Pular para o conteúdo
BRASIL

E agora, ACM Neto?

Por: Jean Montezuma, de Salvador, BA

Não é novidade para ninguém que a direita baiana e os setores do empresariado que fizeram fortuna nos tempos de ACM, o avô, sempre trataram ACM Neto como sua grande aposta para retomar diretamente as rédeas da política na Bahia. Com o golpe de 2016, o recado foi dado, seria a hora de dar um basta também na Bahia ao pacto político que permitiu o PT governar por mais de uma década. Logo em seguida ao golpe, vieram as eleições municipais, e a vitória acachapante de ACM Neto sobre Alice Portugal (PCdoB) gerou na direita baiana uma clima de euforia. Seria apenas uma questão de tempo para que o recém reeleito prefeito logo se tornasse governador.

A verdade é que a corrida eleitoral para o Governo do Estado começou no dia seguinte após o término das eleições municipais de 2016. Rui Costa e ACM Neto vêm travando uma verdadeira batalha midiática, financiada por milhões em publicidade, ambos com a mesma estratégia de venderem a si mesmos como o modelo ideal de gestores. Agora, essa disputa vive dias decisivos. A portas fechadas, o prefeito ACM Neto tem se reunido com lideranças da direita na Bahia, e também quadros nacionais do seu partido, o DEM, do PSDB e MDB, além, é claro, de líderes do empresariado. Em pauta, a definição do lançamento, ou não, da sua candidatura.

Acontece que agora, o que parecia inevitável em 2016 já se tornou indefinido. Por maior que tenha sido sua movimentação, ACM Neto não conseguiu cooptar setores importantes da base aliada do governo Rui Costa. O governador petista, após o golpe, atuou decididamente para fortalecer os seus laços com os golpistas. Não à toa, seus principais aliados são o vice-governador João Leão (PP) e o senador Otto Alencar (PSD), ex-carlistas de carteirinha e líderes de partidos que votaram pelo impeachment da presidente Dilma.

De olho na reeleição, para se manter no poder, Rui Costa radicalizou na política de aliança com os “de cima”, enquanto para nós, os “de baixo”, primou a intransigência no díalogo com o funcionalismo, o conservadorismo diante de questões como a educação, onde vem estimulando o modelo militar como o ideal, e a criminalização da pobreza e extermínio da juventude negra, como resposta a questões como insegurança pública. Esse tem sido o modelo de governabilidade praticado pelo governador petista.

Sem conseguir fazer desidratar a base de apoio a Rui Costa, o que desequilibraria a seu favor a balança da disputa no Interior (PSD e PP dirigem respectivamente 82 e 57 prefeituras), ACM Neto se vê agora diante de um processo eleitoral que se desenha difícil e incerto. Caso renuncie à Prefeitura para concorrer ao governo e saia derrotado, ACM Neto seria impedido de concorrer às eleições municipais de 2020 para o cargo de prefeito. Isso o colocaria diante de um cenário onde ficaria quatro anos sem mandato. Inaceitável para alguém que fez carreira na política desde os 23 anos de idade.

A burguesia que faz negócios na Bahia sabe que pode contar com o governo Rui Costa, reconhece que a política econômica do governo do petista não é antagônica aos seus interesses. Porém, com a inflexão da situação política do país, que teve no golpe um marco, estavam decididos a colocar no pálacio de Ondina um filho genuíno seu, um herdeiro de uma tradição política conservadora que, durante décadas, governou a Bahia e contribuiu para que um dos estados mais ricos do país fosse também um dos mais perversamente desiguais.

Em caso de desistência de ACM Neto, a direita baiana terá que administrar uma situação difícil. Por um lado, não preparou um plano B, não existe nenhum outro nome com o perfil do carlista, por outro, figuras mais tradicionais, como o ex-governador Paulo Souto, já foram derrotados em outras oportunidades. Já os irmãos Vieira Lima (Geddel e Lúcio), tão proeminentes no impeachment, hoje são cartas fora do baralho. Em tempo, uma polarização entre Rui Costa e ACM Neto, ou entre Rui Costa e outro nome apresentado pela direita, será uma armadilha perigosa.

Ainda que não se possa reduzir estes polos a “seis por meia dúzia”, ou “farinha do mesmo saco”, reducionismos que em nada nos ajudam, ambos defendem uma política econômica e um projeto para a Bahia voltados para o andar de cima, incapazes, portanto, de mexer com as estruturas, de tocar nas raízes das desigualdades e injustiças sociais. Um polo porque sempre foi privilegiado e vive às custas dessas desigualdades, já o outro porque, mesmo após tudo que vem ocorrendo no Brasil pós-golpe, parece ter abandonado a luta por superá-las de forma radical.”