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Especiais
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Há exatos 40 anos, uma final de Copa era realizada ao lado de um campo de concentração

Por Noraldino Neto, para o Lateral Esquerda

O tempo normal da partida final da Copa da Argentina em 25 de junho de 1978 havia terminado. Os mais de 70 mil que lotavam o estádio do River Plate, ainda estavam com um frio na barriga, pois aos 45 minutos do segundo tempo, a Holanda que havia empatado aos 37 depois da seleção da casa sair na frente no primeiro tempo, tinha chutado na trave a chance da virada. A partida iria para a prorrogação onde o sofrimento finalmente seria aliviado de vez com mais dois gols que deram a Argentina o tão sonhado Mundial de Futebol.

A poucos metros do mesmo estádio da final, o Monumental no bairro de Nuñes em Buenos Aires estava a ESMA (Escola de Mecânica da Armada) o principal entre os mais de 500 campos de concentração da mais sanguinária ditadura das Américas, que torturou e matou cerca de 30 mil pessoas. Lá foram encarcerados mais de 5000, desses, 90%, depois de torturas sistemáticas, foram assassinados por fuzilamento, incineração e em sua maioria, nos chamados voos da morte, onde os presos políticos eram sedados e jogados de aviões no Rio da Prata.

Graciela Daleo foi uma das poucas sobreviventes da ESMA. E conta no obrigatório “Memórias do Chumbo, o Futebol nos Tempos do Condor” do jornalista e historiador Lúcio de Castro, que depois da final ela e outros companheiros encarcerados foram retirados de suas celas, colocados em viaturas para que pudessem ver a “festa” popular celebrando a primeira copa conquistada pela Argentina nas ruas de Buenos Aires.

Outros relatos da ESMA dão conta que os presos nos dias de jogos de seu país, ouviam o grito de gol da torcida pela proximidade com o Monumental de Nuñes. E sabiam que a cada gol marcado por Kempes e Cia, a ditadura se fortalecia, e mais pessoas seriam presas, torturadas e mortas na ESMA ou em outros cárceres.

HAVELANGE com as mãos sujas de sangue.

O então presidente da FIFA João Havelange, apesar dos protestos de grupos de exilados argentinos e outras organizações que denunciavam os horrores praticados pela Junta militar argentina comandadas na época por Jorge Videla, avalizou e garantiu a realização da Copa. Antes porém, numa parceria nefasta entre FIFA, junta militar e a gigante mundial de comunicação Burson- Marsteller, o país devastado pela barbárie ditatorial, teria que passar por uma espécie de maquiagem, afinal uma boa imagem era necessária para não haver boicotes dos países europeus.

A Burson então, lançou o slogan que guiou a publicidade da repressão “Somos direitos humanos”. Adesivos de carro, Outdoors e propagandas no rádio e televisão foram vinculadas para enfeitar o rosto de um regime fascista, culminando com um niño argentino segurando e soltando a Paloma da PAZ, na cerimônia de abertura.

Enquanto isso o regime sequestrava mais de 500 outros niños, filhos recém-nascidos de presos políticos e alguns tiveram que crescer e serem criados pelos assassinos de seus próprios pais.

Quarenta anos depois pode ser difícil acreditar que uma final de Copa tenha sido disputada ao lado de um campo de concentração, mas em tempos onde a caserna começa a se assanhar outra vez e é até aclamada como alternativa a “desordem e à corrupção”, é preciso lembrar, de 25 de junho de 1978 e dizer NUNCA MAIS.

Os Argentinos ao menos prenderam e condenaram seus ditadores, hoje o prédio da ESMA é um centro de Memória onde são expostos, pra qualquer desavisado que bate panela clamando pela volta das ditaduras, os horrores de um regime como esse. Essa Copa os argentinos também ganharam, enquanto que no Brasil Torturadores são homenageados e quartéis que serviram de centros de tortura continuam quartéis.