Por Matheus Costa, de Belo Horizonte, MG
*professor da rede estadual e membro do diretório municipal do PSOL-BH
Muito se discute os tempos de golpe que vivemos no país. Trabalhadoras e trabalhadores sofrem por todos os lados. São retiradas de diretos, corte de verbas na saúde e educação, Reforma Trabalhista, terceirizações, tentativas de privatizações e ataques aos direitos democráticos. Vencemos uma batalha essencial: Temer não conseguiu aprovar a Reforma da Previdência pela pressão dos movimentos sociais. Agora temos que enfrentar uma nova batalha contra a intervenção militar no Rio, que já cogitam expandir para outros estados.
Diante desse cenário, o PT, que governa o estado de Minas, segue com suas vacilações. Ao contrário da militância de base desse partido que se esforça para combater o golpe parlamentar e as medidas do governo, a direção petista segue acenando que é necessário “perdoar” os golpistas.
Em Minas, com Pimentel, a situação se torna mais aberrante. Diante da situação financeira do estado, o governo parece jogar nas costas do funcionalismo público os custos da crise econômica. Há mais de dois anos o funcionalismo recebe seus salários parcelados em três vezes, sem data fixa de pagamento, o sistema de saúde dos servidores (IPSEMG) está a cada dia mais precarizado e o 13° salário de 2017 de boa parte dos trabalhadores do estado está sendo parcelado em quatro vezes.
Na educação, as escolas sofrem com atrasos de verbas para merenda e manutenção desde 2016, as superintendências de ensino de tempos em tempos ficam sem telefone e internet, e diversos servidores estão com o nome no SERASA porque o governo não está repassando o dinheiro descontado dos empréstimos consignados para os bancos. O acordo assinado pelo governo em 2015, que visava, de maneira muito lenta, atingir o valor do piso salarial nacional ao final de 2018, se estagnou no ano de 2016 e está longe de ser garantido.
Pimentel tem apontado que há um boicote por parte do Governo Federal com relação ao estado de Minas através do bloqueio das contas de Minas e a questão da negociação das dívidas do estado. O bloqueio das contas é uma realidade e deve ser repudiado, mas não é verdade que o governador tem feito um combate real a essa e outras medidas de Temer. Pelo contrário, aponta para medidas de solução da crise financeira alinhada com o que tem sido proposto a nível nacional: arrocho no funcionalismo e privatizações. A bola da vez agora é a Codemig (Companhia de Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais). O governo estadual, de maneira tímida, sem grandes anúncios, está propondo a privatização de parte dessa empresa pública estadual.
Privatização
A Codemig foi criada em 2003 e é uma empresa pública constituída na forma de Sociedade Anônima e controlada pelo Estado de Minas Gerais. A atuação da Empresa está pautada em três eixos estratégicos: Indústria de Mineração, Energia e Infraestrutura; Indústria Criativa e Indústria de Alta Tecnologia, especialmente no que se refere a materiais estratégicos, aeroespacial, biotecnologia, semicondutores e tecnologia da informação. A Codemig é também proprietária de diversas fontes de águas minerais naturais de Minas Gerais, e por meio de sua subsidiária Codeáguas Águas Minerais, zela pelas fontes de Araxá, Caxambu, Lambari e Cambuquira.
A principal receita da empresa pública vem da exploração do nióbio (86%). A Codemig é dona da maior jazida de nióbio do mundo, no município de Araxá, no Alto Paranaíba. O nióbio é um mineral utilizado para fazer ligas de aço de alta resistência, com aplicações em plataformas marítimas, pontes e turbinas de aeronaves a jato. A reserva de Araxá tem capacidade de exploração por mais de 400 anos, segundo a própria empresa. Em 2016, as receitas da Codemig atingiram cerca de R$ 557 milhões, e seu lucro líquido foi de R$ 230,7 milhões. Em média, nos últimos anos, a empresa repassou cerca de R$ 400 milhões anuais para o estado. Ou seja, é uma empresa rentável.
