A campanha do Setembro Amarelo tem como objetivo conscientizar a população sobre os fatores de risco do suicídio, assim como prevenir esta que tem se tornado uma das principais causas de morte no mundo. Entre os jovens e adolescentes entre 15 e 29 anos, por exemplo, já é a segunda maior causa de morte. No mundo, de acordo com a Organização Mundial de Saúde – OMS, acontecem aproximadamente 800 mil suicídios por ano. No Brasil, esta taxa é de 11 mil, de acordo com o 1º Boletim Epidemiológico divulgado em setembro do ano passado pelo Ministério da Saúde.
Embora o suicídio tenha entre seus fatores de risco questões psicológicas, isolamento social, transtornos mentais, depressão, alcoolismo, entre outros e, portanto, possui um forte componente individual, entendemos que determinantes econômicos e sociais, especialmente ligados à opressão, possuem influências consideráveis em grande parte dos casos. Por isso, as taxas de suicídio são mais elevadas entre os jovens, indígenas, LGBTs, pessoas encarceradas, refugiados e migrantes.
Segundo a OMS, em 2015 78% dos casos ocorreram em países com baixa e média renda média. Em estudo sobre os efeitos dos determinantes econômicos nas taxas de suicídio, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – IPEA também constatou que as crises econômicas e o consequente aumento do desemprego aumentam o risco do suicídio, especialmente entre os jovens.
Na população em geral, foram registrados 5,5 suicídios para cada 100 mil habitantes em 2015. Essa taxa é de 8,9 entre os idosos, 15,2 na população indígena e 22,2 na população carcerária. Na faixa etária entre os 15 e 29 anos, o suicídio já é a segunda maior causa de morte no mundo, ficando atrás apenas dos acidentes de trânsito.
População Indígena
Entre os anos de 2011 e 2015, a taxa de morte por suicídio foi maior na população indígena, sendo 15,2 em cada 100 mil habitantes. Novamente, aqui, observou-se que entre os jovens a taxa foi mais preocupante: 44,8% desta taxa se encontravam na faixa etária entre 10 e 19 anos. Partes dos motivos são a falta de demarcação das terras indígenas, a invasão de seus territórios, a violência do agronegócio, a negação de direitos básicos e o preconceito com suas culturas.
População carcerária
Nas prisões, as chances de uma pessoa se suicidar são, em média, quatro vezes maiores quando comparadas às da população brasileira total. Foram registradas 22,2 mortes autoprovocadas para cada 100 mil. Entre as mulheres presas a taxa é 20 vezes maior que a média nacional. Entre os fatores que influenciam o sofrimento psicológico nesta população está a falta de informação sobre a situação processual, a violência física e psicológica, o isolamento e a superlotação dos presídios.
LGBTs
Neste setor da população, em que pese as dificuldades em obter dados sobre as taxas de suicídio em virtude da falta de dados do governo e da subnotificação, os poucos dados já apontam a vulnerabilidade deste grupo, especialmente entre os adolescentes e jovens rejeitados por suas famílias por serem lésbicas, gays, bissexuais e transsexuais. O Grupo Gay da Bahia tem feito um trabalho de levantar dados através do site Quem a homofobia matou hoje?. Os primeiros dados apontam que, a cada 19h, um LGBT é assassinado ou comete suicídio vítima da LGBTfobia. Neste grupo, além dos fatores de adoecimento comuns à toda população, em especial aos jovens, a discriminação pela identidade de gênero e orientação sexual, que se revela desde o bullying na escola até os altíssimos índices de assassinato desta população, aumenta as chances de tentarem suicídio.
A política do governo Temer
No Boletim do Ministério da Saúde, a existência de um Centro de Atenção Psicossocial – CAPS no município foi o único fator de prevenção analisado que surtiu efeito positivo de prevenção. Nestes municípios, houve uma redução de 14% do risco de suicídio.
Apesar disto, em dezembro de 2017 o governo Temer realizou uma revisão da política nacional de saúde mental, que significou um retrocesso de décadas na luta antimanicomial para os usuários e profissionais da política de saúde mental. Através do aumento do valor das diárias para os leitos em hospitais psiquiátricos, o investimento de milhões em comunidades terapêuticas privadas – as quais possuem várias denúncias de trabalhos forçados, maus-tratos e possuem forte ligação com setores religiosos que objetivam “tratar” moralmente os problemas de saúde mental – Temer e o Ministério da Saúde desinveste nos CAPS que já são insuficientes e sofrem sucateados pela falta de recursos.
Assim, inverte-se o caminho que foi trilhado pela Luta Antimanicomial e volta-se a investir em internação, isolamento e silenciamento, notadamente parte dos fatores de risco para o suicídio diagnosticados em todos as pesquisas sobre o tema.
No que toca os determinantes sociais e econômicos que influenciam as altas taxas de suicídio no Brasil e no mundo, vivemos um período de retrocesso nas políticas públicas e nos direitos. A crise econômica, o aumento do desemprego, os ataques contra os direitos ao trabalho, à previdência social, os cortes nos gastos no combate à violência contra as mulheres, negros/as e LGBTS, representam um cenário de avanço do conservadorismo e ofensiva reacionária. Isso significa dizer que, se se mantêm a lógica de desfinanciamento da política de saúde mental e demais políticas públicas; as altas taxas de desemprego, informalidade e precarização do trabalho; o arquivamento do projeto de Lei que criminaliza a LGBTfobia; a perseguição contra a discussão de gênero e diversidade sexual nas escolas; a falta de demarcação dos territórios indígenas; o país pode, sim, estar remando contra a maré na prevenção dos suicídios.
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