Por Bernardo Pilotto, do Rio de Janeiro
Quando pensamos no carnaval na cidade do Rio de Janeiro, lembramos logo dos desfiles das escolas de samba na Sapucaí e também dos centenas de blocos que circulam por toda a cidade. Mas, para além desse carnaval sempre lembrado por todos e todas, há também outras festas um tanto menos conhecidas acontecendo pela cidade.
Uma dessas festas é o desfile das escolas de samba dos grupos B, C, D e E que acontece na Intendente Magalhães, uma avenida na Zona Norte da cidade, no bairro Campinho, próximo a Osvaldo Cruz e Madureira.
Depois de muitos anos se alternando por algumas ruas do centro da cidade, como as avenidas Rio Branco e Presidente Vargas, desde 2004 esses desfiles vêm acontecendo na Intendente. Desde então, na época do carnaval são montadas arquibancadas tubulares para quem vai assistir os cortejos, que são gratuitos.
Por lá, desfilam escolas que já tiveram destaque no sambódromo, como Caprichosos de Pilares, Tradição, Em Cima da Hora, Unidos do Jacarezinho e Tupy de Brás de Pina, escolas tradicionais (como a Vizinha Faladeira, fundada em 1932) e escolas novatas. O maior sonho de quem está na Intendente é voltar a desfilar na Sapucaí (onde estão o Grupo Especial e a Série A), o que é garantido apenas para a escola que for vencedora do desfile no Grupo B.
E, se a vida está dura para as escolas da Sapucaí, que ainda recebem verba oriunda, por exemplo, da transmissão de televisão, a situação das escolas da Intendente é de penúria. Em 2018, a prefeitura disponibilizou apenas R$160 mil para ser dividido entre as 12 escolas do Grupo B.
E é justamente no local que mais precisaria de apoio do poder público que ele menos chega. Isso porque por lá estão escolas que não tem quase nenhum apelo comercial ou possibilidade de conseguir patrocínio. Mas como o pouco apoio que é dado ao carnaval pela prefeitura vem apenas a partir do viés turístico, as escolas da Intendente vão sendo cada vez mais deixadas de lado.
Nos desfiles da Intendente, tudo é mais difícil. Na hora do desfile, o caminhão de som da escola que está na avenida disputa espaço com o som das barraquinhas de comida da rua vizinha; muitas escolas desfilam sem o mínimo de componentes exigidos em algumas alas (como bem alertou o historiador Luiz Antônio Simas acerca da ala das baianas); as fantasias nem sempre saem sob medida para o folião e muita adaptação é feita de última hora.
Mas, justamente por este cenário que parece desolador, vivencia-se durante o carnaval cenas bastante emocionantes. São cenas de um amor profundo pelo carnaval que evidenciam as escolas ainda como instituições comunitárias.
Uma contribuição que não é pequena
O carnaval carioca não seria o mesmo sem muitas das agremiações que hoje desfilam na Intendente. Foi a Tupy de Brás de Pina que, por exemplo, desfilou com um dos primeiros enredos de crítica social do carnaval, quando veio para a avenida com Seca do Nordeste, em 1961; a Caprichosos de Pilares também contribuiu (e muito) com enredos politizados nos anos 1980, justamente no momento que a população brasileira derrotava a ditadura civil-militar; por sua vez, foi na Unidos da Ponte que tivemos a primeira presidente mulher (Carmelita Brasil) de uma escola de samba em 1957.
Os exemplos acima são apenas uma pequena mostra da contribuição que estas escolas tiveram aos longos dos anos. Esse é mais um motivo para que o carnaval da Intendente seja valorizado, para que as escolas consigam ter planejamento, uma melhor estrutura, gerar melhores empregos e afastarem o risco de enrolar a bandeira.
Em tempos de individualismo, fortalecer o carnaval da Intendente Magalhães é ir na contramão: fará crescer laços comunitários e a coletividade, ajudando que as escolas de sambas continuem sendo espaços de invenção e afirmação popular.
Imagem: Porta Bandeira Lohane Lemos | Marcelo O’Reilly/ JIO Folia
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