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BRASIL

Fake news, roubo de dados e muito mais: a Internet nas mãos das grandes empresas

Por: Ademar Lourenço, de Brasília

O escândalo da Cambridge Analytica, empresa que roubou dados de usuários do Facebook para usar nas eleições presidenciais dos Estados Unidos em 2016, é só o começo.  Cada vez mais, a Internet está sendo usada para o interesse comercial e político de um pequeno grupo de empresários.

Aquela Internet livre, em que todos publicavam, navegavam e baixavam conteúdo à vontade já não existe mais. O fundador do site Pirate Bay, Peter Sunde, avisou recentemente em entrevista que a lógica do capitalismo prevaleceu e a democracia na rede acabou sendo limitada. As críticas vêm até mesmo de um dos criadores do Facebook, Sean Parker, que denunciou a rede social como um meio de explorar as fraquezas das pessoas para torná-las viciadas na rede.

Desde o ano passado, as denúncias de uso das redes sociais por empresas para fins obscuros aumentaram. A disseminação de notícias falsas, a manipulação dos medos e preconceitos das pessoas, entre outras coisas já faz com que especialistas falem em “apocalipse de informações”. O que o futuro nos espera se o oligopólio de grandes empresas continuar a controlar a Internet?

As pessoas só verão o que as empresas querem  

Cada vez mais a Internet está se parecendo com a TV e o rádio, em que poucas empresas controlam o que é veiculado. Mas como assim, se hoje qualquer um pode ter seu canal no Youtube, abrir o próprio blog em minutos ou escrever o que quer no perfil do Facebook? Bom, não adianta escrever o que quer se ninguém vai ler.

No caso do Facebook, já é sabido que o que chega até o usuário é definido por um algoritmo, um programa que calcula quais são os interesses da pessoa e os posts que ela mais vai gostar. Agora em janeiro, uma nova mudança nesse algoritmo praticamente impede que uma página pequena cresça. Isto porque o que é postado na página chega apenas para menos de 1% das pessoas que a curtiram. Assim, apenas quem já tem uma página grande, feita há anos atrás, ou quem tenha dinheiro para postagens pagas, tem chances de ganhar audiência.

No Youtube, os vídeos que estão fora dos “padrões” da empresa simplesmente perdem o pagamento que receberiam pelas visualizações e são “escondidos” na plataforma para que poucos pessoas os vejam. Um problema que até o youtuber Felipe Neto, conhecido por seus vídeos para o público infanto-juvenil, reclamou.

Quando o controle por meio de algoritmos não for suficiente, as empresas simplesmente podem apagar o que eles não querem que seja publicado. O Facebook já faz isso a serviço do governo dos Estados Unidos e de Israel.

Ora, mas então é só esperar que jovens empreendedores façam novas redes sociais que sejam mais democráticas? Agora não dá mais. Em dezembro de 2017 foi aprovado o fim da neutralidade da rede nos Estados Unidos. Isto quer dizer que as empresas de telecomunicação podem decidir cobrar mais pelo acesso de alguns sites e a velocidade de outros será maior. Ou seja, uma nova rede social poderá ter acesso caro e lento. A tendência é que o Brasil copie esta regra.

As empresas que controlam a Internet te conhecem bem e vão usar isso contra você

Você achou que o Google e o Facebook deixam você postar o que quer porque querem promover a liberdade de expressão? Achou errado. As redes sociais colhem nossos dados cada vez que as usamos. Esses dados custam dinheiro quando vendidos para empresas de marketing. Eles são valiosos porque permitem que as empresas de publicidade possam fazer uma propaganda personalizada e distribuir para as pessoas daquele perfil. Por exemplo, pessoas que gostam do seriado Walking Dead costumam ter mais medo de imigrantes. Uma campanha política pode fazer um vídeo exatamente para este público.

Foi usando desses dados que Donald Trump ganhou as eleições para presidente dos Estados unidos em 2016 e a campanha pela saída da Inglaterra da União Europeia foi vitoriosa. Quando uma notícia confirma preconceitos que você já tem, a tendência é que você acredite sem conferir se aquilo é verdadeiro ou não. As empresas de marketing na Internet sabem disso e usam perfis falsos para disseminar notícias falsas, as chamadas fake news.  Isso é permitido porque essas empresas têm acesso a dados que permitem conhecer os medos e preconceitos das pessoas. No Brasil, esta técnica já está sendo usada.

Lógica do capitalismo está destruindo a Internet livre

A rede mundial de computadores surgiu por meio de um projeto militar do exército norte-americano. Depois, se tornou uma rede de uso universal, fruto da inteligência coletiva da humanidade. Até o início dos anos 2000, a rede funcionava sem que houvesse o controle de grandes empresas e governos.

Foi nessa época que surgiu a primeira rede social do mundo o Centro de Mídia Independente, criada por ativistas de influência anarquista. O objetivo era dar liberdade para que as pessoas publicassem suas próprias notícias em um site de publicação aberta. Era uma organização sem fins lucrativos. Também foi no tempo da Internet livre que surgiu o Napster, em que músicas podiam ser compartilhadas livremente e o Linux, sistema operacional que poderia ser livremente modificado.

O problema é que no capitalismo a liberdade dura pouco. A concorrência entre as empresas sempre faz sobrar um pequeno número delas, que passa a controlar o mercado. No caso da Internet, Facebook e Google passaram a ter poder para praticamente ditar o que terá audiência na rede. Quando este controle por grandes empresas está consolidado, fica difícil mudar a situação.

A rede mundial de computadores nos oferece um mundo de possibilidades, inclusive a superação do capitalismo. A distribuição livre e ilimitada de informação é um sonho que pode ser realizado desde que nem empresas nem governos tenham o controle.