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EDITORIAL

Crescimento econômico derrete e crise social esquenta 

Editorial 05 de Junho

Na campanha pelo impeachment de Dilma Rousseff, o discurso da coalizão golpista atribuía ao PT dois males fundamentais: a corrupção generalizada que carateriza o sistema político brasileiro e a crise econômica que se desenvolveu no país a partir de 2014. Atualmente, passados mais de dois anos de governo Temer (MDB), já se tornou evidente que a troca na presidência não solucionou o problema da corrupção. Pelo contrário, amplas evidências – de malas de dinheiro a gravações comprometedoras – indicam o envolvimento de parcela significativa da cúpula do governo com variados esquemas de propinas, favorecimento indevido, entre outros elementos.

Já no campo econômico, o governo segue propagandeando a ideia de que teria tirado o país do atoleiro, iniciando uma pujante recuperação econômica. Tal imagem, entretanto, não resiste a uma análise séria da atual situação. Nesse sentido, cabe lembrar inicialmente que o crescimento do PIB em 2017, de 1%, não chegou sequer perto de recuperar as perdas de 2015 (-3,5%) e 2016 (-3,6%), ano em que Temer assumiu a presidência a partir de maio. Para 2018, as previsões de crescimento do PIB que iniciaram o ano em 3% já caíram para 2,2% e devem cair mais nos próximos meses, quando se contabilizará os impactos da greve de caminhoneiros. O resultado do 1o trimestre, com crescimento de 0,4%, indica que o resultado final pode ser ainda mais tímido.

Nesse cenário, o mais importante contraponto é fornecido pela expansão da produção agropecuária, que avançou 1,4% no primeiro trimestre do ano. Em parte, esse crescimento é viabilizado pelo aumento dos preços internacionais das commodities exportadas pelo Brasil (como petróleo e soja), que experimentaram uma significativa elevação ao longo dos últimos 12 meses, ainda que não tenham recuperado os patamares alcançados na primeira década do século XXI. Entretanto, considerando-se o amplo endividamento de grande parte das empresas e as restrições de investimentos do governo federal – decorrentes da queda da arrecadação e da aprovação da PEC do Teto de Gastos –, o agronegócio não poderá, sozinho, sustentar uma recuperação muito mais acelerada do que a verificada até o momento para o conjunto da economia.

Além dos fatores puramente econômicos, a forte instabilidade política e o nebuloso cenário eleitoral também incidem negativamente sobre o desempenho da economia, na medida em que muitos empresários suspendem investimentos diante do quadro de insegurança e incertezas.

Aprofundamento da crise social como estratégia do capital
Diante dessas dificuldades, o principal instrumento a ser acionado pelas classes dominantes com o objetivo de acelerar a recuperação da atividade econômica é o aprofundamento da exploração e da espoliação da classe trabalhadora e do povo pobre, que permitiria elevar as taxas de lucro às custas das condições de vida do proletariado. Retirada de direitos sociais e trabalhistas, precarização dos contratos de trabalho e redução dos níveis salariais são a tradução mais imediata dessa estratégia, que constitui o centro do programa do governo Temer desde a famigerada “Ponte para o futuro”. Para 2019, a aposta da burguesia é na realização de novos ataques, com destaque para a contrarreforma da previdência, momentaneamente deixada de lado em função da resistência dos trabalhadores e dos interesses eleitorais de seus principais defensores.

A aplicação deste programa está provocando o aumento assustador dos índices de desigualdade social, violência e pobreza. O mal estar social é generalizado, como bem revelou a greve de caminhoneiros que parou o país e conquistou amplo apoio popular. Para muitos trabalhadores, o salário não chega ao final do mês. Assim, pais e mães de família tem que escolher entre pagar o aluguel e dar comida aos filhos.

Atualmente, o total de trabalhadores desempregados, desalentados (isto é, que já deixaram até de procurar emprego) e subocupados (trabalham menos de 40 horas por semana e gostariam de trabalhar mais) já alcança 27,7 milhões de pessoas, o que corresponde a 24,7% da força de trabalho. Mesmo para aqueles que conseguem se manter trabalhando, entretanto, a situação é dramática: entre os empregados, cresce o percentual de informais, que não têm direitos trabalhistas assegurados e, entre os autônomos, se reduz o índice de contribuição para a seguridade social. As consequências desse quadro já são inúmeras e muito graves, indo desde o empobrecimento das famílias trabalhadoras, até o abandono dos estudos por parcela da juventude proletária, passando pelo crescimento da violência cotidiana, principalmente, nas grandes cidades. Evidentemente, tais dificuldades são ainda mais sentidas pelos setores historicamente oprimidos, como mulheres, negros e LGBTTs.

Em paralelo, avançam, também, as iniciativas de privatização de bens e recursos públicos, favorecendo especialmente o controle de empresas estrangeiras sobre o patrimônio nacional. Desde o seu início, o governo Temer já repassou parte importante da infraestrutura de transportes (estradas, portos e aeroportos) do país para o controle de empresas privadas nacionais e estrangeiras. Nessa área, entretanto, a principal iniciativa diz respeito, sem dúvida, ao esforço de privatização de empresas públicas fundamentais à soberania nacional, como Correios, Embraer e Petrobras. No caso desta última, além do projeto de venda de quatro refinarias, a política de preços adotada – que se subordina à dinâmica dos preços internacionais – reduz o espaço da empresa no mercado nacional, abrindo espaço para a penetração das grandes petrolíferas estrangeiras.

Por um programa econômico a serviço da classe trabalhadora e dos oprimidos
Diante da estratégia burguesa de aprofundamento dos ataques aos direitos sociais e trabalhistas e de privatização dos bens públicos, é preciso afirmar um programa que esteja a serviço da classe trabalhadora e dos setores oprimidos. Por isso, defendemos que a saída para a crise econômica deve ser pautada em uma reforma tributária que amplie a taxação sobre o empresariado e os ricos, para que haja recursos para financiar as áreas sociais; na auditoria da dívida pública que drena parte significativa do orçamento público para o bolso de banqueiros e especuladores estrangeiros; na realização de um plano emergencial de obras públicas e na redução da jornada de trabalho sem redução salarial, para acabar com o desemprego; na garantia de serviços públicos gratuitos e de qualidade e na rejeição das privatizações da Petrobras, Eletrobrás e demais empresas públicas. Defendemos esse programa em todas as lutas da classe trabalhadora e, também, nas eleições, por meio da candidatura de Guilherme Boulos e Sônia Guajajara (PSOL/PCB/MTST/APIB).

Foto: EBC