A proposta, já aprovada em comissão na Assembleia Legislativa, prevê o desmembramento da Codemig em duas empresas para facilitar e valorizar a venda de 49% da empresa. Com o nome atual, ficaria a companhia responsável pela exploração do nióbio. Já a recém-criada Codemge ficaria com os negócios deficitários da empresa pública, como a área de economia criativa, exploração das águas minerais de Cambuquira e Caxambu, e aeroportos. O valor estimado da Codemig hoje seria de cerca de R$ 6 bilhões. Separada em duas, a gestora da exploração do nióbio poderia alcançar R$ 8 bilhões. Segundo o governo, a receita arrecadada com essa venda seria utilizada para o pagamento do funcionalismo e de dívidas do estado.
Ou seja, o governo estadual está propondo vender a parte mais rentável de uma empresa pública que, além de gerar cerca de R$ 400 milhões por ano ao estado, ainda explora recursos naturais estratégicos como o nióbio e a água. A privatização desses recursos é mais um crime contra a população mineira,que há muitos anos sofre as consequências sociais e ambientais da exploração pelas grandes empresas mineradoras, vide o rompimento da barragem de rejeitos da Samarco/Vale ocorrida na cidade de Mariana, em 2015, considerado o maior acidente ambiental da história do país. Até hoje ninguém foi punido pelo ocorrido.
A hipócrita oposição na Assembleia Legislativa (DEM, PSDB e satélites) tenta se postular como “defensora do patrimônio do estado” ao ser contra a proposta. Mas são conhecidos, são os mesmos que sempre fizeram parte das politicas de ataques dos governos de Aécio e Anastasia e maiores defensores dos processos de privatização no país. Além disso, são também os responsáveis, por diversas vezes, por travar as pautas de avanços na educação conquistadas pela luta da educação, em 2015.
Escolhas
O governo de Minas tem feito suas escolhas desde que assumiu o governo. Desde meados de 2016, passou a não cumprir com os acordos assinados com a educação e puniu de maneira autoritária a greve dos servidores das SRE’s. Até hoje não tomou medidas para punir a Samarco por conta do acidente em Mariana. Optou por manter a aliança com os golpistas do PMDB, dando a liderança da Assembleia Legislativa a esse partido. E pelo que tudo indica, Pimentel busca manter essa aliança para as eleições. Apesar do discurso contra Governo Federal, na prática pouco se fez para combater as medidas de retrocesso. Como exemplo, foi somente a pressão movimento da educação que fez o governo suspender o processo das PPPs na construção de escolas. É verdade que, até o momento, o governo não tem cortado o salário do funcionalismo nos movimentos de greve, mas isso não é nada mais do que uma obrigação de qualquer governo que tenha intenção de dialogar. Entretanto, isso não basta.
A população mineira e, principalmente o funcionalismo, não tem saudades dos governos do PSDB. Foram anos de arrocho salarial, repressão e ataques ao serviço público. As diversas campanhas de denúncias feitas pelos servidores durante os anos de governo tucano e a histórica greve da educação em 2011 foram essenciais para sua saída do estado nas eleições de 2014. Muitos tiveram esperanças de que Pimentel faria definitivamente um governo diferente dos anteriores, mas infelizmente a realidade tem sido muito aquém disto. Diversos setores do funcionalismo já se mobilizam no estado. A educação tem greve marcada para iniciar no dia 8 de março. Caso o governo não se mova novamente, é provável um forte processo de luta. Não se deve cair na chantagem de aceitar processos de privatização em troca de salário.
O patrimônio da Codemig é do povo mineiro e não deve ser privatizado. Sabemos que a questão não é falta de dinheiro, mas sim de prioridades e de qual lado se escolhe. Pimentel tem escolhido o dele, e nós já temos o nosso.
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