Declarações de lideranças do movimento de caminhoneiros e veículos de comunicação da categoria expressaram repúdio à proposta de intervenção militar, mostrando que existe uma diversidade de opiniões no interior do movimento, ao contrário do que pensam alguns veículos da imprensa corporativa e organizações de esquerda que titubeiam em apoiar a mobilização.
Presidente da ABCAM é contra a intervenção
Em nota através das redes sociais, José Lopes da Fonseca, presidente da Associação Brasileira dos Caminhoneiros (ABCAM), entidade que representa caminhoneiros autônomos e destacou-se por rechaçar o acordo da última quinta-feira (24), afirmou que os caminhoneiros não deviam pedir a intervenção das Forças Armadas, pois esse não era “o remédio apropriado para a situação”. Segundo Fonseca, que assinou o acordo divulgado pela equipe de Temer na noite de ontem, não existe lógica nessa exigência, pois numa intervenção militar, “os mesmos personagens continuaram no poder”.
Para demonstrar o conluio entre o exército e a cúpula do governo, Fonseca fez questão de enfatizar que o “General Villas Boas está reunido neste momento na sala do Alto-Comando do exército (27/05), sob a coordenação do Ministro da Defesa e com a presença dos comandantes das Forças e outros militares, para uma vídeo-conferência com os responsáveis por áreas de atuação na solução da ‘greve dos caminhoneiros’”.
No ínicio da noite, o presidente da entidade disse em entrevista coletiva que o grupo mais resistente que segue bloqueando trechos de rodovias quer derrubar o governo. “Tem um grupo muito forte de intervencionistas que está fazendo greve. Estão prendendo caminhões e estão tentando derrubar o governo”, disse o presidente da entidade, que ainda denunciou ameaças contra os caminhoneiros para que mantenham o protesto. “Não mostram arma, mas estão levantando a camisa”, disse.
Veículos de comunicação dos caminhoneiros também rechaçam os militares
Jornais e páginas do Facebook de diferentes orientações políticas também se manifestaram sobre a questão. O Chico de Boleia – jornal destinado a caminhoneiros e trabalhadores do transporte, com circulação principalmente no estado de São Paulo – publicou matéria saudando a greve e afirmando que “As recentes notícias, portanto, evidenciam que o movimento grevista dos caminhoneiros está em disputa e é preciso que nós, da imprensa, atentemos para o fato de que ele não é homogêneo, e sim composto por uma série de grupos e reivindicações.”. Preocupados com as demonstrações pró-militares, republicaram um texto divulgado na ocasião dos 50 anos do golpe empresarial-militar de 1964, onde explicam as características do regime como autoritárias e pró-imperialistas.
(Leia o texto, republicado no Esquerda Online)
Já a página Transporte Forte Digital – organizada a partir de caminhoneiros de Ijuí (RS) e com mais de 100 mil seguidores no Facebook – , divulgou diversas notas defendendo a separação entre o movimento dos caminhoneiros e os defensores da intervenção militar.
Mesmo que sob uma perspectiva mais próxima de grupos que rejeitam a participação de partidos no movimento social e a defesa de o movimento “não era para derrubar Temer”, o posicionamento da página, que acompanhou de perto as negociações em Brasília e divulgou dia-a-dia informações diretamente dos piquetes, expressa a contrariedade à intervenção, existente em setores da categoria.
Conversando com motoristas no piquete da REFAP (Canoas/RS) no último sábado (26), a equipe do Esquerda Online ouviu ideias que apresentavam a intervenção como “solução momentânea para ordem no país”, “garantir eleições livres de corruptos” e, até mesmo, recolocar na pauta os direitos sociais.
Entretanto, na manhã dessa segunda-feira, 28, fomos surpreendidos em frente à refinaria com 10 caminhões do Exército, ao lado de um forte aparato policial, com a missão de garantir a circulação de caminhões-tanque pela Região Metropolitana, ou seja, as próprias Forças Armadas fazem questão de demonstrar seu compromisso com o ajuste econômico e o governo Temer.
Intervenção não é solução, pelo contrário, apenas ampliará a repressão às reivindicações dos trabalhadores no momento em que os governantes, ao lado de grandes empresários nacionais e estrangeiros, fazem o povo pagar pela crise criada por eles mesmos. Precisamos de mais protagonismo popular, mobilização social e a garantia das mais amplas liberdades democráticas, o que em nada combina com as ideias militaristas.
Comentários