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Política, imigração, identidade nacional e xenofobia geram crise nos atuais campeões

Por: Gabriel Santos, para o Lateral Esquerda

A seleção alemã, atual campeã do mundo, não vive uma de suas melhores fases. Após um fraco desempenho na preparação para a Copa, e ao perder para o México na estréia do mundial da Rússia, a imprensa do país tem feito fortes críticas à forma que o até então intocável treinador Joachim Löw escala a equipe. Para os críticos, jogadores essências no título conquistado há quatro anos já não demonstram seu melhor futebol. Muitos querem ver Mesut Ozil e Sami Khedira no banco.

Para além das críticas ao futebol, um fantasma recente tem assombrado a delegação alemã. Há pouco mais de um mês, dia 14 de maio, dois dos principais jogadores da seleção, os meio-campistas Mesut Özil e Ilkay Gündogan, tiraram fotos com o presidente da Turquia, Recep Erdogan. O encontro entre os jogadores e o presidente se deu em Londres, onde Ozil, um dos armadores mais talentosos do mundo, entregou ao presidente turco a camisa de seu clube, o Arsenal. O gesto foi feito também por Gündogan ao presentear Erdogan com a camisa do Manchester City, clube no qual o meio-campista é um dos principais destaques e acabou de conquistar o campeonato inglês. Os dois atletas são de origem turca e nasceram em Gelsenkirchen, no Oeste alemão. As fotos do encontro foram divulgadas pelo partido de Erdogan, o AKP, anunciando que Erdogan havia reunido com os “jogadores turcos da Premier Ligue”. Essa foto logo gerou uma crise política na Alemanha.

A Federação Alemã de Futebol (DFB) se pronunciou contrária à atitude dos atletas. Ele sofreram críticas da mídia esportiva, e o caso ultrapassou as quatro linhas do jogo, indo parar no parlamento. Diversos partidos, deputados e líderes políticos se pronunciaram, desde a social-democracia até a extrema-direita, todos, em certa medida com críticas nacionalistas, evocando a identidade nacional.

Um debate se levantou na Alemanha acerca da integração da comunidade turca no país. Como bem falou em recente entrevista de imprensa o presidente da DFB, “Em 2014, a integração era vista como positiva. Isso mudou com a imigração em 2015. As pessoas vêem problemas. Temos uma posição clara como federação. Estamos lidando com uma questão social. Há problemas neste país que vão muito além desta equipe”.

A grande questão não foi somente uma foto com um presidente que viola constantemente os direitos humanos, que cada vez mais tem medidas ditatoriais e busca eliminar seus inimigos para permanecer no Poder. Mas sim, o fato de jogadores da seleção alemã, um símbolo da identidade nacional, tirarem foto com um presidente de outro país e ainda chamarem de “meu presidente”. O fato de jogadores de origem turca se sentirem mais turcos que alemães é um problema para muitos, e mostra que a política de integração tem algumas falhas.

O nível das críticas feitas por políticos tradicionais foi de ataque aos jogadores. O deputado Cem Özdemir, do Partido Verde, elevou o tom: “O presidente alemão se chama Frank-Walter Steinmeier, a chanceler federal, Angela Merkel, e o Parlamento, Bundestag”. Numa clara referência à forma com que Gündogan tratou o presidente turco.
Nos partidos governistas, o pronunciamento oficial foi feito pelos porta-vozes de política esportiva. Pela União Democrata Cristã (CDU), Eberhard Gienger disse que as atitudes dos jogadores vão contra o esforço do governo para integrar a comunidade turca à Alemanha. Pelo Partido Social-Democrata (SPD), Detlev Pilger afirmou que os meio-campistas jogam na seleção da Alemanha, sendo assim, deveriam ter mais respeito e solidariedade ao país.
A fala de Pilger, por exemplo, mostra a forma que muitos ainda enxergam questões relacionadas à imigração.

Como se o imigrante ou minoria étnica tivesse que ser eternamente grato ao país que lhe recebeu e negar suas origens. Quando na verdade, os imigrantes sofrem preconceito, xenofobia, salários mais baixos, empregos precários. Caso dos 3,7 milhões de turcos que vivem na Alemanha, muitos são descendentes dos que na década de 50 e 60 foram “convidados” a trabalhar no país e ajudar a fazer o milagre econômico alemão. A integração da comunidade turca é colocada como se estes tivessem que abandonar seus costumes, língua, cultura, para se adequar à Alemanha.

Pela extrema-direita, a copresidente da Alternativa para a Alemanha – AfD, Alice Weidel, disse que ambos os jogadores não deveriam mais ser convocados para a seleção alemã e que o caso comprova a pouca identificação de jovens de origem turca com a Alemanha.

O pedido para que os jogadores não joguem mais pela seleção alemã tem ganhado cada vez mais adeptos. Nas redes sociais muitos pediram para eles não serem convocados para defender a seleção do país. No último jogo em preparação para a Copa, realizado em Leverkusen, Gündogan foi vaiado toda vez que tocou na bola.

O caso de Ozil é mais marcante. O meia nunca cantou o hino da Alemanha nos quase dez anos que veste a camisa tetra campeã do mundo. A cena se repete antes de cada jogo. Os jogadores perfilados, cantando o hino, e a câmera foca no silêncio do craque do Arsenal. Por este fato, Ozil sempre foi vítima de críticas, que agora se tornam mais duras e feitas por um número cada vez maior de pessoas. O debate de verdade não é pelo fato de Ozil cantar ou não cantar o hino. Mas sim se ele é alemão suficiente, se ele honra e ama a pátria suficiente, se ele ainda tem muitos resquícios da Turquia dentro dele, e por isso não se esforça tanto quando joga pela seleção. Caso Ozil e Gündogan joguem bem, marquem gols, dêem assistências, isso se dá pelo talento inquestionável dos dois, porém, caso joguem mal, isso acontece porque não amam a Alemanha suficiente, então não jogam com vontade, e a mesma polêmica sobre sua nacionalidade volta à tona.

Com a derrota para o México, Ozil logo se tornou o bode expiatório dos problemas da equipe. A polêmica e infeliz foto voltou a ser tema nas entrevistas, e o tema identidade e integração nacional novamente entrou nas pautas de telejornais.

Como bem falou o presidente da federação alemã de futebol, esse é um tema que ultrapassa as quatro linhas. Caso a Alemanha jogue bem, passe da fase de grupos e realize uma grande Copa, saber quem canta ou não canta o hino, a foto polêmica, tudo isso será relevado. Porém fora de campo, com o crescimento da extrema-direita e da xenofobia no país, assim como com o crescente número de imigrantes que chegam e a política dúbia de Angela Merkel, os temas sobre nacionalidade, integração, multicultura devem continuar em pauta.

Mais sobre a Copa do Mundo da Rússica no Lateral Esquerda, especial do Esquerda Online:

https://www.esquerdaonline.com.br.br/a-lateral-esquerda