado, acena ao povo trabalhador com a promessa de reverter o cenário tenebroso construído por Temer e, assim, construir um Brasil com emprego e oportunidades para todos. De outro, compromete-se com a elite econômica a dar prosseguimento ao ajuste e reformas antipopulares, embora em doses mais suaves, assim como pretende manter a política de alianças com partidos da direita para formar a base de sustentação parlamentar do eventual governo Haddad.

Em linhas gerais, trata-se do mesmo desenho político traçado quando da tentativa da reeleição de Dilma Roussef em 2014. Para os trabalhadores, a promessa de que não haveria retrocessos. Para a burguesia, o compromisso com o ajuste capitalista. O resultado é sabido por todos nós: veio o estelionato eleitoral, a base popular de apoio ao governo derreteu, a crise econômica se acentuou, a classe média foi às ruas, os aliados da direita traíram, a burguesia dirigiu o golpe e Temer se tornou presidente para aplicar duríssimos ataques aos trabalhadores.

O partido de Lula alimenta a ilusão de que é possível conciliar os interesses da maioria do povo com as pretensões de rapina da burguesia e do imperialismo num contexto de grave crise social, econômica e política. A política do “ganha-ganha”  vigente durante os governo Lula, em que todas as classes pareciam satisfeitas, foi possível num contexto interno e externo excepcional, irrepetível nas atuais circunstâncias.

Em verdade, um possível novo estelionato eleitoral do PT, contrariando as expectativas populares, pode ter um desfecho ainda mais trágico que aquele do segundo governo Dilma. O projeto de extrema direita de Jair Bolsonaro ganhou a maioria da classe média e também parcelas da classe trabalhadora. Mesmo que o capitão seja derrotado na eleições, o que todos desejamos e para o que lutamos, sairá das urnas com uma imensa e raivosa base social de apoio. Setores da classe dominante, que já se deslocaram em apoio a Bolsonaro, tendência que deve se ampliar no 2o turno, provavelmente formarão uma oposição ativa contra o eventual governo do PT.

As amigáveis mensagens de Haddad para a burguesia e o imperialismo sinalizam a escolha de um caminho perigoso. Para derrotar o golpe e o neofascismo crescente, é preciso um governo de esquerda disposto a fazer reformas estruturais que coloquem em movimento a classe trabalhadora e os oprimidos; um governo que garanta sua “governabilidade” nas ruas e não nas alianças com a direita. Para tanto, será preciso ter coragem política para enfrentar a burguesia e força social para derrotar o fascismo.

Nesse sentido, no 1o turno, o voto em Guilherme Boulos e Sonia Guajajara (PSOL/PCB) é o único que fortalece esta estratégia e programa, preparando a luta inevitável de amanhã. Pois o PT demonstra que não aprendeu nada com golpe que sofreu dois anos atrás.
 
O monstro da extrema direita levantou a cabeça. A repetição da conciliação com o andar de cima, no atual momento de crise que atravessa o país, pode lhe dar a chave do poder.
 
Em contraste, o exemplo positivo vem das mulheres, que tomarão as ruas dia 29 de setembro contra o Coiso. Vamos juntos com elas! #Elenão #elenunca.

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eleições 2018 / pt